A frase já foi citada demasiadas vezes, reinventada outras tantas, mas o que Gary Lineker — o tal Lineker que fez golos a perder de conta no Leicester, no Everton, no Barcelona ou no Tottenham — realmente disse foi: “O futebol é um jogo em que 22 homens correm atrás de uma bola e no fim ganha a Alemanha.” O avançado inglês marcou contra os alemães na meia-final do Mundial de 1990, em Itália. O jogo terminou empatado no tempo regulamentar, mas, nos penaltis, Pearce e Waddle falhariam a conversão e a Alemanha lá seguiria em frente. Como quase sempre o faz.
A sina de Portugal contra os germânicos vai ao encontro do que Gary alvitrou um dia, cabisbaixo, em Itália, mas isso é nos graúdos, com a miudagem dos Sub-21 não é nem nunca foi assim. Em seis jogos, Portugal venceu quatro, empatou um e perdeu outro — nos idos de dezembro de 1996, por 2-1. A última vitória foi em 2011, num jogo particular, e a Seleção venceria a mini-Mannschaft por 4-2. A primeira de duas vezes em que se defrontaram numa fase final foi em 2004. Ainda na fase de grupos, Portugal ganhou por 2-1 com golos de Hugo Almeida e Lourenço. Na segunda vez, em 2006, marcou João Moutinho no 1-0 que derrotou os alemães. O Europeu foi realizado em Portugal e o jogo em Guimarães.
Hoje também é a doer. Quem vencer, vai jogar a final, na próxima terça-feira, com a Dinamarca ou com a Suécia (o jogo é hoje às 20h). Portugal já não chega ao jogo decisivo de um Europeu Sub-21 desde 1994, na altura com a “Geração de Ouro” de Figo, Rui Costa ou João Pinto, mas perdeu com a Itália. Marcou um tal de Orlandini — de quem ninguém se recorda mais.
Portugal: José Sá; Esgaio, Paulo Oliveira, Tobias Figueiredo e Raphaël Guerreiro; William, Sérgio Oliveira, João Mário e Bernardo Silva; Ricardo e Ivan Cavaleiro
Alemanha:Ter Stegen; Korb, Ginter, Heintz e Günter; Kimmich, Can e Geis; Younes, Schulz e Volland
Portugal já jogou neste Europeu contra duas seleções que impõem o cabedal em campo: a Inglaterra e a Suécia. Venceu um, empatou outro — mas deixou-se empatar com os suecos já com o apuramento para a meia-final garantido. A Mannschaft também é uma seleção de se impor pelo físico — mas também, claro, pelo talento, que é coisa que não falta no extremo Younes ou no “faz-tudo” Emre Can, do Liverpool. Que o diga Bernardo Silva, que logo nos primeiros minutos de jogo foi “virado do avesso”, uma, duas vezes, as que fossem preciso, por Johannes Geis. Geis nem era para ser titular, mas entrou para o lugar do virtuoso Max Meyer com um objetivo: travar Bernardo.
Portugal criou perigo logo aos 14′. E que perigo. William Carvalho, dominador como vem sendo hábito na prova da República Checa, galgou metros com a bola, soltou-a na altura certa para o veloz Ricardo na direita do ataque, que recebeu, deixou no chão o lateral Gunter, e a “redondinha” seguiu para a entrada da área. Apareceu Sérgio Oliveira, o capitão, que tem um pontapé forte, mas não quis rematar desse modo; fê-lo em jeito, com a bola a fugir de Ter Stegen, do Barcelona, mas a embater caprichosamente no poste. Nem a vias, Ter Stegen!
Lembra-se de Geis? O médio-defensivo do Mainz não só não travou Bernardo, como espicaçou o “baixinho”. Aos 25′ começou o espetáculo do “10” da seleção. E logo com um golo. William, sempre ele, traz a bola dominada, pausado mas seguríssimo, deixa-a para Bernardo Silva, que toca em tabela com Ivan Cavaleiro — Ivan que (ao que se diz na imprensa gaulesa) vai ser seu colega no Mónaco em 2015/2016 — e vai recebê-la mais à frente. Tão à frente que dá por si no interior da área, de olhos na baliza e com Ter Stegen a abrir os enormes braços para o travar. Não travou. Bernardo Silva rematou com força e colocação, sem hipótese para o alemão. 1-0 para Portugal.
