Paulo Bento é carta fora do baralho. A tão badalada renovação será feita com outro homem ao leme. Renovar contrato antes de um Campeonato do Mundo e, depois do desaire na Copa, deixar o treinador cair logo no primeiro jogo de qualificação para o Europeu demonstra bem a fragilidade que assola a seleção no pós-Brasil. A posição do presidente, essa, ficará necessariamente mais fragilizada também. Afinal, Paulo Bento era a cabeça do seu projeto e até renovou com poderes redobrados.
Saídos médicos e treinador, resta analisar a prometida renovação. A estreia de Portugal no apuramento para o Euro-2016, contra a Albânia, contou apenas com um jogador na equipa titular que não esteve presente no Mundial: André Gomes. Já o onze titular contou com apenas quatro mudanças relativamente ao jogo com o Gana: saíram Beto, Bruno Alves, Rúben Amorim e Cristiano Ronaldo e entraram Rui Patrício, Ricardo Costa, Fábio Coentrão e Vieirinha. Os casos de Rui Patrício, Ronaldo e Coentrão estão relacionados com lesões, logo não têm qualquer ligação no que toca à renovação.
E agora, qual é o caminho? O Observador olhou para três seleções que viveram tormentos semelhantes e que souberam dar a volta por cima. Dois mudaram muito, o terceiro caso nem por isso. Em comum, têm algo que os afasta de Portugal: mais alterações na hora das mudanças na equipa titular de uma competição para a outra.
ITÁLIA
No topo do mundo desde 2006, com o título mundial, a seleção italiana chegou à África do Sul, em 2010, com grandes expectativas. Marcello Lippi, o homem do charuto, era quem transportava o peso de uma nação às costas. O grupo parecia favorável para pensar em altos voos: Paraguai, Eslováquia e Nova Zelândia. Mas não foi assim. Dois pontos e o último lugar ditaram o adeus. Lippi pediu a demissão. Entrou Cesare Prandelli.
A estreia oficial do ex-treinador da Fiorentina, num jogo a contar para o apuramento para o Euro-2012, foi na Estónia. Prandelli trocou sete jogadores da equipa relativamente ao onze que jogou no empate contra a Nova Zelândia (1-1), em 2010. A Itália arrancou o apuramento para o Europeu com uma vitória por 2-1 e acabaria por liderar o Grupo C com dez pontos de avanço: oitos vitórias e dois empates.
A identidade da equipa também mudou. Esta Itália já queria jogar à bola e esquecer o catenaccio. Prandelli fomentou o que andou a pregar em Florença: ADN de quem quer ser protagonista. O desempenho no Europeu 2012 foi quase perfeito. Começou com um empate contra a campeã do mundo Espanha (1-1), seleção com a qual disputaria a final. Aí, os espanhóis foram implacáveis (0-4), mas a renovação transalpina fez-se.
HOLANDA
Em 2010, a Laranja Mecânica perdeu a final do Mundial contra a Espanha (0-1). Estavam finalmente no mapa, como antes, nos tempos de Rinus Michels, Cruyff ou Van Basten e companhia. O Euro-2012 ditou um grupo da morte para os laranjas: Alemanha, Portugal e Dinamarca. Podia cair para qualquer lado. Mas a seleção de Bert van Marwijk acabou por ser uma enorme desilusão e nem um ponto somou: dois golos marcados contra cinco sofridos. O treinador não teve outra saída e pediu a demissão.
O homem nomeado para a revolução foi alguém com um nome curioso: Aloysius Paulus Maria van Gaal. Já ouviu falar, certo? Os 19 troféus faziam prever o melhor. A liderança com pulso de ferro ajudaria igualmente. Mas os românticos da escola holandesa que esperavam mundos e fundos desta nova seleção esqueçam: o homem iria montar uma máquina de garantir resultados, e não uma máquina de jogar bom futebol.
Foram sete as alterações do último jogo do Euro-2012, contra Portugal (1-2), para a estreia na fase de qualificação para a Copa do Brasil, contra a Turquia na Arena de Amsterdão, a casa do Ajax. Van Persie e Narsingh assinaram o dois-zero e assim começou esta história. Esta Laranja (não tão) Mecânica tinha um plano b — três centrais –, que seria usado no Campeonato do Mundo em junho/julho de 2014. O apuramento foi magistral, com nove vitórias e apenas um empate. Van Gaal estava novamente no topo do mundo.
