Pedro Simões tem 27 anos, é de Aveiro, e utilizou pela primeira vez a aplicação da Uber na semana passada, quando participou numa conferência em Lisboa. Na quarta-feira, teve de apanhar um avião no aeroporto Francisco Sá Carneiro, no Porto, juntamente com um amigo. De Aveiro para o Porto, foram de comboio. Para irem da estação de Porto Campanhã para o aeroporto, pediram um Uber.
Cerca de dez minutos depois de terem pedido um UberX, chegou o primeiro carro. O motorista ligou-lhes e pediu que entrassem na viatura uns metros mais à frente, evitando a zona dos táxis. Quando se aproximaram da bagageira, foram cercados por um grupo de oito a dez taxistas, conta Pedro ao Observador. Gritavam: “Tu aqui não carregas. Põe-te a andar, senão ainda vais ter problemas”, recorda Pedro.
“Eu disse-lhes que nós não tínhamos nada a ver com aquilo e que eles deviam falar com as associações que os representavam. Eles respondiam que tinham de defender os seus direitos e enquanto estávamos a tentar pôr as malas na bagageira, um deles deu um pontapé no carro e o motorista teve de arrancar”, explica.
Impedidos de seguir viagem, Pedro e o amigo foram andando para uma rua mais distante da estação de comboios e voltaram a pedir um veículo através da Uber. Esperaram oito minutos e quando o carro estava a aproximar-se, surge novamente o mesmo grupo de oito a dez taxistas. “Eles devem ter instalado a aplicação e andam a ver os carros que estão perto daquele local. É a única lógica”, refere Pedro.
Quem ia ao volante do segundo carro era Marta Magalhães, 36 anos, motorista de uma empresa parceira da Uber e que detém carta de condução de categoria D, habilitada para transporte de pesados de passageiros. Ao Observador, Marta diz que o grupo de táxis cercou o carro que conduzia e que começaram a insultá-la. Eram cerca de 14h30.
“Começaram a circular à volta do carro, não me deixavam sair, pontapearam o carro e quando consegui arrancar, apedrejaram o carro. Eles bloqueiam-nos de tal maneira que nós nem sequer conseguimos apanhar os utilizadores”, conta ao Observador.
Marta Magalhães, que faz serviços para a Uber desde novembro de 2015, diz que esta não é a primeira vez que é atacada por taxistas. “No mês passado, furaram-me os pneus”, conta. Esta sexta-feira, apresentou queixa numa esquadra da PSP do Porto pelo incidente de quarta-feira. Diz que é, pelo menos, a terceira queixa que apresenta desde que o ano começou.
Uma das queixas foi por causa de uma ocorrência perto da estação de São Bento. “Um grupo de taxistas bloqueou a rua onde estava, começaram a pontapear o carro e foram as pessoas que estavam a assistir que tiveram de chamar a polícia”, lembra. Há cerca de um mês, enquanto acompanhava a identificação de um taxista a propósito de outra ocorrência, ouro grupo de taxistas furou-lhe os pneus.
“Moeda de troca” ou reconhecimento da necessidade de regular o setor”?
Não é a primeira vez que os ânimos se exaltam no Porto (e em Lisboa). Enquanto isto acontecia no Porto, em Lisboa, os representantes da Associação Nacional dos Transportadores Rodoviários em Automóveis Ligeiros (ANTRAL) e da Federação Portuguesa do Táxi estiveram reunidos com o ministro do Ambiente, José Matos Fernandes.
Da reunião, saiu um pacote de 10 medidas para modernizar o setor do táxi, que representa um investimento de 17 milhões de euros. Sobre a Uber, não foi dito especificamente nada, mas os taxistas não gostaram do pacote apresentado pelo Governo e afirmaram que os 17 milhões eram uma “moeda de troca” para que se abra a porta à regulamentação da atividade da Uber.
Contactada pelo Observador, fonte da Uber afirmou que “o reconhecimento pelo Governo português de que é necessário modernizar a regulação do setor e enquadrar as novas formas de mobilidade pode ser o início de um momento histórico para a mobilidade em Portugal”.
A Uber foi proibida de operar em Portugal em abril de 2015, depois de o Tribunal da Comarca de Lisboa ter aceitado a providência cautelar interposta pela ANTRAL. Contudo, mantém os serviços ativos porque o alvo da providência foi a entidade jurídica errada, a Uber Technologies, quando a Uber portuguesa responde à delegação na Holanda. O processo está em fase de recurso e aguarda decisão do Tribunal da Relação.