O Governo estava a preparar desde fevereiro o diploma que vai permitir eliminar os limites ao exercício de direitos de voto nas assembleias gerais dos bancos e que pode agora resolver o impasse entre acionistas do BPI, mas decidiu congelá-lo até haver um acordo no banco, para não “condicionar as negociações em curso”. António Costa pediu um estudo ao Banco de Portugal e vários pareceres na área financeira no final de fevereiro, mas só levou o diploma ao conselho de ministros da última quinta-feira, mantendo a aprovação em segredo.

O diploma foi enviado para Belém no mesmo dia em que foi aprovado, aguardando agora promulgação do Presidente da República. O Governo prevê que possa entrar em vigor a 1 de julho, mas tem uma norma transitória de seis meses para os bancos alterarem os atuais estatutos e eliminarem restrições aos direitos de voto.

A ideia de congelar o trabalho que estava a ser feito foi, segundo fonte que acompanhou o processo legislativo no Governo, “evitar que o diploma condicionasse as negociações em curso” no BPI. “O Governo aguardou pela sua conclusão” para avançar com a desblindagem de estatutos, adianta a mesma fonte. Ou seja, pretendia-se desbloquear as regras que restringem a 20% os votos de um acionista qualquer que fosse a dimensão da sua posição no capital de um banco, independentemente do “caso BPI”. Mas a associação acabou por acontecer este domingo, quando ruiu o acordo anunciado há uma semana entre Isabel dos Santos e os espanhóis do CaixaBank.

No momento em que tudo ruiu de forma pública, este domingo, já estava nas mãos do Presidente da República o decreto que vai permitir que os espanhóis tenham um poder de voto superior ao da empresária angolana nas assembleias gerais do BPI. E Marcelo já disse que dará prioridade ao “interesse nacional” e à estabilidade do sistema financeiro e ao seu relacionamento com as instituições europeias. As novas regras do Banco Central Europeu implicam a revisão do excesso de exposição dos bancos europeus a mercados de alto risco de outros países, como é o caso de Angola.

O decreto ainda não é conhecido, mas deverá limitar-se à desblindagem em instituições financeiras, tendo em conta as partes ouvidas na preparação do diploma que foi descrita ao Observador. O Governo recebeu, a 17 de fevereiro, um estudo do Banco de Portugal que dava conta da existência de “oito instituições financeiras onde vigoram limitações de direitos de voto”, de acordo com a fonte citada. A 29 de fevereiro, o Executivo de António Costa pediu pareceres sobre o assunto ao Banco de Portugal, à Comissão do Mercado e Valores Mobiliários e, também, à Associação Portuguesa de Bancos, que preferiu remeter a questão para os associados que quisessem pronunciar-se. BPI e BCP foram os únicos que enviaram “comentários”.

Só depois de anunciado o acordo entre CaixaBank e Santoro Finance, a 10 de abril, é que António Costa levou o decreto ao conselho de ministros. Também é certo que, a meio da semana passada, de acordo com o que foi noticiado, já existiam indicações de poder haver um recuo no acordo do BPI, em que o próprio primeiro-ministro admitiu ter tido intervenção, por via do seu negociador e amigo, o advogado Diogo Lacerda Machado.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR