Uma possível contaminação com a bactéria antrax levou à hospitalização de cinco pessoas na Hungria. Os restantes habitantes e os animais que vivem na localidade Tiszafüred, a cerca de 145 quilómetros a este de Budapeste, vão tomar antibióticos como prevenção, noticiou a Lusa. O Observador falou com um investigador português para perceber o risco da doença em Portugal.

O antrax foi encontrado em pedaços de vitela congelada distribuídos por uma empresa local que fornece refeições em instalações municipais, incluindo um campo de férias escolares. Os dois animais foram mortos de forma ilegal, ou seja, sem o parecer das autoridades médicas, conforme informou o Serviço Médico e de Saúde Estatal da Hungria.

Se os médicos veterinários ou as autoridades sanitárias tivessem tido a oportunidade de ver os animais poderiam ter percebido que estavam doentes. A doença causada pela bactéria antrax – carbúnculo hemático – é uma infeção generalizada que começa por causar debilidade no animal, mas é fulminante e pode causar a morte em 24 horas, nas estirpes mais virulentas, explica ao Observador o Capitão Wilson Antunes, médico veterinário e oficial do Exército Português.

O animal que morto apresenta sangue não coagulado nos orifícios, como a boca, é sinal de morte por carbúnculo hemático, nota o veterinário do Laboratório de Defesa Biológica do Exército Português. “Se houver uma quantidade elevada de esporos [na carne] pode ser problemático, por isso todos os produtos devem ser impedidos de entrar na cadeia alimentar.”

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Quando o carbúnculo afeta o homem

O antrax afeta principalmente herbívoros enquanto pastam porque estes ingerem ou inalam facilmente os esporos que existem no solo. Quando o homem manuseia a carne, peles ou outras partes do animal contagiadas acaba por ser contaminado, sobretudo por via cutânea. Esta é a forma menos agressiva da doença e pode ser facilmente tratável. “Só é fatal se não for tratada a tempo”, diz o Capitão Wilson Antunes.

A ingestão de carne contaminada também pode provocar a doença em humanos porque os esporos são muito resistentes e aguentam temperaturas elevadas, mesmo de cozedura. A probabilidade de morte é maior, mas a doença continua a ser tratável. A situação mais grave, porque é a mais mortal, é por inalação. Mas se houver suspeita, e forem dados antibióticos específicos antes da doença se manifestar, também se pode tratar, explica o veterinário.

“O antrax é endémico na Europa”, refere. O que obrigou os países a tomarem medidas preventivas. “Como não afeta só animais de produção, mas também animais selvagens, é mais difícil de controlar e irradicar.” O Capitão Wilson Antunes dá o exemplo português: nos anos 1950 registaram-se cerca de 50 mil a 70 mil casos em animais, dos quais metade morreu. Das dez mil pessoas afetadas, sobretudo por infeção cutânea, 1% acabou por morrer.

Uma campanha de vacinação implementada nessa altura quase erradicou a doença – é impossível de irradicar totalmente porque o solo é um reservatório -, conta o veterinário. Nos anos 1960 ainda morreram cerca de dez mil animais e 400 pessoas foram afetadas, mas nos anos 1970 o número de casos em humanos era muito esporádico – aparecia nas zonas com mais herbívoros selvagens e trabalho agrícola (Trás-os-montes, beiras e Alentejo). “Hoje em dia não tem expressão [em Portugal]. É raro tanto em humanos como em animais.”

Note-se que a bactéria antrax (Bacillus anthracis) apesar de aparecer naturalmente no solo já foi utilizada como arma biológica em atos de terrorismo, como o pó carregado de esporos nas cartas enviadas em 2001 a dois senadores e alguns meios de comunicação nos Estados Unidos. Lembre-se que quando inalados os esporos são muito mais mortais.

Correção: número de casos e mortos nos anos 1950 e 1960.