Os dois filhos do embaixador do Iraque em Portugal falaram esta segunda-feira à noite pela primeira vez do caso das agressões ao jovem Ruben Cavaco, em Ponte de Sor. Numa entrevista à SIC, os dois jovens, que gozam de imunidade diplomática em Portugal, negam ter atropelado o jovem de 15 anos, mas admitem as agressões, justificando-as como resultado da “situação” que envolveu “jovens”, “álcool” e “saídas à noite”. “É uma receita perigosa”, diz Haider, de 17 anos. Os dois irmãos receberam várias ameaças de morte.
“Não diria que sou vítima do Rúben ou o Rúben de mim, mas diria que somos todos vítimas das circunstâncias”, diz Heider na entrevista que deu à SIC. Segundo o jovem, filho do embaixador Saad Mohammad Reza, casos como este “são muito fáceis de acontecer em Portugal, e acontecem todos os dias, o problema é que este caso tem recebido mais atenção mediática”.
No relato que fazem dos factos, os jovens de 17 anos alegam que antes da discussão com Rúben Cavaco foram agredidos por seis rapazes do grupo de Rúben junto a um bar da cidade. Terão depois regressado ao bar, na mesma noite, para recolherem alguns pertences que tinham caído durante a discussão e terá sido nessa altura que encontraram de novo Rúben Cavaco na rua, tendo-se iniciado aí uma nova discussão.
Na entrevista, onde os dois quiseram contar a sua versão do que se passou em Ponte de Sor, Haider e Ridha afirmam não se considerar “acima da lei” e garantem que não tencionam deixar o país. “Respeitámos todos os procedimentos policiais e nem tínhamos de o fazer, podíamos simplesmente ter declarado a imunidade diplomática, mas não, colaborámos com o interrogatório”, afirmam. No entanto, reclamam desigualdade no tratamento das partes envolvidas: “verifica-se que nada aconteceu a essas seis pessoas, portanto, podemos perguntar: elas estão acima da lei?”
Em relação à permanência no país, disseram: “Obviamente continuamos aqui, onde vamos continuar à espera que a situação se resolva e que o Rúben melhore” e acrescentaram ainda : “A nossa família e a embaixada iraquiana rezam pela sua recuperação”.
Ridha e Haider contaram a sua versão dos factos. Haider explicou que estava numa mesa com uns amigos e usava uma t-shirt que deixava ver as suas tatuagens e um dos seus amigos terá feito um comentário. Foi então que terá despido uma das pernas das calças para mostrar uma outra tatuagem que tem na coxa. O grupo em que se inseria Rúben, que estava na mesa atrás, terá ficado ofendido com o gesto e começaram a agir de forma agressiva.
Rúben estava na mesa com outros 5 amigos, todos adolescentes, explica. Terão abordado Haider e insultaram-no em português. Um dos rapazes agarrou-lhe as mãos e um amigo do iraquiano interveio no sentido de parar a agressão. Foi nessa altura que saíram. Quando se dirigiam para o carro, já Haider tinha entrado, o grupo cercou Ridha.
Ridha explicou que tentou fazer uma barreira e evitar ser agredido. Um dos jovens quereria agredir Haider e Ridha tentava impedi-lo, mas acabou por ser atacado por “cinco ou seis pessoas”.
Depois, Rúben e os amigos ter-se-ão afastado e os dois irmãos gémeos aproveitaram para ir embora. Voltaram alguns minutos depois, mas no local estava apenas a GNR e algumas testemunhas que contaram o sucedido às autoridades. Os gémeos também terão prestado depoimentos na altura. Ridha conta que naquele momento os sinais de agressão na cara de Haider ainda eram visíveis e que ele próprio tem o nariz e um pé fraturados. A polícia levou-os a casa e disse-lhes para apresentarem queixa no dia seguinte.
No entanto, terão voltado ao bar para ir buscar “algumas coisas que tinham ficado para trás” após o incidente. Terão visto Rúben Cavaco de novo: “Ele disse algo em português que eu não entendi, mas falava com um tom agressivo, como se quisesse começar uma nova discussão”. Haider conta que Rúben ter-lhe-á agredido na cara e nos ombros. “Senti-me extremamente insultado e não podia tolerar mais”, disse Haider. Começou então a correr atrás do jovem. Com ele ia Ridha, o outro filho do embaixador do Iraque em Portugal. “O meu irmão veio para me ajudar a bater nele”. Rúben Cavaco acabou no chão. “Dei-lhe mais alguns pontapés, mas depois o meu irmão disse-me para parar, porque ele já estava no chão”, relata Haider.
Quando questionados sobre se estavam alcoolizados, Haider disse que o teste de alcoolemia que lhe foi feito pela GNR acusou 0,58, pouco mais que o limite legal de 0,5 a partir do qual não se pode conduzir, mas que o seu irmão estava alcoolizado. Dizem que este tipo de desacatos é comum em Portugal já que”é fácil para os menores terem acesso a álcool. A regulação em coisas deste género é muito permissiva, portanto, isto é obviamente uma receita para o desastre especialmente quando há adolescentes com hormonas e emoções muito fortes”.
Ridha diz que desde então receberam várias ameaças de morte: “vimos possivelmente milhares de pessoas a comentarem, a dizerem como gostariam de nos matar e que, se nos vissem na rua, gostariam de nos espancar para ficarmos no mesmo estado em que ficou o Rúben e ficam completamente impunes porque não nos conhecem e nós não os conhecemos. Claro que isso nos assusta.”
Pediram desculpa ao Rúben e à sua família pelo incidente e garantiram que “Nunca foi a nossa intenção ferir tão gravemente uma pessoa. Somos rapazes normais, ambos com 17 anos. Somos iguais a qualquer pessoa neste país. Sentimos que somos parte da sociedade e da comunidade portuguesas. Não pensamos que estamos acima da lei porque somos diplomatas.”
O embaixador do Iraque ainda não se pronunciou publicamente, mas Haider admitiu: “o meu pai está destroçado e a minha mãe está muito mal. Nós não representamos o nosso pai, nós não representamos o governo iraquiano, não representamos ninguém senão nós próprios.”