Ponto final. “Não consigo mais”, admitiu, a custo, perante o olhar de quem sempre nele confiara. O joelho, golpeado por lesão atrás de lesão, obrigava Ole Gunnar Solskjaer a parar aos 34 anos. Segundos depois, Alex Ferguson, patrão que o vira marcar 127 golos no Manchester United, perguntou-lhe: “Porque não te juntas à minha equipa técnica?” Por fim, o norueguês largava o teclado e o ecrã de um computador.

Em 2008, o ex-avançado norueguês continuou a passar os dias em Carrington, no centro de treinos do United, agora a dar ordens e a lapidar jovens jogadores ingleses. Novidade? Só pela mudança de cenário — desde os 19 anos, pelo menos, que Solskjaer já escolhia táticas, pesquisava jogadores e passava horas a estudar quem fazia melhor o quê. “É semelhante à vida real na parte de prever quem se tornará num bom jogador. Fizeram uma pesquisa incrível”, chegou a elogiar o norueguês.

Sim, Ole Gunnar Solskjaer era, e talvez ainda o seja, um viciado. Um de muitos que, desde 1992, se deixaram mascarar de treinadores de futebol por um jogo de computador. O Football Manager (FM), cuja base de dados vai esta época ser utilizada por clubes da Premier League inglesa. Pelos números, até se entende porquê: são dados biográficos e futebolísticos de mais de 550 mil jogadores, coleccionados por cerca de 1500 olheiros espalhados pelo mundo.

Esta segunda-feira, a Prozone, empresa britânica, confirmou que a base de dados do FM será integrada na sua ferramenta dedicada à análise e prospecção de jogadores — que já é utilizada por vários clubes da Premier League. “É um recurso altamente eficaz e valioso, que vai melhorar os serviços de recrutamento que disponibilizamos”, defendeu Thomas Schmider, diretor executivo da Prozone, ao The Guardian.

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Ou seja, a partir de agora, é oficial. “Durante anos ouvimos histórias de treinadores da vida real e de olheiros que usavam a nossa informação durante o processo de recrutamento. Agora, técnicos de todo o mundo vão encontrar e comparar jogadores com um sistema muito parecido ao do Football Manager”, congratulou Miles Jacobson, diretor da Sports Interactive, empresa responsável pelo Football Manager.

Se nada disto lhe soa familiar, passemos à explicação. O Championship Manager foi criado em 1992. Em 2005, as duas empresas que o criaram zangaram-se e, após a sua separação, a versão mais famosa do jogo passou a chamar-se Football Manager. Porém, nada mudou.

Desde sempre que o jogo de computador coloca o utilizador a treinar um clube de futebol à sua escolha. Tudo é à base de números e informação. O jogo classifica cada futebolista em dezenas de parâmetros, numa escala de zero a 20, como nos ‘remates de longe’, nos ‘desarmes’ ou no ‘posicionamento’ em campo.

Ao início, tudo se misturava com a hipótese de contratar jogadores, definir esquemas de treino e escolher táticas. Com o passar dos anos vieram as conferências de imprensa ou as reuniões com jogadores e com a direção do clube, por exemplo. Resultado — um jogo viciante e que tirava horas de vida aos mais dedicados. “É um jogo fantástico. Aprendi muito sobre futebol, especialmente sobre talento jovem”, admitiu, em março de 2013, Ole Gunnar Solskjaer, hoje treinador do Cardiff City, que antes conquistou dois campeonatos noruegueses com o Molde, em 2011 e 2012.

Alex Ferguson, treinador que passou 27 anos a treinar o Manchester United, bem o dizia: “O Ole sempre foi um dos profissionais que costumava anotar tudo o que aprendia nos jogos e nos treinos.” O escocês, que viu o avançado marcar 29 golos em partidas nas quais começou no banco (um recorde no clube), sublinhou que Solskjaer “se preparou, desde novo, para ser treinador”. Só não saberia que o começou a fazer com os olhos fixados num computador e no jogo que, agora, servirá para vários clubes da Premier League.

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