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Portugal, sempre que marcou neste Europeu — e marcou sempre primeiro contra a Inglaterra e a Suécia –, nunca saiu derrotado. O augúrio era bom, portanto. E Ricardo fez por torná-lo melhor ainda. Aos 32′, o avançado de quem Lopetegui quer fazer lateral-direito no Dragão fez o 2-0 para Portugal. O canto na direita é de Bernardo Silva, sempre ele, Paulo Oliveira ganhou aos gigantes Heintz e Knoche no primeiro poste, a bola sobra ao segundo, rasteira, para Ricardo, que não se fez rogado com a oferta, e logo tratou de encostá-la lá para dentro.
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A Alemanha teve mais 24 horas para descansar que Portugal. No lançamento do jogo, Emre Can, o tal médio do Liverpool, disse que os alemães tinham melhor seleção que a portuguesa e o selecionador, Horst Hrubesch, foi mais longe, e atirou: “Não tememos ninguém. Não falhámos nos outros jogos, não falharemos agora”. E reagiu, a Alemanha. Aos 36′ empurrou, empurrou, entrou na área aos tropeções, a bola sobrou para o goleador Volland, que rematou para defesa de José Sá. No seguimento da jogada, nova sobra, agora para o canhoto Schulz, mas o ala do Hertha de Berlin atirou para longe, muito longe. Se fosse râguebi, talvez contasse. Pouco depois, aos 44′, foi Younes (o “Bernardo Silva” lá do sítio), em slalom, a derivar da direita para o centro e a rematar de pé esquerdo para uma defesa em estilo, no ar, de Sá.
Respondiam os alemães, marcou Portugal, já em cima do intervalo. O 3-0 é de Ivan Cavaleiro. Ricardo desmarcou-se na esquerda, centrou rapidamente para dentro da área, tudo em velocidade, mas João Mário não foi de correrias, recebeu-a, levantou a cabeça, deu a bola para a entrada da área, e lá surge Ivan, que põe a bola onde a coruja faz o ninho, sem hipótese de defesa para Ter Stegen. Intervalo no estádio de Andrův, em Olomouc.
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Pensar-se-ia que os alemães regressariam do balneário com a corda toda, capazes de incomodar, de marcar, e o jogo, apesar do 3-0, estaria tudo menos decidido. O 4-0, por João Mário, contraria essa ideia. É Bernardo quem transporta a bola desde o meio-campo (o “baixinho” do Mónaco já foi eleito por duas vezes o melhor jogador em campo neste Europeu, hoje voltou a partir a louça, e tem tudo para suceder a Luís Figo, que foi o “MVP” do Europeu Sub-21 de 1994, que Portugal perdeu para a Itália), deixou para Ricardo, que não brilha tanto quanto Bernardo mas é útil e corre que cansa só de ver. O extremo do Porto soltou para João Mário à entrada da área e o sportinguista rematou logo dali, a bola ressaltou em Knoche e sobrevoou Ter Stegen.
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O que é melhor que um 4-0? 5-0, claro. Marcou Ricardo Horta. Rafa, que entrou para o lugar de Bernardo (vai descansar, miúdo, que te queremos fresco na final!) pouco tempo antes, rompeu pela área, a custo soltou para João Cancelo na esquerda, o lateral direito feito extremo esquerdo de ocasião centro, e Horta surgiu à ponta-de-lança na pequena área para desviar “nas barbas” de Ter Stegen.
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Portugal venceu, venceu com mérito, goleou a super-favorita Alemanha contra qualquer previsão mais otimista, e vai defrontar a Suécia ou a Dinamarca na próxima terça-feira, às 19h45, no estádio Eden, em Praga. A Alemanha está fora do Euro Sub-21 com uma goleada à antiga portuguesa. Ah, e o árbitro era grego…
Em 1994 Portugal também garantiu a passagem à final sem golos sofridos, depois de ter vencido a Espanha por 2-0 (Rui Costa e João V. Pinto)
— Playmaker (@playmaker_PT) June 27, 2015