Há cerca de duas semanas, Mário Cruz foi avisado de que estava entre os finalistas do World Press Photo. “O que não significava que ia ganhar alguma coisa!”, disse ao Observador. Por isso, foi uma surpresa quando esta quinta-feira de manhã o telemóvel começou a tocar “de cinco em cinco minutos” e lhe disseram que tinha ganho o primeiro lugar da categoria de “Temas Contemporâneos” do concurso de fotografia.

“Sabe muito bem, o reconhecimento é bom, porque sei que esta distinção vai atrair muita atenção para o tema que tratei”, admitiu o fotógrafo da Agência Lusa. “Sempre foi o meu principal objetivo — trazer atenção para o tema.” O tema é o tráfico, os maus-tratos e a escravatura a que crianças do Senegal e da Guiné-Bissau são sujeitas em escolas islâmicas, uma realidade com a qual teve contacto pela primeira vez em 2009, quando estava em Bissau a cobrir as eleições presidenciais.

“Lembro-me de ouvir relatos e de falar com pessoas que conheciam quem tinha perdido os filhos, que tinham sido levados para o Senegal para servirem de escravos para os líderes religiosos.” As histórias que ouviu nunca mais lhe saíram da cabeça e, passados alguns anos, decidiu investigar e “documentar esta realidade”. A oportunidade para o fazer surgiu em 2015. “Passei seis meses a fazer investigação, desde janeiro até ir para o Senegal, em maio. Pedi uma licença sem vencimento e estive dois meses sem trabalhar para a Agência Lusa.”

Mário Cruz World Press Photo

© Mário Cruz/World Press Photo

Apesar de sempre ter tentado realizar os seus projetos pessoais, Mário Cruz admite que, por vezes, é difícil conciliá-los com o trabalho diário. Por isso, a licença sem vencimento foi a única opção. “Requer muito esforço da minha parte. E hoje foi o culminar de um trabalho que valeu muito a pena.”

As fotografias que tirou às crianças guineenses e senegalesas, e a que deu o título “Talibés, Modern-Day Slaves” (“Talibés, Escravos dos Tempos Modernos”, em português), serão agora publicadas na versão em papel da Newsweek, onde foram inicialmente divulgadas. Com a exposição itinerante do World Press Photo, Mário espera que “as fotografias cheguem a muitas pessoas” e que ajudem a chamar a atenção para o que se passa no Senegal e em outros países africanos. “Sinto-me muito realizado.”

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