Começou triste, desamparado, perdido numa estrada que não conhece. Aquele corredor esquerdo não é para ele. Uma exibição pobre de Samaris devolveu-o ao centro do terreno e… o Benfica ganhou. Falamos de Talisca, sim. O miúdo nascido em 1994 voltou a resolver e com um grande, grande remate. Aquele pé esquerdo tem golo e vale pontos. Os campeões nacionais voltaram a ganhar (2-1 vs. Rio Ave) depois da derrota em Braga (1-2) e seguram a liderança.

O passado recente não foi muito meigo com o Rio Ave nas últimas deslocações ao Estádio da Luz entre 2010 e 2014 (campeonato): 5-2, 5-1, 6-1 e 4-0. A Supertaça em agosto, que culminou numa vitória para os encarnados por penáltis, já mostrou um outro Rio Ave, agora com Pedro Martins. Gaitán ficou no banco, para descansar para o duelo contra o Mónaco. Jesus apostou em Salvio, Samaris, Enzo, Talisca (na esquerda), Jonas e Lima. Era, portanto, uma equipa a olhar para a frente, mesmo sem o génio maior.

O grego Samaris voltou a merecer uma oportunidade. E começou mal, a primeira parte foi fraquinha — seria substituído ao intervalo. É irresistível lembrar que jovens como João Teixeira, André Gomes e Bernardo Silva nunca tiveram tantas oportunidades. Os dez milhões investidos assim o impõe. Talisca foi colado à linha, o que poderia fazer sentido, ou mais sentido, se o lateral fosse outro que não André Almeida. Se estivesse em campo um lateral como Fábio Coentrão ou Siqueira, de qualidade, com pedalada para fazer todo o corredor, o canhoto brasileiro poderia cair para o centro com naturalidade. Não aconteceu muito durante a primeira parte. Talisca esteve algo perdido, e perdeu também oportunidades de fazer o que faz melhor: rematar.

O jogo começou mexido. O Benfica impôs-se, na posse de bola e no terreno, mas o Rio Ave não estacionou nenhum autocarro. Ukra, Esmael e Del Valle são mexidos por natureza e criaram alguns problemas com a movimentação deles. O barbudo Tarantini é o patrão, líder natural, bom de bola, com um coração gigante e que remata sempre que pode. Tiago Pinto, o lateral esquerdo da equipa de Pedro Martins, voltava à casa onde começou em miúdo, onde o pai foi capitão durante alguns anos quando vestia a camisola 8.

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O primeiro a criar perigo foi Lima (16′), que tem andado desligado dos golos e das grandes exibições. O brasileiro ex-Sp. Braga não anda bem. Um minuto depois foi Enzo que, depois de ultrapassar três, quatro adversários, rematou à figura. O lance foi iniciado numa correria louca de Jonas pela esquerda. Afinal, o ex-Valência tem pedalada, desenganem-se aqueles que o consideram um avançado para estar quieto à espera da bolinha.

Esta primeira parte não teria golos. Lisandro, depois de um canto, Lima e Talisca estiveram perto. Cássio, aquele que muitas vezes engata nos grandes jogos e facilita nos mais pequenos, apresentou-se a grande nível. Do outro lado, Wakaso fez Júlio César brilhar à passagem do minuto 35, com um remate de longe.

O intervalo chegaria pouco depois, sem que nada acontecesse digno de registo. Faltava ao Benfica um canhoto na lateral esquerda para dar outra profundidade; faltou uma boa ligação entre o meio-campo; faltou Samaris jogar futebol; faltou Enzo estar mais acertado e preponderante; faltou Gaitán.

Samaris não voltou do balneário, o que não surpreendeu ninguém. Entrou Gaitán, o homem do famoso pé esquerdo. Lima voltou a ser pioneiro a assustar os rivais, desta vez foi de livre direto: valeu Cássio. Os cinco minutos a 300 à hora do Benfica culminaram com um cabeceamento de Salvio, que ameaçou marcar o primeiro da noite. O cruzamento foi de quem? De Gaitán, pois claro. Que classe. Bela entrada da equipa da casa nesta segunda parte.

Seguiram-se 15 minutos tranquilos, com uns ataques estéreis aqui e ali. A esta acalmia, tal e qual como um tsunami que suga a água e depois devolve-a com uma força imensa, seguiu-se o momento da noite. O protagonista? Talisca. O canhoto voltou ao centro do terreno depois da saída de Samaris e em boa hora o fez. Aos 60′, Anderson Souza Conceição, ou Talisca, recebeu a bola, percorreu uns metros e colocou com o pé esquerdo fora do alcance de Cássio. Que grande golo do novamente melhor marcador da Primeira Liga — oito golos.

A última meia hora teve um lance polémico. Um contra-ataque bem desenhado pelo Rio Ave pela direita culminou com um passe para o centro, onde esperava Esmael para empurrar para a baliza de Júlio César. O avançado não falhou, mas o fiscal tinha a bandeira levantada. As imagens com a linha na Benfica TV parecem mostrar que o pé de Esmael está adiantado relativamente à bola.

Os quase 37 mil adeptos já adivinhavam uma noite tranquila, sossegada e com mais três pontos no papo quando Tarantini quase gelou o Estádio da Luz. Foi um gesto técnico belíssimo, com um cabeceamento difícil quase à altura do joelho, que saiu perto do poste esquerdo de Júlio César. Faltavam apenas quatro minutos para os 90 e, claro, já se imaginava um texto e titulo a piscar o olho ao trocadilho com Quentin Tarantino, o realizador. Tarantini seria o protagonista dessa película.