A Comissão Europeia não vai avançar com sanções contra Portugal e Espanha… para já. Apesar de a decisão não estar completamente fechada — só depois da reunião do colégio de comissários na terça-feira –, a proposta passa por dar mais três semanas aos dois países para avançar com medidas para corrigir os seus défices, e assim evitar sanções, apurou o Observador junto de fontes europeias.

Num período de grande turbulência na União Europeia, e ainda com grande pressão do grupo de países tradicionalmente mais conservadores em relação às regras orçamentais, a Comissão Europeia vai reunir-se na terça-feira com a proposta em cima da mesa para não avançar já com sanções, e dar mais algumas semanas para que os dois países avancem com medidas.

“Vão ter de ser tomadas decisões, mas parece haver uma preferência geral para avançar de uma forma que permita o máximo envolvimento e cooperação com os países em causa”, afirmou ao Observador um responsável europeu.

O prazo de três semanas começará a contar a partir da altura em que a decisão do colégio de comissários for tomada, ou seja, a partir de terça-feira, desde que o Ecofin (conjunto de 27 ministros da UE) conclua que os dois países não tomaram medidas eficazes (non effective action), acrescenta a mesma fonte. A decisão não está totalmente fechada, será na terça-feira alvo de discussão, mas o entendimento entre os comissários é de que as sanções não avançarão pelo menos para já.

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Os comissários estão dispostos, mesmo os mais conservadores, a permitir os deslizes de Portugal e Espanha se os governos tomarem medidas que deem um sinal de que estão dispostos a fazer o que for preciso para manter as contas em ordem e cumprir os compromissos, apurou o Observador junto de fontes europeias, numa altura em que o Governo português tem tomado várias medidas de aumento da despesa pública com a reversão de medidas que estavam em vigor desde a altura do resgate, e em Espanha o impasse para a formação de governo continua sem fim à vista.

O acordo permitiria satisfazer os mais conservadores neste processo, casos da Alemanha, Holanda e Áustria, que pediram desde a terça-feira de Carnaval, pouco depois de aprovado o orçamento português em Bruxelas, que Portugal avançasse com um plano B com mais medidas para aplicar ainda este ano. A intenção era diferenciar Portugal, como país que tinha saído de um resgate recentemente, de países como, precisamente, a Áustria, que também se encontra em risco de incumprimento das regras orçamentais.

Depois de uma discussão acesa na reunião do dia 10 de maio, onde alguns comissários pediam sanções para os dois países, tendo Jean-Claude Juncker defendido o esforço que tem vindo a ser feito tanto por Portugal, como por Espanha, na semana seguinte, a 18 de maio, os comissários decidiram adiar a decisão para o início de julho, citando razões políticas, devido ao calendário eleitoral em Espanha (as eleições realizaram-se a 26 de junho) e ao referendo britânico à permanência na União Europeia, a 23 de junho, e que acabaria por ditar a vitória do Brexit.

Este adiamento não caiu bem, especialmente entre os países mais conservadores – Wolfgang Schäuble manifestou-se publicamente contra, mas não foi o único -, e a questão foi conversada, ainda que de forma informal, entre os ministros das Finanças da União Europeia, chegando mesmo a ser pedido um parecer legal para avaliar se a Comissão tinha tomado uma decisão com cobertura legal.

Na terça-feira será apenas decidida qual é a proposta da Comissão Europeia. A proposta é aprovada automaticamente, caso não seja chumbada por uma maioria qualificada entre todos os ministros das Finanças da União Europeia.

Que sanções estão previstas nas regras?

Se o país não tomar medidas para corrigir o défice de forma repetida, pode ser alvo de mais uma multa de 0,2% do PIB, a que acresce uma componente variável, que não é clara nas regras orçamentais europeias. Estas multas serão anuais enquanto o défice não for corrigido.

A própria forma de avaliação da adoção de medidas eficazes é complexa. Para que a resposta seja positiva é preciso que a variação anual do saldo estrutural esteja em linha com o recomendado, que esteja feita a quantificação das medidas tomadas e, por último, que exista uma análise abrangente da Comissão Europeia.

No entanto, as sanções não são apenas pecuniárias. As sanções pecuniárias podem chegar aos 0,2% do PIB – cerca de 370 milhões de euros, no caso de Portugal -, em forma de um depósito sem render juros no Mecanismo Europeu de Estabilidade. Mas, na parte financeira, até podem ser de um euro ou de zero euros. A avaliação é feita por proposta da Comissão, votada no Conselho, da qual o país pode recorrer (como explicado aqui).

Os países podem ainda ver suspenso o financiamento do Fundo de Coesão e restantes fundos europeus. A Comissão pode ainda exigir mais informações, a determinar pelo Conselho da União Europeia, antes de Portugal ir ao mercado para emitir dívida pública, o Banco Europeu de Investimento pode reconsiderar os empréstimos ao Estado-membro em causa e pode ainda sujeitar os países a vigilância reforçada, um passo intermédio que Portugal esteve perto de ser sujeito no final do programa, caso avançasse para um programa cautelar.

Na prática, esta vigilância seria reforçada para além daquela que já é aplicada ao abrigo do Procedimento por Défice Excessivo. À semelhança do que acontecia com a troika, Portugal poderia ser alvo de visitas regulares da Comissão Europeia e do Banco Central Europeu a cada seis meses, ou mesmo a cada três meses. Ao abrigo desse acompanhamento, a Comissão pode concluir que um Estado-membro tem de tomar mais medidas, mas apenas se a instabilidade financeira do país puder ter consequências na estabilidade financeira da zona euro.

Governo mantém posição

Em resposta ao Observador, o Ministério das Finanças, sem comentar o teor da notícia, garante que está comprometido com as metas e que está a aguardar a decisão de Bruxelas.

“Continuamos comprometidos com as nossas metas. As sanções são um processo acerca da execução de 2015 e aguardamos as decisões de Bruxelas fazendo o nosso trabalho. Quanto ao teor da notícia, remetemos para Bruxelas”, disse ao Observador, fonte oficial do Ministério das Finanças.

(Artigo atualizado com a posição do Ministério das Finanças)