Responsável pela elaboração do programa eleitoral da coligação, José Matos Correia discorre, em entrevista ao Observador, um conjunto de críticas ao programa eleitoral do PS – “uma manta de retalhos cujo único fio condutor é o do oportunismo e do facilitismo” – e aponta o dedo à proposta socialista de reduzir a TSU para depois, “se for preciso”, aumentar a receita da Segurança Social pela via do Orçamento do Estado. “Isto não resolve problema nenhum, é tipicamente a teoria socialista de tirar com uma mão e dar com a outra para ver se ninguém dá por nada”, diz, não especificando, no entanto, qual a proposta da coligação para o problema. Apenas que “o assunto é demasiado sério para se brincar”.

“Não se resolve este assunto diminuindo em milhares de milhões a receita da Segurança Social e depois, à boa maneira socialista, escreve-se lá no programa que, se houver falta de dinheiro, o Orçamento do Estado resolve. Mas com que dinheiro? Aumentamos os impostos? É tipicamente socialista, como dá menos nas vistas retira-se na TSU e diminui-se a receita, depois, se for preciso aumenta-se a receita pela via do orçamento. Isto com toda a franqueza não é sério, porque não resolve problema nenhum. É tipicamente a teoria socialista de tirar com uma mão e dar com a outra para ver se ninguém da por nada”, diz.

Em entrevista a Maria João Avilez, no Observador, o vice-presidente do PSD recusou a ideia de que PSD e CDS não estejam a ser claros quanto àquilo que pretendem fazer para resolver o problema de sustentabilidade da Segurança Social, deixando duas ideias base: que a coligação quer medidas do lado da receita ou do lado da despesa, ou ambas, e que é preciso um entendimento alargado para resolver a questão. “O que não queremos é usar a Segurança Social e a sua sustentabilidade como um jogo político de empurra para aqui e para ali”, afirma.

“O primeiro-ministro foi muito claro quando a isso no último debate quinzenal. Há um problema de sustentabilidade da segurança social, sabemos isso, e portanto temos vindo a preocupar-nos com isso e já dissemos várias vezes que tem de haver um conjunto de medidas, que podem ser do lado da despesa, do lado da receita, ou numa conjugação das duas vias. O que temos vindo a dizer é que a Segurança Social é demasiado importante para os portugueses para estarmos a politizar e partidarizar este debate”, resumiu.

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Mas as críticas ao PS não se ficam por aqui. Criticando o modelo de desenvolvimento económico defendido pelo PS, Matos Correia afirma que a única solução dos socialistas é “gastar”. Diz que foi essa a via escolhida, “erradamente”, até 2011, e que o “modelo proposto pelos economistas do PS continua a ser exatamente o mesmo”: “a ideia de que [o crescimento económico] se consegue através da recuperação do consumo privado e dos gastos desmedidos do investimento público não reprodutivo é exatamente contrária àquilo que nós achamos que temos de fazer”, diz.

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Em comparação com as “garantias” da coligação, Matos Correia está seguro de que “mais clara a distinção não podia ser”: “Nós temos um projeto que é pensado e sustentado, e o PS apresenta um conjunto de propostas a que eu chamo de as propostas do ‘logo se vê’. Nós temos um projeto para Portugal que assenta numa conceção clara do que é o desenvolvimento económico do país, na ideia de que o motor devem ser as exportações e o investimento estrangeiro, que o país não pode viver além das suas possibilidades, que só assim garantimos a sustentabilidade da Segurança Social, enquanto o PS, pelo contrário, propõe-se a aplicar um conjunto de propostas que não tem sustentação, para as quais não há recursos, esperando que um dia um conjunto de circunstâncias permita que a riqueza apareça, que as contas públicas se equilibrem, que a Segurança Social seja sustentável. Acho que mais clara a distinção não podia ser”.

E, já que os social-democratas se mostram convictos de que, desta vez, a linha que separa um e outro é visível a olho nu, então porque não levantar o lume, prometer mais, mostrar mais visão para o futuro, em vez de PSD e CDS continuarem com o discurso em lume brando? Devido às “responsabilidades governativas” acrescidas que PSD e CDS ainda têm em mãos, e que contrastam com as responsabilidades da oposição – “que não tem mais nada que fazer senão opor-se” -, responde o vice-presidente social-democrata.

“Nós não precisamos de nos pôr em bicos de pés porque temos não só a consciência do dever cumprido como também achamos que os portugueses reconhecem o esforço que foi feito”, diz.

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Questionado sobre o que a coligação se propõe a fazer caso vença as legislativas de outubro, Matos Correia pede mais quatro anos para governar sem a troika – “para fazermos as coisas que gostaríamos de poder ter feito mas que não foi possível e para consolidar outras que já foram sendo feitas”. Por exemplo? “Consolidar um conjunto de políticas, nomeadamente na saúde (assegurar a sustentabilidade do SNS), ou na abertura da sociedade do ponto de vista económico, no combate aos privilégios que estavam enraizados na sociedade portuguesa, consolidar a ideia de que cada um deve valer pelo seu mérito e não por estar num setor protegido…tudo isso é um caminho que ainda está por percorrer”.

