Mais de 2.300 migrantes foram hoje retirados sem incidentes da “Selva” de Calais em autocarros que os transportaram para centros de acolhimento distribuídos por França, no primeiro dia das operações de desmantelamento do gigantesco bairro da lata.

Entre 6.000 e 8.000 homens, mulheres e crianças procedentes, na maioria, do Afeganistão, do Sudão e da Eritreia vivem neste vasto acampamento, que se tornou há anos local de concentração de migrantes determinados em alcançar a Inglaterra, logo do outro lado do canal da Mancha.

Ao todo, 2.318 migrantes foram “colocados em acolhimento” no dia inicial da operação, anunciou o ministro do Interior francês, Bernard Cazeneuve.

“[Um total de] 1.918 adultos deixou Calais a bordo de 45 autocarros em direção a 80 centros de acolhimento e de orientação (CAO) situados em 11 regiões de França”, afirmou o ministro.

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Quatro centenas de menores foram também “orientados para o centro de acolhimento provisório”, situado no acampamento, aguardando instruções sobre os respetivos casos.

Há cerca de 1.300 menores sozinhos a viver no campo, 500 dos quais afirmam ter familiares no Reino Unido.

Após longas filas de espera desde a madrugada, o fluxo das partidas reduziu-se algumas horas mais tarde, nesta primeira fase do esvaziamento do campo que está a ser feita num regime de voluntariado.

Alguns dos migrantes terão adiado a sua viagem para os próximos dias, outros foram dissuadidos pela afluência das primeiras horas, segundo as autoridades locais.

Está prevista uma demolição rápida do campo: as retroescavadoras deverão começar na terça-feira a deitar abaixo tendas e barracas.

As condições de vida na “Selva” e o seu impacto na região tornaram-se um tema sensível, a seis meses das eleições presidenciais francesas. Este campo simboliza também a impotência da Europa perante a pior crise migratória desde a Segunda Guerra Mundial.

“O Governo tomou uma decisão corajosa, mas uma decisão necessária (…) um país como a França, com 67 milhões de habitantes, é perfeitamente capaz de acolher pessoas em aflição (…), de as acolher dignamente, sem polémica excessiva”, declarou hoje o ministro dos Negócios Estrangeiros, Jean-Marc Ayrault, à margem de uma deslocação à Turquia.

Apesar de alguns incidentes e altercações, a operação de retirada decorreu “com calma e ordem”, congratulou-se Cazeneuve.

Mais de 1.250 polícias foram destacados para o local, mas também elementos de organizações humanitárias e representantes de diferentes organizações não-governamentais.

Embora saudando “a serenidade” das primeiras partidas, Christian Salomé, da associação Auberge des Migrants, declarou-se “preocupado com o fim da semana, quando restarão apenas as pessoas que persistem em querer ir para Inglaterra”. Serão cerca de 2.000 nessa situação, precisou.

“Quero ir para a Grã-Bretanha, os autocarros não me interessam”, disse Mohammed, um cidadão etíope que observa a dança dos autocarros sem qualquer intenção de embarcar.

“Penso que as pessoas vão continuar a chegar”, considerou, por sua vez, Clare Moseley, da organização Care4Calais, acrescentando: “Os migrantes não vêm para aqui porque têm escolha, mas porque não a têm”.

O início da operação de evacuação da “Selva de Calais” não encerrou o debate político: a esquerda está preocupada com as condições de retirada, a oposição de direita teme uma multiplicação de “mini-Calais”, a extrema-direita defende a deportação dos refugiados para os países de origem.

Com 7.500 lugares em 451 centros, a relocalização dos migrantes desencadeou reações por vezes violentas em algumas localidades.