Era como o algodão: Fabiano não enganava. Era-o porque, tal como o algodão que mal toca em pó fica com as provas à vista, a roupa do guarda-redes, durante o aquecimento, não deixava o relvado mentir. Estava mau, não péssimo, mas mau, sobretudo junto das balizas, onde o brasileiro ficava pintado de castanho cada vez que se atirava uma bola o obrigava a atirar-se para a relva.

Lopetegui, cauteloso como sempre, bem dissera que, do outro lado, Rui Quinta sabia “o que [tinha] a fazer para dificultar” o jogo aos dragões. Talvez. Mas a fórmula que tornou difícil a vida da equipa foi inventada pelo clima: chuva com fartura, lama sobretudo nas áreas e ao centro do campo, e frio. Resultado — pouca bola a rolar na relva, muita a viajar pelo ar e a ir para perto das linhas laterais, onde a relva ainda estava mais verde do que castanha. Não augurava nada de bom.

Penafiel: Tiago Rocha; Grilo, Pedro Ribeiro, Bura e Dani; Hélder Ferreira, Rafa Sousa e João Martins; André Fontes, Vítor Bruno e Rabiola.

FC Porto: Fabiano; Danilo, Maicon, Martins Indi e Alex Sandro; Casemiro, Óliver Torres e Hector Herrera; Cristian Tello, Ricardo Quaresma e Jackson Martínez.

E não o foi durante muito tempo. Do Penafiel veio o primeiro remate, logo aos 3’, pelo pé direito de João Martins. Forte e rasteiro, mas ao lado. Minutos depois viu-se Tello, fiel aos costumes, a receber a bola na esquerda, inventar simulações enquanto levava a bola rumo à entrada da área, para dentro, antes de rematar. Era no espanhol e em Ricardo Quaresma, do outro lado do campo, que a bola parava muitas vezes, para fugir à lama e ser atirada para a área, com cruzamentos atrás de cruzamentos.

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Os anfitriões, assim que recuperavam a bola, preocupavam-se em atirá-la bem rápido para Rabiola, o avançado que servia de farol para a agarrar e esperar que a equipa se aproximasse dele. Poucas vezes o conseguiu. Só a partir dos 20 minutos alguém atinou com o relvado. E foi o FC Porto, que começou a aproximar os jogadores entre si e mandou-os continuarem a levantar a bola, sim, mas a picá-la de pantufas, mesmo em passes curtos, só para garantir que chegavam ao destino sem a relva retardar a viagem. A chuva e a lama, afinal, não enganavam — só assim se jogaria futebol em Penafiel. E eles perceberam.

E foi assim que um passe chegaria aos pés de Jackson Martínez, aos 30’, para o colombiano, com um toque, controlar a bola para o ar e, com um segundo, a atirar para o caminho de Casemiro. Dentro da área, o brasileiro esperou que o guarda-redes Tiago Rocha — o único, pois o Penafiel não tinha outro no banco de suplentes — se atirasse aos seus pés para também ele picar a bola. Ela foi em direção à baliza, pela relva, que a tramou e abrandou, obrigando Hector Herrera a esticar a perna e ser ele a marcar. 1-0, lição aprendida, mas executada com batota — Casemiro estava em fora de jogo.

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A chuva não parava e continuava a abrir cicatrizes na relva. O golo portista tratou de abrir duas na defesa do Penafiel, três minutos volvidos: a primeira após um defesa cortar um cruzamento, para deixar o pequenote Óliver sozinho na fronteira da área para receber o passe de Danilo; e a segunda no meio dos centrais, que se afastaram e deixaram Jackson ainda mais solitário e à espera que a bola lhe chegasse. O espanhol enviou-a numa missão e o colombiano fez por cumpri-la, rematando de primeira rumo à baliza deserta. O 2-0 surgia à segunda hipótese que os dragões criaram para marcar.

Eficácia? Por supuesto, diria Lopetegui, aliviado, à frente do banco de suplentes, sempre em pé e tão molhado como os 22 homens que andavam a correr pelo relvado. Os dragões aproximaram-se entre si, encurtaram ao máximo a distância dos passes e nem davam tempo para que o adversário tentasse fazer o mesmo. Tudo o que o Penafiel não conseguia fazer. Só aos 42’, quando a bola chegou a Fabiano e o guardião quis fintar Rabiola, é que os anfitriões tiveram um canto.

Os 15 minutos, além de servirem para descansar, deram tempo para que a chuva ficasse com o relvado só para si. Agora não enganava mesmo. Bastava ter olho para ver que as poças de água já eram muitas e a lama espreitava por todo o lado. A coisa piorava, mas a segunda parte começava como a primeira — o Penafiel a rematar logo no arranque, agora aos 47’, e de novo por João Martins, desta vez com a cabeça, depois de André Fontes lhe cruzar a bola. Era um aviso, e seria o único.

Porque o dom de um relvado coberto de água e lama é mesmo esse: o de equilibrar as coisas e inutilizar as diferenças entre os pés que estão em jogo. Assim, como estava, com pontapés para o ar, bolas a travarem na relva e faltas atrás de faltas, não havia pequenos contra grandes. Só uma luta para ver quem tinha mais raça e luta para dar. Ou trapalhada, como a que Maicon e Casemiro deram, aos 50’, quando ambos iam chutar a bola que um livre de João Martins deixara na pequena área e pararam os dois. Encravaram, ninguém a tirou dali e deixaram-na no pé de Rabiola, que rematou para o 2-1.

E durante dez minutos a tal raça, luta e vontade passou a morar mais do lado do Penafiel. Os anfitriões ganhavam duelos, ressaltos e bolas pelo ar. Os dragões não passavam do meio campo e Lopetegui assustou-se. Tirou Quaresma e atirou para a guerra Iván Marcano, um central grandalhão, colocando-o a meio campo. Mais força. Resultou, porque de bola na relva havia pouco e de tudo o resto via-se muito. Coisas bonitas, boas de se ver, é que só houve uma, por cortesia de Jackson Martínez.

Encostado à linha de fundo, o colombiano, para se livrar de dois contrários, lembrou-se da roleta à Zidane e, depois, cruzou a bola para a área. Perto do segundo poste viu-se outra trapalhada entre Herrera e Casemiro: ambos tentaram rematar e anularam-se um ao outro. E aos defesas do Penafiel, que ficaram a olhar e deixaram o brasileiro passar a bola a Óliver, que a meio metro da baliza só teve de encostar. Era o 3-1, o terceiro golo ao terceiro remate certeiro na baliza e o fim do susto.

Porque o encontro, depois, piorava a cada minuto e chamar-lhe feio era quase um elogio. O Penafiel continuou a lutar com a energia que tinha e os portistas a aguentarem como o relvado deixava. Só Tello, aos 79’, esperou por uma bola à direita do ataque, onde a relva melhor parecia estar, pedalou (passou a perna por cima bola, sem lhe tocar) uma vez, livrou-se de dois defesas e rematou para Vítor Rocha defender. Os brasileiros até chamam ao futebol jogo bonito, mas, além dos truques de Jackson e Tello, quase tudo o que se passou em Penafiel foi feio.

Ali, com a aquele relvado, a eficácia, para o FC Porto, teve a taxa de câmbio nos três golos. Os dragões aproveitaram as oportunidades, nem sempre lutaram tanto como o Penafiel, mas acordaram sempre que conseguiram levar a bola perto da baliza do adversário. Com chuva e lama, portanto, se pintou a sexta vitória consecutiva da equipa de Julen Lopetegui e a 12.ª derrota no campeonato da orientada por Rui Quinta.