“Nós pediremos aos portugueses a confiança para continuar esse percurso, mas também para resolver um conjunto de problemas que não conseguimos ainda resolver de uma maneira mais forte porque estivemos presos à necessidade das urgências”, acrescenta.

Reforma do Estado? Uma promessa eleitoral

Admitindo que o forte da atual maioria e do Governo não tem sido a “comunicação”, Matos Correia sai em defesa da tão falada “reforma do Estado”, cujo guião estaria a cargo de Paulo Portas mas que tem sido apontada com uma das bandeiras da coligação que ficou por erguer nos últimos anos. Começa por fazer um parênteses para dizer que não gosta da expressão “reforma do Estado” por “dar uma ideia estática da noção de reforma”, e sublinha que “há muitas coisas que foram feitas em termos de administração pública, da extinção, fusão ou agregação de estruturas, ou em termos da melhoria da relação do Estado com os cidadãos”. Como exemplos, aponta precisamente a reforma da Defesa 2020 e a reforma do mapa judiciário – “Isso não é reforma do Estado?”, atira.

“Temos um Estado porventura mais amplo do que desejaríamos mas também nisso estamos a trabalhar. Por exemplo quando olhamos para o processo de privatizações, de concessões, como as dos transportes, vemos que estamos a trabalhar precisamente no sentido de transferir para outros (ainda que sob controlo do estado) as responsabilidades que não tem de ser diretamente assumidas pelo Estado – a reforma do Estado é isso”.

E se Portugal der ao atual Governo mais quatro anos, a reforma do Estado será “uma das prioridades no nosso programa eleitoral”. O objetivo é, diz Matos Correia, “fazer do Estado uma entidade mais maleável, mais próxima, mais amiga dos cidadãos, no sentido de melhorar muito significativamente aquilo que é a relação dos cidadãos com o Estado mas também o contrário”. Para Matos Correia, é aqui que reside a “grande diferença” entre direita e esquerda: “a direita olha para o Estado a partir da sociedade, a esquerda olha para a sociedade a partir do Estado, como se o Estado se justificasse a si próprio, não faz sentido nenhum”, diz.

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Questionado sobre o seu vaticínio quanto às eleições, Matos Correia diz que não quer dar uma resposta de conveniência e mostra-se “absolutamente convicto” de que “a vitória eleitoral está ao nosso alcance”. Mais: que o discurso da coligação não vai ser assente na política do “medo” e que a coligação não se tem abstido de “fazer política”. “Às vezes não concordo com a forma como se faz política em Portugal, porque gerou-se a ideia de que fazer política é fazer uns rodriguinhos, gerou-se a ideia da política sem conteúdo, a política pela política. Mas a política, se não tiver uma consubstanciação não é nada, é um conjunto de frases ocas. Nós temos vindo a fazer política através de um conjunto de soluções que objetivamente têm vindo a mudar Portugal”, defende.

“Não é uma questão de discurso do medo. É uma questão de dizermos ‘o nosso percurso tem sido este e comprometemo-nos a que seja este’. ‘A prática que nos conduziu a 2011 foi esta e aquilo que o PS nos propõe é exatamente a mesma'”. Será este o discurso, diz.

“Não fabricamos candidatos presidenciais”

Sobre eleições presidenciais, nem uma palavra. Primeiro as legislativas, que são o garante da mudança no país, e só depois as presidenciais. “Pese embora a relevância do cargo presidencial, o lugar estratégico da mudança em Portugal é o Governo, não é a Presidência”, diz, para concluir que não é vantajoso misturar as duas coisas – “cada uma a seu tempo”.

Além disso, José Matos Correia afasta a ideia de que o partido esteja à procura do seu candidato presidencial, já que a lógica é inversa, é o candidato que tem de se apresentar como tal. “Na última moção de estratégia o presidente do partido [Pedro Passos Coelho] definiu o perfil do Presidente da República, que aliás o aproxima muito do atual Presidente, agora nós, enquanto partido não fabricamos candidatos presidenciais. O partido tem a sua noção sobre o cargo e a definição, mas não obrigamos ninguém a ser candidato”, conclui.

O vice-presidente social-democrata rejeita mesmo a ideia de que a direita esteja orfã de candidatos presidenciais por, até ao momento, não ter ninguém da sua cor na corrida (o PS tem, pelo menos, Sampaio da Nóvoa), dizendo de se tratar de uma escola “racional e objetiva”. Não tem sentido nenhum, num momento em que as questões fundamentais são as da governação e das eleições legislativas, colocar o carro à frente dos bois”, diz.

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Esta entrevista pode ser vista na íntegra aqui.