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"Até me falharam as pernas, mas o braço ainda lá chegou"

Este artigo tem mais de 5 anos

Foi quase e só faltou a bola passar no meio dos postes para, pela primeira vez, Portugal vencer a Nova Zelândia em râguebi de sete. O empate já fez história. Agora falta chegar aos Jogos Olímpicos.

Nuno Sousa Guedes, de 20 anos, marcou o ensaio que deu o empate (24-24) de Portugal contra a Nova Zelândia. Foi o 20.º ensaio do portuense no circuito mundial de sevens
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Nuno Sousa Guedes, de 20 anos, marcou o ensaio que deu o empate (24-24) de Portugal contra a Nova Zelândia. Foi o 20.º ensaio do portuense no circuito mundial de sevens

World Rugby/Martin Seras Lima

Nuno Sousa Guedes, de 20 anos, marcou o ensaio que deu o empate (24-24) de Portugal contra a Nova Zelândia. Foi o 20.º ensaio do portuense no circuito mundial de sevens

World Rugby/Martin Seras Lima

O relógio estava apressado, ou pelo menos parecia, como sempre parece aos olhos de quem corre atrás do prejuízo. Ou atrás de um resultado que não lhe sorri, como nunca sorrira nos 22 jogos anteriores com a Nova Zelândia. E a pressa, a tal, aumenta quando à frente se tem uma equipa de sete barreiras de músculo vindas do país que ganhou 12 das 15 edições do circuito mundial de sevens. Mas ali, em Hong Kong, com o sol a rir-se de alto com a ação e com 40 segundos a sobrarem na corrida do relógio, havia mesmo uma urgência — a de correr. Porque os sete portugueses estavam perto, bem perto, de empatarem ou até ganharem aos sete neozelandeses que tinham à frente. Algo que nunca acontecera.

Bastava um ensaio, mais um, e Nuno Sousa Guedes sabia-o. Lá estava atrás da linha do meio campo, paciente, à espera que, de novo, a bola lhe fosse parar às mãos. Quando ela chegou o portuense teve ordem para arrancar: acelerou rumo aos adversários e, um metro antes do choque, decide mudar de direção. Eram demasiados corpos alinhados, vestidos de preto e prontos a placá-lo, portanto, decidiu largar a bola, chutá-la com um pé, pela relva, e ir apanhá-la mais à frente. Sucesso. O português ultrapassa os neozelandeses e agarra de novo a bola, mas as pernas falham-lhe. Cai, levanta-se rápido, até gatinha um pouco, mas já está rodeado e não demora a ser parado.

Nova jogada é precisa e Bernardo Seara Cardoso despacha-se a tirar a bola dali. Nem dez segundos faltam para acabar o jogo e o passe vai parar a David Mateus, que finge ir para a esquerda, mas aponta a corrida para a direita. O matulão galga uns metros até atirar a bola, de novo, para Nuno Sousa Guedes que, à frente, só tinha um neozelandês. O português vai às reservas de energia, acelera, troca a direção dos pés e finta o adversário. A linha de ensaio nem a uns dois metros estava e Nuno começa a cambalear. “Até me falharam as pernas, mas felizmente consegui esticar o braço ainda lá chegou”, diz, lembrando o quão exausto estava para, no momento, nem ter noção do que acabara de fazer.

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Porque estar 14 minutos a correr, sprintar, parar, arrancar de novo, mudar éne vezes de direção e passar uma bola oval entre uma equipa com sete jogadores não é pêra doce. Muito menos se for num relvado praticamente com o tamanho de um campo de futebol. Nuno estava de rastos. “Só depois de me levantar é que olhei para o placar e vi que estava 24-24. Mas apenas consegui cair em mim e começar a pensar quando o árbitro olhou para mim e disse que faltavam 10 segundos para chutar”, conta ao Observador. O empate, o primeiro que Portugal conseguia frente à Nova Zelândia, podia passar a vitória caso Nuno acertasse com a bola no meio dos postes. É normal, por isso, que alguém com 20 anos tenha “ficado um bocado nervoso”.

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Diogo Mateus, capitão da seleção nacional de Sevens, a consolar Nuno Sousa Guedes, após o empate (24-24) frente à Nova Zelândia.

Mesmo que, antes de pegar na bola e a chutar, Diogo Miranda, outro jogador da seleção, lhe tenha dito: “A história já está feita, por isso não tens pressão nenhuma.” Mas ela, teimosa, insistiu em ficar. “Claro que tive pressão e nunca mais me vou esquecer de ter falhado este pontapé. Mas é com os erros que se aprende e da próxima espero lá estar para não falhar”, garante, ao recordar o momento em que até o estádio se uniu num bruá, um lamento ouvido num “óóó” quase uníssono, a lamentar o chuto falhado (no râguebi, cada ensaio vale cinco ponto e dá direito a um pontapé de conversão que, caso acerte entre os postos, dá mais dois pontos à equipa que o converte). Diogo Mateus, o capitão de 35 anos, mais do que habituado a estas andanças, apressou-se a, no final, dar uma palavra ao novato. “Não me lembro ao certo o que lhe disse”, confessa, embora tenha a “certeza” de que lhe terá dado “um abraço de parabéns e de apoio”.

Há quatro taças disputadas em cada torneio do circuito mundial de sevens. A Cup (do 1.º ao 4.º lugar), para qual se apuram os dois primeiros classificados de cada grupo, distingue o vencedor do torneio. Na Plate (do 5.º ao 8.º) caem as equipas derrotadas nos quartos-de-final. Depois há a taça Bowl (9.º ao 12.º), com os dois últimos classificados de cada grupo. A última é a Plate (13.º ao 16.º), que junta os perdedores dos “quartos” da taça Bowl.

