Cerca de 900 imigrantes estão desaparecidos no mar Mediterrâneo, depois de a traineira onde viajavam com destino a Itália ter naufragado a 60 milhas da costa da Líbia, informam meios de comunicação social locais. A confirmar-se, terá sido o pior desastre dos últimos tempos a envolver imigrantes no Mar Mediterrâneo, afirmou Joseph Muscat, primeiro-ministro de Malta.

As mesmas fontes, citadas pelas agências EFE e AFP, acrescentam que terá sido o cargueiro português “King Jacob”, registado na Madeira, o primeiro a prestar auxílio, tendo ajudado a salvar cerca de 28 pessoas. Foram estes que contaram que o barco transportava aproximadamente 700 pessoas. Contudo, novos dados apontam para que o número de imigrantes desaparecidos ascenda a cerca de 950 em vez dos 700 inicialmente estimados, segundo contou um sobrevivente natural do Bangladesh, de acordo com a Renascença. O alerta foi dado à meia-noite.

Apesar de o barco ter pavilhão na Madeira, da tripulação não faz parte qualquer elemento português, segundo disse Mark Clark, diretor do Navigate Group, em declarações à SIC. “A maioria da tripulação é de várias zonas. Serão provavelmente das Filipinas, mas nenhum [dos tripulantes] é de Portugal”, comentou.

O naufrágio deste domingo já não é novidade para quem está a bordo do King Jacob. “É o segundo incidente em que o nosso navio está envolvido. A primeira vez foi no início da semana, a 15 de abril, quando cerca de 500 pessoas foram resgatadas para a costa. Eram pessoas da Eritreia, da Somália e da Síria”, contou Mark Clark.

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De acordo com a CNN, a traineira terá feito um pedido de ajuda urgente no sábado à noite. O italiano Corriere della Sera  conta que os tripulantes do navio de bandeira portuguesa “King Jacob” viram o momento em que os imigrantes se deslocaram a um dos lados da traineira /em busca de auxílio), fazendo com que esta se virasse. A Marinha Portuguesa já confirmou o envolvimento deste navio nas operações de busca e salvamento.

O porta-voz, comandante Paulo Vicente, adiantou que o navio com bandeira portuguesa “King Jacob” está envolvido nas operações desde as 22h30 de sábado. E que foi contactado pelo Centro Coordenador de Buscas e Salvamento Marítimos de Itália para prestar assistência.

A marinha de Malta adiantou que seriam cerca de 650 as pessoas que estariam a bordo da traineira. Na operação de resgate, estão envolvidos navios da Guarda Costeira italiana, de Malta e da marinha mercante. Também existem três helicópteros a sobrevoar a costa da Lampedusa.

O porta-voz da Guarda Costeira italiana disse à BBC que estava focada na operação de procura de sobreviventes e de resgate, mas que “em breve, passaria a ser apenas uma busca [por corpos] apenas”. O Alto Comissariado para os Refugiados das Nações Unidas veio dizer, mais tarde, que já tinham sido resgatadas 50 pessoas, conta a Reuters.

De acordo com a agência noticiosa italiana Ansa, já foram retirados do mar 24 corpos. No ano passado, cerca de 170 mil pessoas fugiram dos conflitos no continente africano e do Médio Oriente, em direção a Itália. Estima-se que já tenham morrido milhares de imigrantes.

O primeiro-ministro maltês Joseph Muscat disse que a equipa envolvida na operação de resgate estava”literalmente, a tentar encontrar sobreviventes entre os corpos que flutuam no mar”.

De acordo com a informação avançada pelos sobreviventes, o barco onde seguiam ter-se-á virado quando os imigrantes tentaram chamar a atenção de um navio da marinha mercante, que estava a passar perto da traineira.

10 mil imigrantes envolvidos em operações de resgate

Na última terça-feira, cerca de 400 pessoas também terão perdido a vida a caminho de Itália. De acordo com a informação avançada pela organização não-governamental Save The Children, os imigrantes terão partido da Líbia 24 horas antes do naufrágio.

