O presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML) escudou-se na lei 50/2012 para justificar as alterações estatutárias da EMEL (Empresa Municipal de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa), decididas no dia 22 de outubro, à margem da Assembleia Municipal de Lisboa (AML). António Costa argumentou que a lei já existe desde 2012 e, como tal, as alterações estatutárias da EMEL, efetuadas pelo executivo camarário e contrariando um parecer da AML, “não se tratavam de uma grande inovação” jurídica.
António Costa começou a sua intervenção na reunião da AML por garantir que “a Câmara procura sempre respeitar a Assembleia Municipal”. No entanto, as posições da CML e da Assembleia sobre a recente alteração dos estatutos da EMEL são, aparentemente, inconciliáveis. Se Costa acredita que cabe à Câmara de Lisboa a exclusividade de alterar os estatutos da empresa, a AML, onde só o PS é exceção, acredita que deve ser escutada sobre esta matéria.
No entanto, António Costa lembrou que a lei 50/2012, aprovada a 31 de agosto desse ano, só prevê que seja a AML a deliberar sobre “a dissolução, transformação, integração, fusão ou internalização” ou quando se trata da alienação das empresas locais, o que não é o caso da EMEL.
Nesse sentido, apesar de ter competido à Assembleia a constituição da empresa responsável pelo estacionamento e pela mobilidade em Lisboa, segundo a lei, não lhe compete pronunciar-se sobre a alteração dos seus estatutos. Esta é a interpretação do presidente da Câmara de Lisboa, sustentada num parecer do seu departamento jurídico, que terá pedido ainda antes da presidente da AML e eleita pelo Movimento Cidadãos por Lisboa, Helena Roseta, e a 8ª Comissão Permanente da Assembleia Municipal terem mostrado a sua discordância.
O candidato socialista a primeiro-ministro lembrou, também, as alíneas f) e g) do artigo 10º, inscrito nos estatutos da EMEL, que explicam que é à Assembleia Geral da empresa que “compete deliberar sobre quaisquer alterações aos estatutos e aumentos de capital” e “sobre assuntos de interesse para a empresa”.
Assim sendo, Costa considera que cabe à CML, através de Manuel Salgado – mandatado representante do município na assembleia da empresa – aprovar alteração dos estatutos que permitirá à empresa ter novos “projetos de internacionalização” e poder vir a gerir os transportes públicos (concretamente a Metro e Carris).
A Assembleia Municipal ficou marcada, também, pela troca de acusações entre a oposição, com Vítor Gonçalves (PSD) à cabeça, e os vereadores e deputados municipais socialistas. Os ânimos exaltaram-se de tal forma que a presidente da Assembleia, Helena Roseta, foi obrigada a intervir, pedindo “um pouco mais de civismo” e de “dignidade”.
Vítor Gonçalves abriu as hostilidades ao afirmar que a decisão do executivo de Costa era uma “ilegalidade de todo o tamanho” e “um desprezo total” pela AML. Foi ainda mais longe questionando Costa se, quando for eleito primeiro-ministro de Portugal, “respeitará da mesma forma a Assembleia da República”.
Do lado socialista, a resposta não se fez esperar e voaram críticas ao processo de privatização da Metro e da Carris posto em prática pelo Governo de Passos Coelho. Aliás, tal como explicou João Pinheiro, deputado municipal eleito pelo PS, a mudança de posição da bancada socialista sobre esta matéria – o PS votou favoravelmente o primeiro parecer contra a decisão da Câmara – prende-se exatamente com este ponto: se o plano, algo “oculto”, de Passos e Portas é privatizar estas empresas, que seja a Câmara Municipal a salvaguardar os interesses dos lisboetas. A oposição, pela voz do deputado do PSD Sérgio Azevedo, considerou este discurso como uma “pirueta” política.
Os deputados municipais acabaram por votar favoravelmente, com votos contra da bancada socialista, o ponto 10 do parecer da 8ª Comissão Permanente que “recomenda[va] ao plenário que a CML [submetesse] à AML a proposta de alteração de estatutos da EMEL, para que esta se possa pronunciar como lhe compete”.
Helena Roseta assumiu como posição pessoal a decisão de pedir à tutela, ou seja, à direção geral das Autarquias Locais um parecer sobre as competências dos vereadores nesta matéria de alteração de estatutos da EMEL.