Neymar é o Pelé do século XXI. Estamos a esticar a corda? Não. O rapaz de 22 anos é a alegria do povo brasileiro, tem ginga e já leva 35 golos com a camisa do escrete. Com essa idade, apenas Pelé tinha mais (38). Ronaldo “Fenómeno” e Tostão levavam 29, Rivellino seis e Romário quatro. Ainda não está convencido? Continuemos. O craque do Barça já marcou mais golos do que Tostão (32), Ronaldinho (33), Jairzinho (33) e Rivaldo (34). E, qual herói a caminhar para a eternidade, só lhe resta olhar para o céu: Bebeto (39), Romário (55), Ronaldo “Fenómeno” (62), Zico (66) e Pelé (72). Já está convencido? Rio Ferdinand estava. “Neymar: 22 anos, 53 jogos, 35 golos, 20 assistências… isso é ilegal! Está a lidar com a pressão como um patrão”, desabafava o central inglês via Twitter.
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“Apesar de você/amanhã há de ser/outro dia/você vai ter que ver/a manhã renascer/e esbanjar poesia”, impossível não abraçar uns versos de Chico Buarque enquanto escrevemos sobre a canarinha. O destino de Neymar é esse: encantar os demais a cada dia que passa e renovar-se todas as manhãs. Há sempre o dia a seguir para fazer brilhar a camisa 10.
Scolari apostou no regresso de Hulk. O ex-extremo do FC Porto atuou à direita — finalmente! Oscar e Neymar trocavam de posição, tanto apareciam no centro como na esquerda. A entrada foi à leão. Bastaram três minutos para Fred ameaçar a baliza africana, depois de uma combinação pela direita entre Neymar e Dani Alves. O Brasil ensaiou algumas saídas de bola muito rápidas, que, normalmente, tinham mais encanto quando Neymar tocava na bola. Mas a avalanche inicial seria fugaz…
Este travão canarinho foi uma janela de oportunidade para os Camarões. Aboubakar e Chopo-Moting aproveitaram para fazer mossa. Dani Alves e Marcelo começaram a passar mal, com inúmeras bolas a pingar nos seus corredores. É incompreensível como é que este Brasil é tão permeável e tão pouco eficaz na hora de congelar a bola. Nem parece uma equipa de Felipão: expõe-se demasiado. O jogo estava meio partido, o que beneficia sempre o espetáculo. E o golo chegou. Era inevitável.
Luiz Gustavo, que até estava bastante mole no meio-campo, acabou por roubar uma bola no corredor direito da defesa camaronesa e ofereceu a Neymar, que esperava na área. O craque não hesitou: colocou de primeira no poste mais distante, 1-0. “‘Tá lááá!!!”, gritava Scolari no banco. Este era um momento especial: era o centésimo golo do Mundial-2014 no jogo 100 do Brasil em Campeonatos do Mundo. Um simples gesto que virava do avesso o Mané Garrincha, o estádio que homenageia o “anjo das pernas tortas” — Garrincha tinha mais seis centímetros numa das pernas. Bom, o mais difícil estava feito. Venha daí uma grande exibição dos canarinhos, pensaram muitos. E a bomba de Neymar com o pé esquerdo logo a seguir parecia dar corpo a essa fé.
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Mas esta cantiga mudaria de tom pouco tempo depois. Aos 26’, depois de um canto, a bola beijou a trave de Júlio César: foi Matip e Thiago Silva a meias. O aviso estava feito, mas aquela bola já estava com ela fisgada: acabaria descansada na baliza dos brasileiros. N’yom tentou enganar Dani Alves pela esquerda e, após um ressalto, lá ganhou a linha para cruzar. À espera, ao segundo poste, estava Matip para empurrar para o empate, 1-1.
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O Brasil perdeu-se. O meio-campo não segurava a bola, a defesa dava espaço e o ataque só vivia da genialidade de Neymar. Oscar tem estado muito abaixo e tem sido a maior desilusão. Paulinho era outro que ainda não havia convencido. Custa lembrar as exibições de Fernandinho no Manchester City e vê-lo banco de suplentes.
Sem bússola, GPS e perdidos, mas com um homem que sabe sempre o seu Norte. Falamos de Neymar, pois claro. O camisa 10 recebeu de Marcelo na esquerda, investiu numa diagonal, encarou dois defesas, puxou para dentro e… surprise, surprise: golo! Itandje, o guarda-redes dos Camarões, ficou mal na fotografia: estava posicionado quase fora da pequena área e tentou adivinhar o lance; a bola de Neymar entrou praticamente à figura. Curiosidade: o brasileiro marcava o 15.º golo nos últimos 18 jogos com a seleção. Convencido?
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O intervalo não chegaria sem que o menino de 22 anos, a quem mais parece estarmos a escrever uma carta de amor, fizesse mais umas maldades. N’yom foi a vítima, que viu o brasileiro passar-lhe a bola por cima duas vezes e entregar como se estivesse a brincar com os amigos numa praia de Copacabana. Neymar representa o futebol de rua. Empate em Brasília: esta seleção de Felipão tem muitos problemas para resolver e só encanta quando Neymar pega na bola. Não há outro jeito. Pergunta que se impõe: e quando uma equipa mais competente decidir tapar o avançado?
Ao intervalo, Scolari fez-nos uma vontade: saiu Paulinho, entrou Fernandinho. Coincidência ou não, o futebol brasileiro melhorou. Ficou mais rápido, mais móvel, mas também muito mais eficaz na hora de defender e compensar. O Brasil voltou a entrar forte como na primeira parte. O perigo chegou logo aos 47′: Hulk na cara de Itandje demorou tanto a escolher como ia rematar que Matip teve tempo para recuperar e cortar a bola. O canhoto esteve um pouco melhor do que no primeiro jogo com a Croácia, mas continua muito longe do que nos habituou. O golo chegaria dois minutos depois, e logo pelo homem que ouviu criticas duríssimas de Alan Shearer, que havia afirmado que Fred só atrapalhava. A resposta do avançado chegou de cabeça, após um cruzamento com o pé esquerdo de David Luiz, 3-1.
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O encanto desta partida chegou ao fim aos 70′, quando Scolari decidiu tirar Neymar depois deste levar um toque. O ritmo da partida já era outro. A serenidade aterrou no Mané Garrincha. Este jogo não chegaria ao fim sem que acontecesse algo que vai fazer Scolari pensar duas, três, quatro vezes na próxima vez que desenhar o 11. Triangulação genial entre Oscar, Fred e Fernandinho, isto depois de uma recuperação de bola já quase na área africana, que culminou com o remate de bico do médio do Manchester City.
Fernandinho display for #BRA:
96% passes completed
100% aerial duel success
2 tackles won
1 chance created
1 goal pic.twitter.com/MqD3RvJbdf— Squawka (@Squawka) June 23, 2014
O apito final chegava em Brasília e com ele a confirmação do primeiro lugar do Grupo A. Neymar assume-se como o craque da Copa e já é o melhor marcador do torneio com quatro golos. O adversário nos “oitavos” é o Chile, naquela que vai ser uma reedição do que aconteceu no Mundial-2010. Na altura, os brasileiros venceram por 3-0, cortesia de Juan, Luís Fabiano e Robinho.