E agora? Para já, os líderes das instituições europeias e dos Estados-membros estão a pronunciar-se um a um e há uma reunião do Conselho Europeu que já estava marcada para dia 28 de junho, onde vão decorrer reuniões à margem já sem David Cameron. Há uma reunião de emergência entre todos os presidentes das instituições europeias prestes a começar. Formalmente cabe ao Reino Unido iniciar o processo de saída da União Europeia, mas o entendimento de todos os líderes não é igual neste ponto.

O processo de saída só começa quando o Reino Unido invocar o artigo 50º junto dos restantes Estados-membros, mas Rui Tavares lembrou ao Observador que François Hollande, Presidente francês, afirmou que a sua interpretação seria que um resultado de saída significava uma saída automática. A prova dos nove do que se vai passar a seguir vai acontecer já no dia 28, data de Conselho Europeu. Este órgão que reúne todos os chefes de Estado deverá receber Cameron na primeira parte da reunião, mas o primeiro-ministro britânico não deve ficar na sala para a segunda parte. Os temas do Conselho passam a pertencer apenas aos membros efetivos da União Europeia.

Artigo 50º
1. Qualquer Estado-Membro pode decidir, em conformidade com as respetivas normas constitucionais, retirar-se da União.

2. Qualquer Estado-Membro que decida retirar-se da União notifica a sua intenção ao Conselho Europeu. Em função das orientações do Conselho Europeu, a União negocia e celebra com esse Estado um acordo que estabeleça as condições da sua saída, tendo em conta o quadro das suas futuras relações com a União. Esse acordo é negociado nos termos do n.o 3 do artigo 218.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia. O acordo é celebrado em nome da União pelo Conselho, deliberando por maioria qualificada, após aprovação do Parlamento Europeu.

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(…)

Cabe ao Conselho Europeu, depois de receber o pedido de saída do Reino Unido, dar as linhas que vão orientar as negociações entre a UE e os britânicos. Começa então a contar o relógio de dois anos até ao fim deste processo e caso não haja acordo nesse período, a pertença do Reino Unido termina automaticamente. Até ao fim das negociações ou saída efetiva do Reino Unido caso não se chegue a acordo, as leis europeias continuam em vigor no Reino Unido, assim como todos os direitos dos cidadãos europeus que lá vivem.

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Aberto oficialmente o processo de saída, há a possibilidade de não haver quaisquer alterações na relação com Bruxelas já que pode apenas adicionar ao pânico que alastra nos mercados. “O Reino Unido vai manter-se na União Europeia nos próximo dois anos, durante o período de negociação, e ninguém vai ligar ao que está a ser negociado“, referiu Paulo Sande, antigo diretor do gabinete do Parlamento Europeu em Portugal e professor convidado do Instituto de Estudos Político da Universidade Católica, em declarações ao Observador, alertando para o facto de estas negociações poderem arrastar-se sem graves consequências imediatas.

Mas este não é o entendimento de Rui Tavares. “A União Europeia vai querer cerrar fileiras e os países que vão perder mais, são os que vão fazer mais exigências. A Agência Bancária Europeia que se situa em Londres deve passar para a Irlanda e o Banco Central Europeu tem legislação pronta a aprovar para não permitir que os derivados em euros sejam transacionados fora das praças da zona euro. Basicamente vai ter de se gastar dinheiro para manter a União Europeia coesa nas negociações“, afirmou o líder do Livre.

Os 27 devem então dar um mandato à Comissão Europeia para que esta negoceie em nome de todos os Estados-membros com o Reino Unido e há alguns modelos de associação possíveis – esta questão não está totalmente clarificada já que não está estipulado qual a instituição que vai negociar, mas como a Comissão negoceia com países terceiros, há a possibilidade de ficar responsável por este processo. Pode ficar num esquema parecido ao da Noruega (em que tem acesso ao mercado livre, mas respeitando a liberdade de circulação), um acordo comercial abrangente como o CETA, com o Canadá, ou o TTIP, que está a ser negociado entre a UE e os Estados Unidos, ou vários acordos bilaterais com os 27 membros da União Europeia.

Quanto à possibilidade de uma resposta pronta à saída, as opiniões dividem-se. Paulo Sande considera que tal como aconteceu no choque do “não” no referendo dinamarquês em 1992 sobre o Tratado de Maastricht, “não há plano B na Europa”. “Há muito tempo que o poder já não está em Bruxelas e encontra-se agora nas capitais dos Estados-membros. É aí que tudo se decide. Temo que não haja plano B para contrariar a retórica da vitória da saída“, avisou o antigo presidente do gabinete do Parlamento Europeu em Portugal.

E os funcionários britânicos que trabalham na União Europeia? Rui Tavares afirma que muitos já pediram a nacionalidade belga e podem assim permanecer nos seus postos de trabalho nas instituições. Quanto às nomeações do Governo britânico e altos funcionários das instituições que conseguiram os seus cargos através da quota das nacionalidades a que cada país tem direito, estes especialistas nas negociações em Bruxelas podem vir a ser uteis ao Governo britânico para passarem a exercer um forte lóbi junto das instituições europeias, pois o país já não vai estar representado nos órgãos de decisão.