“Quanto mais viajo pelo mundo mais tenho a certeza que São Miguel é um dos sítios mais bonitos.” A frase é de Luís Clara Gomes, a.k.a Moullinex, quando lhe falamos no Tremor, o festival que este ano chega à terceira edição, que começa esta terça, 15, e vai até sábado, dia 19 de Março, na tão elogiada ilha açoriana. O músico foi pela primeira vez ao festival o ano passado e foi lá que, também pela primeira vez, tocou temas do seu último álbum, “Elsewhere”. “Ficámos vários dias na ilha depois do festival, a encher-nos de felicidade, e aproveitámos para filmar muita coisa que vai aparecer no documentário sobre [o projecto] Moullinex, que sairá em Abril.”

O Tremor é assim, um bom sítio para documentários, fotografias, conversas, residências artísticas e, sobretudo, para concertos. “O nosso concerto foi no Coliseu Micaelense, uma sala lindíssima”, recorda Moullinex. “Uma pesada gastroenterite atacou o Diogo, o nosso baterista (ressalvo que a trouxe do continente e não a contraiu na ilha), mas o rapaz ainda assim tocou bem como sempre.” Não podia haver melhor plateia para receber o então novo disco. “A insularidade faz com que a chegada de música nova seja absorvida com mais intensidade, tanto pelo público como pelos músicos”, explica.

Bonnie ‘Prince’ Billy, Za!, Capitão Fausto, PAUS, Dan Deacon, SUUNS, Julianna Barwick, Bitchin’ Bajas, Filho da Mãe e Black Mountain são alguns dos mais de 40 nomes a preencher o cartaz desta edição e que justificam uma viagem de avião à ilha – com as companhias low-cost que desde o ano passado voam para os Açores a ajudar à festa. “Para alguém como eu que é do continente e das grandes cidades, tenho um grande fascínio pelo oposto”, diz David Santos, conhecido pelo seu projecto musical Noiserv, que esteve na primeira edição do festival, em 2014.

Os Za! na edição do ano passado do Tremor

Os Za! na edição do ano passado do Tremor / Foto: Vera Marmelo

“[O Tremor] não é apenas um sítio onde se vai tocar. É mais um sítio que passas a conhecer graças à música”, continua. “Fiquei uma semana depois do festival, que passou a correr. Para mim que gosto de natureza, é fácil perdermo-nos em São Miguel. Desde as lagoas, as furnas, à Ferraria, às vacas de olhos bonitos e tranquilos… Tudo me fascinou.”

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Tal como nas edições anteriores, o festival acontece em vários espaços da ilha, desde a loja de roupa ao café, passando pelo teatro, pela igreja ou pelo solar. A “(re)descoberta de certos locais em Ponta Delgada que são míticos do comércio tradicional e o genuíno calor humano açoriano” são alguns dos pontos fortes do Tremor, diz o fotojornalista Rui Soares, natural de São Miguel. Já para não falar, claro, “da descoberta de algumas bandas que são menos mainstream”.

Este ano, por exemplo, os catalães Za!, repetentes no festival, vão juntar-se à Escola de Música de Rabo de Peixe para um concerto no sábado, dia forte do festival, o resultado duma residência artística. “A primeira vez que o açoriano King John tocou no Tremor o ano passado para mim foi dos concertos mais memoráveis”, continua Rui. “A energia que se sentiu foi muito boa, foi dos poucos concertos em que parei de fotografar só para apreciar todo aquele rock.”

King John volta a estar no alinhamento deste ano mas há muitos concertos a não perder. Za!, Bonnie ‘Prince’ Billy e SUUNS são as escolhas da apresentadora e guionista Ana Markl, pela primeira vez no Tremor, “uma espécie de desculpa de altíssimo gabarito para finalmente conhecer os Açores”. Vai para “sentir a onda e a verdade que já escasseia nos festivais dos grandes centros urbanos” e provavelmente não se vai desiludir.

Que o diga a fotógrafa Vera Marmelo, que já passou por todos os festivais e mais alguns. “Lembro-me duma manhã a ver passar os senhores a fazer a romaria quaresmal enquanto procurava os sítios dos concertos. E de estar a sair de um concerto da tarde, olhar para baixo e ver o senhor padre a conviver com as pessoas. O saltitar entre salas, a tarde longa e luminosa que se apresentou no dia principal do festival, tudo perfeito”, afirma.

Jesse James, organizador de outro festival em São Miguel, o Walk & Talk, de arte pública, conta que as réplicas se sentem na ilha muito depois do Tremor:

“A experiência é verdadeira. Ponta Delgada acorda e ganha um novo ritmo e isso é visível a todos, sejam locais ou forasteiros. E o mais incrível, é que esse efeito tremor prolonga-se no tempo e tem réplicas nas dinâmicas culturais locais. É um exemplo de como se pode repensar um território.”

E depois, claro, também há a comida. “Não vale a pena estar a falar das paisagens. Comam cracas. Não há em mais lado nenhum (que eu conheça) e é um bicho dentro de um calhau que sabe a mar”, sugere Fábio Costa,também conhecido como DJ Quesadilla, um dos nomes do cartaz desta edição a prometer “esquizofrenia insular” – “nem eu sei o que esperar dos meus próprios DJ sets”, justifica. Ou, sugestões de Jesse James, “os chicharros fritos do Mané Cigano, as sandes de atum d’A Tasca, o segredo de chocolate do Rotas da Ilha Verde, a sopa de peixe do Cantinho do Cais e o cozido no Hotel Terra Nostra”. Muitas razões para se meter já num avião.

A outra protagonista do Tremor: a paisagem

A outra protagonista do Tremor: a paisagem / Foto: Vera Marmelo

A não perder no Tremor:

DJ Quesadilla: O concerto de Za!, a melhor banda deste planeta, em conjunto com a Escola de Música de Rabo de Peixe. De muitos momentos que ficarão na memória do festival, este será o mais especial.

Vera Marmelo: Estou morta por ver a minha querida Julianna Barwick. a última vez que vi o Deacon, em Serralves, foi a festa mais bonita de sempre. não vi os Paus, nem o Filho da Mãe a apresentar os discos novos ainda e não os vou deixa escapar. e a festa do hip-hop açoriano deixou-me curiosa também.

Jesse James: No Tremor, segue-se o ritmo. Sei apenas que termino a ouvir a SONJA no Coliseu Micaelense – a proposta curatorial do Walk&Talk para esta edição do Tremor. Pelo caminho logo se vê, mas vou estar perto do Zeca Medeiros, do King John, da Juliana Barwick, HHY & ThseMacumbas e Dan Deacon.

A não perder em São Miguel:

Rui Soares: Se estiver a chover, sem duvida ir a Poça da Beija ou a Caldeira Velha, nao se vao arrepender, seguido um optimo cozido das Furnas. Se estiver bom tempo, um mergulho nas piscinas naturais da Maia almoçando em São Bras peixe fresco do dia.

Ana Markl: O Nuno Costa Santos disse-me há dias que, se só puder fazer uma coisa, para ir ver a Lagoa do Fogo. É para lá que eu vou.

Moullinex: Visitar todas as lagoas. Invadir o hotel abandonado nas Sete Cidades. Um dia nas Furnas. Bife na Pedra no Pópulo. Um mergulho na Caloura. Bolo lêvedo e galão no Prazeres da Terra. E um fim de tarde dentro do mar, na Ferraria.