O Governo e o consórcio Gateway assinaram este sábado de manhã o acordo para alterar o negócio de privatização da companhia. O Estado fica com metade do capital da empresa, os privados outra metade, tal como o Observador tinha noticiado ontem à noite. “A empresa será privada”, disse Humberto Pedrosa, o sócio português do consórcio da TAP. “A TAP terá como maior accionista o Estado”, garantiu o ministro do Planeamento Pedro Marques. Parece contraditório, mas apenas para já. Depois do acordo, o plano estratégico e a gestão diária serão de privados, no futuro, com a alienação de 5% para os trabalhadores, a balança do capital desequilibrará a favor do Estado.
“O que inicialmente eu disse que o nosso projecto e o do Governo não casavam, a boa vontade de ambas as partes e o diálogo permitiu que acabasse em casamento, como não podia deixar de ser entre pessoas de boa fé. Os interesses da TAP teriam de vir ao de cima. Chegámos a um acordo de 50%/50%. A empresa será privada”, disse Humberto Pedrosa depois da assinatura do acordo com o Governo.
Sede em Lisboa, TAP pelo mundo
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O plano estratégico da Gateway que foi aprovado pelo Governo passa por, entre outras coisas, manter a sede da TAP em Lisboa, por manter o nome da empresa e pela manutenção do hub do Aeroporto de Lisboa e pela garantia de ligações para as regiões autónomas para os países africanos de língua portuguesa e para o Brasil, pode ler-se no memorando de entendimento assinado pelas duas partes.
Com a decisão de metade/metade António Costa não conseguiu a maioria de capital que tinha prometido mesmo depois de ser eleito primeiro-ministro. Na assinatura do acordo, o primeiro-ministro justificou o que foi possível alcançar nas negociações dizendo: “A discussão política acabou e agora estamos bem entendidos. A escolha democrática foi feita, os direitos foram garantidos a legalidade é garantia, a continuidade dos direitos é uma garantia. Portugal é um Estado de direito que respeita e procura o investimento estrangeiro”, um recado também para o exterior.
Para justificar o facto de o Governo não ter conseguido os 1% que faltava para assumir o controlo público da empresa, o ministro Pedro Marques e o primeiro-ministro assumiram a necessidade de ter um parceiro privado e de garantir, até lá para fora, que os direitos dos privados eram respeitados, mesmo não tendo concordado com a opção tomada pelo anterior Governo de alienar 61% da companhia. Ambos repetiram essa mensagem, numa tentativa de fazer passar a mensagem para outros investidores estrangeiros.
Gestão fica privada. Estado terá maioria do capital, mas só depois
No contrato agora assinado, o Estado ainda não é o principal acionista, apesar de o ministro Pedro Marques já o ter assumido. Isto porque falta alienar 5% do capital social para os trabalhadores. Diz o contrato que após a alienação, participação da Gateway reduz para 45%, mas mantendo sempre a TAP o estatuto de empresa privada.
1,9 milhões
Foi o valor que o Estado pagou ao consórcio privado para reaver os 11% de acções e puxar a participação do Estado para os 50%. Cada acção valeu 10,93 euros, ao mesmo preço do processo de reprivatização em 2015.
Mas mais que isso, além de a empresa ficar privada, a gestão também o ficará: “Iremos ser sócios não só por dois anos, mas seguramente para sempre. Não temos aqui interesses divergentes, temos interesses comuns: o que é bom para a TAP é bom para o país. O governo não pretende intervir na gestão do dia-a-dia da TAP, por isso a gestão fica com a Gateway. O que cabe ao Estado é garantir a perenidade da visão estratégica e que a TAP garantir sempre a ligação dos portugueses ao mundo“, justificou António Costa.
A gestão assentará no plano estratégico da Gateway, que “já foi aprovado pelo Governo”, garantiu David Neeleman na conferência de imprensa sobre o acordo. A visão estratégica foi um dos pontos convergentes entre as duas partes e será a cola que o Governo quer que mantenha junto este casamento: “Não nos afasta do consórcio, antes pelo contrário, cada vez nos aproximará mais, a visão estratégica”, disse.
A recompra das ações por parte do Estado para garantir metade da empresa teve um valor de 1,9 milhões de euros. Mas as contas não ficarão por aqui. O plano de capitalização da empresa não se alterou e o Estado tem ainda a possibilidade de subscrever 30 dos 120 milhões do plano. E o Estado está interessado nisso, garantiu o ministro Pedro Marques.
Para já o que muda na empresa, além da composição do capital social, é o conselho de administração que ficará com seis membros do Estado e seis membros do consórcio privado Atlantic Gateway. Quem desempata? O presidente que será escolhido pelo Estado, com o aval da Atlantic Gateway, e que terá “voto de qualidade”, está escrito no acordo. Fernando Pinto manter-se-á na Comissão Executiva da companhia.
O acordo foi assinado um dia depois de o Governo entregar na Assembleia da República o Orçamento do Estado. Ainda não é certa a posição dos parceiros de esquerda, BE e PCP, que insistiam no controlo público da companhia. António Costa, que também o queria, conseguiu os 50% e um contrato, que tal como o da privatização feita pelo anterior Governo não tem prazo de validade. “É perene, não tem prazo em si mesmo”, definiu Pedro Marques.