A arte chocalheira já foi o ganha-pão de muitos. Hoje, contam-se pelos dedos os mestres chocalheiros em Portugal. O perigo iminente do desaparecimento desta arte nacional foi um dos motivos que levaram a UNESCO a aceitar, em maio deste ano, a candidatura da Arte Chocalheira à Lista do Património Cultural Imaterial com Necessidade de Salvaguarda Urgente. A decisão final chega em novembro de 2015.
Esta quinta-feira, Paulo Lima já teve uma vitória. O cante alentejano entrou na prestigiada lista de Património Imaterial da Humanidade da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). Depois de conduzir o processo a bom porto, é hora de focar as atenções na arte chocalheira, cuja candidatura a outra lista, a de Património Cultural Imaterial com Necessidade de Salvaguarda Urgente, também está a coordenar.
Em maio, quando a candidatura foi aceite na UNESCO para ser avaliada pela Comissão de Especialistas, Paulo Lima explicou à agência Lusa que aquele selo de qualidade é “muito importante” para a arte chocalheira, pois “está quase a desaparecer”. Dos 13 mestres chocalheiros que restam no país, a maioria no Alentejo, “nove têm mais de 70 anos e os outros têm entre 30 e 40 anos, mas nenhum tem aprendiz”, disse.
Ao Observador, Bernardino António Bengalinha Pinto, presidente da câmara de Viana do Alentejo, confirma que há muito pouca gente dedicada à arte chocalheira. “A capital do chocalho será Alcáçovas e aqui há cinco ou seis pessoas, mas porque há uma fábrica”. É a Chocalhos Pardalinhos, criada “há três ou quatro anos por uns empresários jovens, filhos de pais chocalheiros, numa das raras transmissões de geração para geração”, disse. Há mais alguns sítios onde se produzem chocalhos, mas de forma ainda mais artesanal.
Na altura, Paulo Lima descreveu a utilidade dos chocalhos como “uma espécie de GPS do gado que permite saber onde estão os animais”, bem como “um bem imaterial quase invisível”, mas “identitário dos campos e do mundo rural português”. “Para um urbano, o desaparecimento dos chocalheiros pode não ter importância, mas quem conhece e vive nas zonas rurais sabe que implica deixar de ouvir esse característico som dos campos, que é o do rebanho com os chocalhos”, disse.
O projeto da candidatura é organizado pelo Turismo do Alentejo, em parceria com a Câmara de Viana do Alentejo e a Junta de Freguesia de
Alcáçovas. Mas a organização faz questão de frisar que esta manifestação cultural é transversal ao país, nomeadamente aos concelhos de Bragança, Tomar, Cartaxo e Angra do Heroísmo, ainda que no Alentejo tenha maior expressão. Depois de aceite, a UNESCO está a analisar mais a fundo e a pedir mais informação. “Eles já nos mandaram uma carta com elementos que precisamos de completar”, disse o presidente de Viana do Alentejo.
Numa publicação do Turismo do Alentejo, a presidente da Junta de Freguesia de Alcáçovas, Sara Pajote, disse que a aceitação da candidatura pela UNESCO poderia ser “uma luz ao fundo do túnel e uma forte possibilidade de ver valorizada uma arte em vias de extinção”. É precisamente em Alcáçovas que fica o Museu dos Chocalhos, antiga oficina de João Chibeles Penetra, um dos artesãos da freguesia. Ali foi colecionando, durante 60 anos, chocalhos de diferentes tamanhos e marcas, que se tornaram numa coleção considerável.
Bernardino António Bengalinha Pinto destaca, desde logo, “a valorização da própria arte e das pessoas que a trabalham, e a divulgação”. Também para a promoção do desenvolvimento económico local “os selos da UNESCO são muito importantes”, disse.
A candidatura da Arte Chocalheira está enquadrada num projeto do Turismo do Alentejo que visa a valorização do Património Imaterial. Até agora foi a única aceite, mas o projeto integra também as candidaturas das Tapeçarias de Portalegre, dos Tapetes de Arraiolos e das Festas do Povo de Campo Maior.