A caravana da coligação segue pelo norte, hoje com direito a passeio marítimo em Aveiro. Pedro e Paulo, como se tratam e como se chamam quando um vê que o outro anda perdido, embarcaram logo de manhã para uma operação de charme na ria. O moliceiro chamava-se “Onda Colossal”, e não podia ser mais apropriado. É que ontem, em Vila Real, tinha ficado prometido que a “onda da esperança” ia rebentar justamente esta sexta-feira. Amarrado o barco, um passeio a pé pelo centro da cidade. Passos falou francês, não tocou piano, mas falou economês durante mais de 15 minutos com um jovem que o interpelou bem ao jeito da “senhora cor de rosa”.

“Vim aqui para lhe dizer, e falo por mim mas acho que posso falar por mais gente, que me sinto cansado dos políticos e da carga fiscal que vejo no final do mês. É insustentável. E as pessoas não vão votar porque estão cansadas do discurso dos políticos”, foi assim que o jovem, na casa dos 30, interpelou o primeiro-ministro.

O que viria a seguir seria digno de um debate televisivo: 15 minutos de explicações, económicas e detalhadas, do programa e da visão da coligação. Desde os dados da emigração – “que não podem ser confundidos entre emigração permanente com temporária” – aos números do défice, passando pela dívida e a carga fiscal. O jovem, que acenava e agradecia as explicações embora dizendo que não conhecia os números ao pormenor e que, por isso, não os podia rebater, dizia que queria era “alertar” os políticos para terem a “sensibilidade” de serem “objetivos” em vez de demagógicos.

Mas a cada investida do jovem, que dizia que não tinha “uma família numerosa” por causa da falta de condições para ter filhos, Passos não se ficava e, ao mesmo tempo que admitia que os impostos eram altos demais, detalhava as explicações sobre a “estratégia” da coligação: “as nossas prioridades são remover a sobretaxa, ajudar as famílias que têm mais filhos e idosos a cargo, e continuar a baixa de IRS”, disse, prometendo a eliminação de um quarto da sobretaxa em 2016.

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“Mas como é possível haver impostos tão altos e a dívida pública continuar a crescer?”, insistia o interlocutor, enquanto à volta aqueles que queriam ver e cumprimentar o primeiro-ministro se impacientavam. E Passos explicava, agora deixando de lado a linguagem dura dos números.

“Pense assim, imagine que vai num barco moliceiro. Aquilo tem uma certa inércia quando está a andar, por isso se o quiser impedir de andar para a frente e quiser que ele ande para trás não o consegue instantaneamente, pois não? Assim é com a dívida. A divida é gerada por défices, eu herdei um défice de 11%. Mas à medida que o défice vai baixando deixamos de ter necessidade de nos endividarmos”, explicou.

A inércia é o défice, e enquanto há inércia há dívida, viria depois Passos a explicar num discurso durante o almoço em Oliveira de Azeméis, recuperando o embate de rua que travou com o jovem vestido de azul.

À mesa do café, fazem-se contas para o dia 4

“Ele é mesmo assim, e as campanhas também são isso mesmo, são diferentes por causa das particularidades de cada um”, diz ao Observador a diretora-adjunta de campanha, Cecília Meireles, pouco preocupada com os debates de rua que vão ocorrendo à margem do programa. Na verdade, têm sido os próprios líderes a pedir insistentemente, em todos os comícios ou jantares com militantes, para “terem paciência” com os indecisos, com os que ainda têm dúvidas e que “não concordam com tudo o que fazemos”. É por isso uma questão de dar o exemplo. 

No meio do percurso a pé pelo centro de Aveiro, uma paragem num café para recarregar baterias, beber água, café e ovos moles. E para fazer contas ao número de deputados que serão eleitos pelo distrito de Aveiro – um distrito que é visto como decisivo tanto para a coligação como para o PS.

“Luís, quantos ovos moles tens aí?”, pergunta Portas a Luís Montenegro, cabeça de lista do distrito. “Dez”. “Ah dez, então vamos à procura do décimo-primeiro”, respondeu logo Portas numa analogia com o número de mandatos que a coligação espera conseguir no próximo dia 4 de outubro. E as contas continuam, agora com o primeiro-ministro a levantar novos dados na equação. “Aveiro não perdeu deputados, pois não? Foi Santarém, Santarém é que perdeu um para Setúbal”, mete-se o primeiro-ministro. “Então o grande objetivo é não perder nenhum em Santarém e ganhar um em Setúbal, isso é que era bom”.

Mas além de professor de matemática, Passos mostrou também os seus dotes de francês na manhã agitada no centro de Aveiro, conversando animadamente com duas turistas, francesas, que o abordaram. “Vous aimez les gens?”, perguntava, respondendo que a eleição era no dia 4 de outubro. Dia do aniversário do filho de uma delas, por coincidência. “Vou pensar em si nesse dia, então”, garantiu a mulher que, por essa altura, já estará de volta a França, longe de Portugal.