Entretanto, segundo a BBC, a Guarda Costeira italiana terá ajudado a salvar cerca de 10 mil imigrantes ilegais, que se deslocavam para Itália, na última semana. As Nações Unidas creem que, pelo menos 900 pessoas, já tenham morrido no Mar Mediterrâneo, desde o início do ano.

As Nações Unidas estimam que, desde o início do ano, já tenham chegado a Itália 31.500 imigrantes do norte de África. No ano passado, os números apontam para que 3.500 pessoas tenham morrido nas águas que cercam Itália, em 2014.

Em outubro de 2013, Durão Barroso, então presidente da Comissão Europeia, deslocou-se à ilha de Lampedusa, juntamente com a comissária europeia do Interior, Cecilia Malmström, na sequência da tragédia que vitimizou 289 pessoas.

Na altura, os membros da Comissão Europeia foram recebidos com insultos e gritos de “assassinos”, e Durão Barroso disse que “o problema” que se estava a viver em Iália era um problema de “toda a Europa”. Cecilia Malmström e o presidente da Comissão Europeia visitaram a ilha a convite do primeiro-ministro italiano Enrico Letta.

“A Comissão está convicta de que a União Europeia não pode aceitar que milhares de pessoas morram nas suas fronteiras. O desafio de Lampedusa e da Itália é um desafio europeu”, disse Durão Barroso. Cecilia Malmström disse ainda que “muito mais deveria ser feito”.

O Papa Francisco também escolheu a ilha italiana para a sua primeira viagem apostólica. Foi lá para “chorar os mortos” dos naufrágios de embarcações que transportam imigrantes do Médio Oriente e Norte de África, em julho de 2013. Disse que Lampedusa era um “exemplo para todo o mundo” por ter a “coragem de acolher” as pessoas que fogem dos conflitos na sua terra natal.

Este domingo, o Papa Francisco já se manifestou sobre a tragédia que terá provocado cerca de 900 desaparecidos. “Faço um apelo à comunidade internacional, para agir de forma decisiva e rápida, para evitar que tragédias como esta ocorram novamente”, disse

“Dirijo um premente apelo à comunidade internacional para agir de forma decisiva e rapidamente, para evitar tais tragédias ocorram novamente”, disse o Papa Francisco, citado pelo jornal italiana La Reppublica.

Qual a resposta da Europa?

A União Europeia também já disse que vai organizar uma reunião de urgência com os ministros do Interior e dos Negócios Estrangeiros por causa do naufrágio. O próprio presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, está a estudar convocar uma reunião de emergência dos chefes de Estado e de governo da União Europeia (UE).

Donald Tusk revelou, na rede social Twitter, ter falado com o primeiro-ministro de Malta sobre o assunto e continuará a conversar com líderes europeus, com a Comissão Europeia e com outros organismos para “atenuar” situações como a hoje vivida. Uma decisão sobre a marcação de uma cimeira europeia dependerá do rumo das conversas a ter nesta fase, precisou o porta-voz do Conselho Europeu Preben Aamann, citado pela agência France-Presse.

O presidente francês François Hollande disse que a Europa deve agir face ao aumento da “situação dramática”, referindo-se à fuga de imigrantes do norte de África desde o início do ano. António Guterres, Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, avançou que “este desastre confirma o quão urgente é restaurar uma operação robusta de resgate marítimo e estabelecer vias legais para [que os imigrantes] cheguem à Europa”.

Entretanto, o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, também já se fez ouvir este domingo, pedindo uma cimeira europeia urgente na sequência do naufrágio da embarcação que transportava imigrantes no Mediterrâneo. Renzi, que falava em conferência de imprensa, disse esperar que a reunião tenha lugar até ao final da semana. “Tem que ser uma prioridade”, afirmou. “Não estamos a falar de coisas banais, mas de vidas humanas”, disse Renzi, considerando que o tráfico de pessoas é “um flagelo” para a Europa.