Porque “só um atleta que esteja tenha estado na posição dele, cansado após 14 minutos de jogo de sevens e de ter acabado de furar a linha duas vezes, acabando por marcar o ensaio pela equipa, ainda ter que se acalmar em 40 segundos, concentrar-se, e tentar uma conversão muito difícil”. Nuno Sousa Guedes falhou-a, sim, mas Portugal fez história, como já o fez muitas vezes. “Só nos falta ganhar a eles [Nova Zelândia] e às Fiji. Fazemos parte do grupo exclusivo de 15 seleções residentes no circuito mundial de sevens”, realça Pedro Netto, selecionador nacional que considera “o resultado e a forma” como Portugal jogou “com a Nova Zelândia num palco como o Torneio de Hong Kong, sem dúvida, um ponto alto”.

Rumo aos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro

Esta foi a sexta etapa do circuito e Portugal de lá saiu com apenas um ponto. Culpa das quatro derrotas em cinco jogos que, por isso, continuam a deixar a seleção no 14.º posto do circuito feito por 20 equipas. “Desde que o estatuto de equipas residentes deixou de ser atribuído por convite e passou a ser disputado com uma classificação que estamos cá”, enaltece Pedro Netto. A seleção vai na sexta participação e, hoje, é uma equipa “respeitada” e que “ninguém deseja apanhar na fase de grupos”, assegura Diogo Mateus, tão seguro quanto a garantia que dá logo a seguir: “se por acaso alguém entra despreocupado [contra Portugal], serão surpreendidos.”

“A nossa apetência para a variante de sevens sempre se revelou. Temos no historial oito títulos europeus. Desde que o estatuto de equipas residentes no SWS deixou de ser atribuído por convite e passou a ser disputado com uma classificação que estamos cá. É evidente que, morfologicamente, as dimensões dos nossos jogadores, nos avançados, francamente mais baixos e leves que os nossos adversários, nos cria à partida uma desvantagem no râguebi de 15 que não acontece tanto na variante dos sevens” — Pedro Netto

Uma surpresa, das grandes, aconteceu em 2007, quando o râguebi português, na altura bem mais amador do que profissional, se qualificou para o Mundial na variante de 15. Diogo Mateus estava lá e foi um dos que suportou o peso da derrota (108-13) que a Nova Zelândia depositou em cima dos portugueses. A participação nesse Campeonato do Mundo foi o cume ao mais alto ao qual Portugal escalou. Agora, em sevens, a seleção está a tentar outra escalada — chegar aos Jogos Olímpicos de 2016, no Rio de Janeiro, e à primeira vez que esta variante de râguebi estará presente na competição.

Diogo, admite, pensou “duas vezes” antes de, com 35 anos, “aceitar o convite” para mergulhar nesta caminhada. Mais do que a idade, foi uma lesão no joelho a dar-lhe corda às dúvidas. “Após a minha lesão no joelho, não pensava voltar a jogar. Já me estava a consciencializar que chegara a tal altura que eventualmente chega a todos os atletas”, confessa. Mas ela não chegou, a bem de uma “recuperação sem pressas” e do “receio” que Diogo Mateus “foi perdendo”. Por isso, e “enquanto tiver saúde”, vai aproveitar “a última hipótese de, dentro de campo, ajudar a seleção neste projeto tão aliciante”.

E não vai ser fácil, nada mesmo, como não o fora em 2007. Do circuito mundial de sevens apenas as seleções que terminarem nos quatros primeiros lugares do ranking garantem a qualificação direta (por enquanto, são a África do Sul, Fiji, Nova Zelândia e a Austrália). A Portugal daria jeito que uma delas fosse europeia (a Inglaterra está no quinto lugar). Pois, em maio, há Campeonato da Europa de Sevens, que apenas dá o apuramento ao vencedor e, em junho e julho, realizar-se-á um Torneio de Repescagem europeu que dará outra vaga de qualificação direta. Ou seja, se as equipas mais fortes (Inglaterra, Escócia, França e País de Gales) entrarem pelo circuito mundial, não participarão nesta fase. Ao todo, há 11 vagas para o torneio olímpico de sevens, sendo que o Brasil (que está no 16.º lugar do circuito mundial), como anfitrião, já lá está.

World Rugby Sevens Series - Hong Kong SevensQuénia 21 - 0 Portugal Seleção Nacional desgastada e desfalcada não...

Posted by Federação Portuguesa de Rugby (Página Oficial) on Sunday, 29 March 2015

O que aos olhos de Portugal seria um bom sinal, que “tem no historial oito títulos europeus”, recorda Pedro Netto, o selecionador, e trabalha “desde agosto [de 2014] com a certeza que tudo fará” para chegar ao verão “na máxima força para atacar a qualificação olímpica”. Bom seria também “sair de Tóquio”, no Japão, da sétima etapa do circuito que se realiza no próximo fim de semana, “com uma pontuação confortável”. Porquê? Primeiro, para aliviar a pressão para os dois últimos torneios, em maio. E o selecionador explica o resto: “Por um lado, poderíamos descansar os jogadores mais utilizados ao longo do ano. E, por outro, daríamos rodagem aos que, por diferentes razões, não puderam estar com o grupo dos sevens durante a época.”

Uma vitória contra a Nova Zelândia fica para depois. Ou para outra altura que poderá nem demorar a aparecer, já que, em Tóquio, a seleção também jogará no grupo dos monstros do râguebi. E Pedro Netto bem o diz: “Acredito que será uma questão de tempo até ganharmos.”

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