Se partires um dia rumo a Ítaca / Faz votos de que o caminho seja longo / Repleto de aventuras, repleto de saber. Na hora de criar uma editora, Isabel Castro Silva lembrou-se de um dos seus poemas favoritos, “Ítaca”, da autoria de Konstantinos Kaváfis, e achou que era um bom mote para a aventura que agora começa no mercado literário. Assim nasceu a Ítaca. O objetivo é publicar livros de qualidade, “que desafiem os leitores”, explicou ao Observador.

Não são palavras ditas à toa. A primeira obra em que a Ítaca apostou foi A Fénix Islâmica, uma investigação que permitiu à escritora e analista política Loretta Napoleoni traçar a história e a estratégia da organização terrorista Estado Islâmico e dos seus líderes, al-Zarqawi e al-Baghdadi. Foi uma estreia mais natural do que planeada, contou Isabel Castro Silva.

“Tinha sido recomendado pela Babelia [influente suplemento cultural do El País] como um dos livros do primeiro semestre e, quando comecei a lê-lo, tinha imensas informações que me surpreenderam muitíssimo”. Tal como descobriu coisas novas, achou que outras pessoas também poderiam descobrir. “É um livro aprofundado, para um público interessado sobre o assunto, não tanto para especialistas”. O livro foi escrito em 2014 e publicado em Portugal no final de outubro, tudo antes dos atentados de Paris de 13 de novembro. Serve para compreender melhor não só o que está a acontecer no Médio Oriente, como também a situação de alerta contra o terrorismo em que mergulhou a Europa.

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O livro tem 136 páginas e custa 13€

Isabel Castro Silva tem 38 anos. Dez deles foram passados a trabalhar na editora Relógio D’Água e depois na Sextante, do grupo Porto Editora, primeiro como assistente editorial e depois como editora. É esta a linha editorial, de qualidade, que a Ítaca persegue. “Vamos ter livros de ficção e ensaio, portugueses e estrangeiros, com o intuito de exigência, de desafiar os leitores”, disse.

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Paralelamente, Isabel ia fazendo traduções de inglês e alemão para português. Foi ela que traduziu na íntegra os Diários de Frank Kafka, que saíram este ano pela Relógio D’Água. O segundo livro que a Ítaca vai publicar também está a ser traduzido por ela, tal como já fez com A Fénix Islâmica. Vai chamar-se “Entre mim e o Mundo” e é do jornalista e escritor americano Ta-Nehisi Coates. Venceu o National Book Award e figura em vários tops de melhores do ano, mas a editora comprou-o antes disso.

“É uma reflexão profundamente indignada sobre o racismo e foi publicado numa altura em que a violência policial aos negros estava no auge”, disse. Vai sair em finais de fevereiro.

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Capa norte-americana. Ainda não há capa portuguesa

Também já contratado e em processo de tradução está um livro de Mikhail Shishkin, The Light and the Dark. Em princípio chamar-se-á em português Cartas de Amor e Guerra, mas ainda é preciso confirmar com a agente daquele que é um dos autores mais premiados da Rússia, atualmente exilado em Berlim pelos artigos pouco simpáticos para Vladimir Putin que publica no jornal The Guardian.

“É um romance epistolar, com cartas trocadas entre um homem que está numa guerra e a mulher que ficou para trás na Rússia. É um livro que, não tendo propriamente enredo, vale pela linguagem poética muito forte”, adiantou Isabel Castro Silva.

A ideia inicial da editora é lançar para o mercado 12 livros por ano. Seis pela Ítaca e seis pela Jacareca, uma chancela especialmente dedicada aos mais novos. Os livros estão a ser distribuídos para as livrarias pela editora Orfeu Negro e é também com ela que a Ítaca vai participar na Feira do Livro de 2016.

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Isabel Castro Silva tem 38 anos. Foto de Rui Cartaxo Rodrigues, cedida ao Observador

“O nosso princípio é mais voltado para livros de baixo custo, porque em Portugal os livros são muito caros no geral”, explicou. Mas os custos não serão cortados nas letras, no conteúdo, que é o que interessa. “Não vamos ter livros de capa dura, por exemplo”. O grafismo será “apelativo e exigente”, mas recorrendo a estratégias mais baratas e que ajudem à divulgação, que vão passar por colocar fotos de Instagram — “aproveitando esse enorme repositório de talento” — nas capas. Com o consentimento dos fotógrafos, claro. “Temos um orçamento bastante reduzido, mas acredito que a necessidade aguça o engenho”, sublinhou.

Pela Jacareca saíram recentemente duas obras, O Astrocão e a Gata Galáctica, de R. A. Montgomery, e O Piloto e o Principezinho, de Peter Sís. Recentemente, Isabel soube que dois outros livros pelos quais fez uma proposta também foram aceites. Ambos são de Chris Van Allsburg, que já ganhou a medalha mais desejada no mundo da literatura infantil, a Hans Christian Andersen. O primeiro livro, Jumanji, vai sair em maio. Já The Polar Express, por ser um livro natalício, só chegará às livrarias daqui a um ano. Cá estaremos à espera.