A 10 de maio de 1958, no café Chave d’ Ouro, no número 38 do Rossio, em Lisboa, o candidato da oposição às presidenciais deu a conferência de imprensa em que o correspondente em Lisboa da agência noticiosa France Presse (AFP), Lindorfe Pinto Basto, fez a pergunta.
“Senhor general, se for eleito Presidente da República, que fará do senhor Presidente do conselho?”, perguntou, depois de ter notado que, num país que vivia em ditadura, os jornalistas “estavam todos ‘nas encolhas'”.
“Vi que os meus colegas estavam todos nas encolhas. Eles não podiam falar. Eu pertencia à France Presse. Fiz a pergunta. Tinha de a fazer. O general parecia que estava à espera”, lembrou Lindorfe Pinto Basto numa conversa com Iva Delgado, filha do general que “perdeu” as eleições para o candidato do regime, Américo Thomaz, no meio de acusações de fraude.
“Obviamente demito-o!” foi a resposta usada pelos jornalistas, mas, mesmo passado meio século, as versões não são todas coincidentes, como descreve o neto do general, Frederico Delgado Rocha, no livro “Humberto Delgado – Biografia do General sem Medo” (Esfera dos Livros), agora reeditado por ocasião dos 50 anos do seu assassinato.
A frase, lê-se no livro, foi registada com “nuances” pelos diferentes jornalistas desde a pontuação ao tempo verbal e à própria ordem das palavras. As duas variações assinaladas no livro são: “Demito-o, obviamente” e “mas obviamente demito-o”. Em 1998, numa conversa com Iva Delgado, Pinto Basto, que era correspondente da AFP desde 1948, registou outra frase: “Demito-o, é óbvio”.
António de Oliveira Salazar, o presidente do Conselho, voltou a estar no centro da conferência de imprensa, quando lhe foi perguntado o que pensava o general do ditador e ele gracejou: “Como chefe do Governo, como pessoa ou como chefe de família?”. Como chefe do Governo, o general respondeu que “se deve ao doutor Salazar um trabalho interessante de arrumação das finanças portuguesas, nos primeiros anos de exercício de cargo de ministro das Finanças”.
“Mas, como chefe do governo nunca evoluiu e como economista está absolutamente obsoleto”, afirmou.
A morte do “general sem medo” ocorreu a 13 de fevereiro de 1965.
Humberto Delgado foi morto por agentes da polícia política da ditadura, a PIDE, após ter sido atraído para uma cilada em Badajoz (Espanha), montada em redor de uma pretensa reunião com militares portugueses, oposicionistas a Salazar.