A estreia no Mundial deixou meio planeta de queixo caído: 5-1 à campeã do mundo e bicampeã europeia Espanha. O futebol parecia estar virado do avesso. A Holanda parecia a Itália a jogar, procurando defender atrás, com os três defesas a fazer lembrar o catenaccio, e a apostar no contra-ataque, sempre que possível. Esta fórmula resultou até às meias-finais, momento em que perdeu em penáltis para a Argentina de Messi.
ESPANHA
E depois há aqueles que confiam na cultura, no projeto, nas pessoas e no caminho que definiram há muito. É o caso dos espanhóis, que ficavam sempre aquém das expetativas. Até que chegou 2008 e o primeiro grande troféu de seleções, sob o comando do eterno Luis Aragonés. Nesse verão chegaria a Barcelona Pep Guardiola, um homem que revolucionaria o ADN dos blaugrana. O futebol dos catalães seria transportado para a seleção de Vicente del Bosque. A bola passou a ter somente um dono. Era desesperante. Para os rivais, claro. Era delicioso ver. Aí começou uma das maiores fábulas da história do futebol: depois do Euro-2008, enfiaram o Mundial-2010 e o Euro-2012 no bolso. Memorável.
Mas normalmente tudo o que sobe, desce. E foi assim com esta seleção de Del Bosque, que caiu com estrondo no Brasil. A estreia estava agendada contra a Holanda. Xabi Alonso até marcou primeiro de penálti, mas Robin van Persie e Robben abririam o livro e ajudariam a guardar numa gaveta uma vitória memorável: 5-1 contra os campeões do mundo. Épico. As duvidas começaram, as polémicas, as portadas nos intolerantes diários desportivos. Parecia uma tempestade perfeita. Não augurava nada de bom. E a derrota a seguir contra o Chile (0-2) veio confirmar os alarmes. O triunfo contra a Austrália (3-0) de nada valeria. Era o adeus inglório da geração de ouro do futebol espanhol.
Pouco depois, Xabi Alonso, Villa e Xavi diziam adeus à La Roja. A Federação optou por manter Del Bosque. A sua sabedoria, serenidade e capacidade de liderança seriam as ideais para ultrapassar esta crise de identidade. E eis que o arranque rumo ao Campeonato da Europa em França começou com uma manita, como tanto gostam de dizer. Cinco-um à humilde Macedónia e a certeza de que esta Espanha ainda vai dar muito que falar.
Não comparamos o onze deste jogo com o último da Copa porque Del Bosque procedeu a algumas alterações anormais, derivado do descalabro das duas primeiras jornadas. Teremos em conta então a primeira jornada, contra a Holanda (1-5). Desse para o jogo da Macedónia, Del Bosque alterou seis jogadores.
QUEM SERÁ O ELEITO?
Os casos da Holanda e Itália são muito interessantes, pois mudaram treinadores, ideologias e muitos jogadores. O que será, de certa maneira, a realidade futura da seleção lusa. Resta saber o perfil do selecionador português. Português ou estrangeiro? O Observador apurou que a escolha de Fernando Gomes deverá tender para a segunda opção.
Escolher um estrangeiro poderá ter vários pontos positivos. Seria porventura menos afeto a estatutos e a nomes, e mais frio e distante na hora de analisar os desempenhos na Liga Portuguesa. Mas há mais: um treinador com historial no futebol e uma escola de futebol atrativa poderá envolver novamente o público e cativar os jogadores. O Observador fez uma lista com algumas opções. Frank Rijkaard, um holandês de 51 anos, parece ser uma solução interessante. Grande carreira como jogador e um percurso satisfatório no Barcelona como treinador, que culminou com dois campeonatos e uma Liga dos Campeões. Fala espanhol e até já esteve duas vezes perto de vestir a camisola verde e branca (a do Sporting, pois claro). Como jogador e depois como treinador. Quem será o eleito?