O ministro das Finanças reconhece a “inquietude e pressão” manifestadas pela direção-geral da concorrência da Comissão Europeia sobre as autoridades portuguesas para encontrar encontrar uma solução para o Banif. Mário Centeno, que volta pela terceira vez à comissão parlamentar de inquérito à resolução do banco, revela a mensagem dada pela comissária Margrethe Vestager na primeira reunião que teve com ela, em dezembro do ano passado: “Foi-me pedido para não adiar mais o problema, o processo do Banif não podia continuar à espera de decisões”.
Mário Centeno admite que havia “uma inquietude e uma pressão sobre as autoridades portuguesas para agir no sentido de encontrar uma solução, havia um enorme sentido de urgência em todo o que nos era transmitido”.
Apesar de reconhecer, tal como a anterior ministra das Finanças, a pressão para uma decisão rápida, Mário Centeno não faz a mesma interpretação que Maria Luís Albuquerque, que atribui esta pressa a uma imposição de Bruxelas que queria uma solução antes da entrada em vigor das novas regras de resolução bancária. O ministro das Finanças admite esta urgência ao facto de Bruxelas estar já há anos à espera de uma solução para o Banif. “Tudo deveria ter sido feito antes”, sublinha em resposta à deputada do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua.
E podia ser mais tarde? Podia a solução final ter sido decidida apenas em 2016, dando maior margem temporal para negociar uma proposta melhor? “Poder podia, mas seria uma coisa diferente”, diz o ministro em resposta ao deputado socialista João Galamba. “E ia ter custos muito mais elevados”, assegura ainda Mário Centeno que recorda para sustentar essa posição as declarações feitas pela ex-ministra, Maria Luís Albuquerque, no mesmo sentido.
A resolução do Banif implicou perdas para os detentores de obrigações e acionistas e envolveu um esforço financeiro do Estado de três mil milhões de euros.
A passagem para 2016, com novas regras europeias, retiraria ao Banco de Portugal o papel de autoridade de resolução, que passava para o Banco Central Europeu, e implicaria a provável partilha de perdas (bail-in) com os depositantes acima dos cem mil euros e os credores não subordinados. Mário Centeno recordou a situação de fragilidade da banca portuguesa e até europeia, alertando para os riscos de esperar.
“A passagem para 2016 seria um exercício de ilusão, considerado apenas por aqueles que não tivessem consciência da sua gravidade e que fossem incapazes de medir as suas consequências.”
Mário Centeno regressou à comissão parlamentar do Banif para a última audição quando todas as atenções estão já voltadas para o próximo inquérito que irá incidir sobre a Caixa Geral de Depósitos.
Na sua intervenção inicial, o ministro realçou que os “testemunhos devem servir para apurar as condições em que o Banif chega ao dia 18 de dezembro de 2015. No dia 26 de novembro, este Governo, tinha quatro dias (dois dias úteis e dois de fim de semana), recém-empossado, para tomar uma decisão acerca de um Banco que tinha as seguintes características: insuficiência de capital, problemas de sustentabilidade e “uma disputa institucional entre o Ministério das Finanças e o Banco de Portugal acerca do caminho a seguir”.
Centeno recordou ainda o dia 12 de outubro, dia em que os então responsáveis pelo Ministério das Finanças do anterior governo, passaram a primeira informação sobre a situação do Banif.
“Mesmo que para a Dra. Maria Luís Albuquerque seja pesada a consciência da sua memória, gostaria de reafirmar o que me foi dito no dia 12 de outubro de 2015.
Nesse momento, houve uma mensagem clara de que o Banif necessitaria de uma solução urgente, cuja conclusão estaria associada ao fecho pela Comissão Europeia da investigação aprofundada em curso. A atuação do Governo deveria ter em conta os custos de passagem para 2016, que poderiam ser muito elevados. Foi-me claramente dito que a questão estava em mãos da Comissão Europeia, da Administração do Banif e do Banco de Portugal (não necessariamente por esta ordem, mas, nesta ordem, não constava o Governo da República).”
Na leitura que Centeno faz da situação, as “autoridades de concorrência clamavam pelo fim da inação das autoridades nacionais, que entretanto se substituíam umas às outras”. O responsável assinalou ainda um fundo de resolução sem capacidade financeira para fazer uma resolução e a mudança de regras bancárias a 1 de janeiro, “um curto horizonte de 35 dias que colocaria em risco toda a divida sénior do Banco Banif (incluindo o valor dos depósitos acima de 100 mil euros)”.
Venda voluntária não foi “nenhuma farsa”
Em resposta ao deputado do PSD, Carlos Abreu Amorim, o ministro assegurou que apesar da escassa margem temporal, foram exploradas três vias até ao final: venda voluntária, banco de transição e resolução. “Não foi nenhuma farsa, e acho de mau gosto usar esta expressão”, respondeu Mário Centeno à expressão escolhida por Abreu Amorim para descrever a realização do processo de venda voluntária do Banif.
O deputado do PSD insistiu na expressão farsa recordando que o processo de venda prosseguiu quando estava já a ser preparada a resolução desde pelo menos 15 de dezembro. Centeno assegurou que sem essa tentativa de venda, as condições da solução final seriam mais negativas.
A farsa acaba muitas vezes em tragédia, concluiu Abreu Amorim depois de confrontar o ministro das Finanças com a carta que António Costa escreveu ao presidente da Comissão Europeia e do Banco Central Europeu (BCE) sobre a situação da banca portuguesa. O deputado do PSD questiona a necessidade de resolver o problema até final de 2015.
“A tragédia foi para os contribuintes portugueses”, respondeu Mário Centeno.
Notícia da TVI. Centeno não sabe origem. Veio do governo? Não responde
E de onde veio a informação que fundamentou a notícia da TVI? O deputado do PSD cita uma comunicação de 13 de dezembro em que se fala na resolução. “Não tenho ideia de como Sérgio Figueiredo (o diretor da TVI) teve acesso a informação para fazer a notícia. Não sei como teve acesso.”
E pode garantir que não teve origem em ninguém na sua dependência funcional? E pode garantir que a informação não saiu do governo? O ministro diz que não teve contacto com a jornalista Paula Costa Simões (editora de política da TVI). E o seu gabinete? “Não posso responder”. Mário Centeno depois reformula e recorda que os três leads da notícia original — tudo preparado para o fecho do Banif, parte boa integrada na Caixa e perda para depositantes acima de 100 mil euros — não correspondiam à verdade. E lembra que o tal documento de 13 de dezembro não refere a integração na CGD, referida pela estação.
Mário Centeno encerrou o período de audições do Banif. A entrega da proposta de relatório final, a cargo do deputado socialista Eurico Brilhante Dias, está prevista para meados de julho.