O PSD quer limitar os salários da atual administração da Caixa Geral de Depósitos, liderada por António Domingues, e está a tentar que aquela administração não escape ao dever de transparência a que estão sujeitos todos os gestores públicos. Para isso, e para que não restem dúvidas de que a alteração legislativa que propõe é para aplicar já à administração em funções, o PSD fez uma retificação ao projeto de lei que tinha apresentado na sexta-feira sublinhando que “as alterações aplicam-se aos mandatos em curso”, e autonomizou a obrigatoriedade de apresentação de declaração de rendimentos. Objetivo? Levar o BE e o PCP, assim como o CDS, a aprovar pelo menos aquela norma — em que todos concordam.

“É sabido que todos os partidos, à exceção do PS, divergem do que está hoje na lei em relação aos salários dos gestores da Caixa, mas têm propostas diferentes [o PCP, por exemplo, queria limitar salários da CGD ao salário do Presidente da República], o que faz com que esse trabalho legislativo seja mais demorado e difícil. Mas o mesmo não acontece na questão da transparência, uma questão em que todos os partidos concordam. Não há desculpas, não há álibis”, disse Luís Montenegro esta quarta-feira, numa declaração aos jornalistas no Parlamento, para explicar o desdobramento dos projetos de lei.

Montenegro não rejeita que seja o Tribunal Constitucional a decidir sobre se os gestores do banco público têm ou não de apresentar declaração de rendimentos, mas diz que “seria uma anedota, um perfeito absurdo”, que não fosse o legislador, a Assembleia da República, a decidir sobre essa matéria, já que a grande maioria dos partidos está de acordo. “Se todos, à exceção do PS, estão de acordo em relação ao princípio, mal era que não saísse deste Parlamento, de forma rápida e expedita, uma proposta nesse sentido”, disse. O presidente da bancada do PSD acrescentou ainda que se sentiria “muito envergonhado enquanto parlamentar” se assim fosse. A ideia é pressionar BE e PCP, que também já se manifestaram publicamente contra a isenção de escrutínio conferida aos administradoras do banco público, a unirem-se ao PSD e CDS pelo menos nesta questão.

Este sábado, o líder parlamentar Luís Montenegro já tinha adiantado que o PSD iria fazer um desdobramento do projeto de lei entregue na sexta-feira. Assim, o partido passa a apresentar um projeto de lei para acabar com o regime de exceção no que diz respeito aos salários de topo; e apresenta um segundo diploma para garantir que a administração da Caixa Geral de Depósitos fica obrigada aos deveres de transparência para os gestores terem de entregar a declaração de rendimentos e património no Tribunal Constitucional. A ideia era autonomizar o ponto relativo à transparência, com o objetivo de promover mais facilmente o consenso entre os partidos no Parlamento, já que BE e PCP, assim como CDS, também concordam com a obrigatoriedade de escrutínio.

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Mas não só. Nos dois novos diplomas apresentados esta quarta-feira, que substituem o primeiro, os sociais-democratas acrescentam uma alínea que elimina qualquer dúvida sobre qual é o alvo da alteração legislativa. Enquanto na primeira versão estava apenas fixado que a lei entraria em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e produziria efeitos de imediato, agora nos dois novos diplomas é acrescentado que produz “efeitos imediatos com a sua entrada em vigor, incluindo relativamente aos mandatos em curso”.

É o ministro que decide salários mais altos, mas com “razoabilidade”

Assim, o PSD quer fazer “alterações ao estatuto do gestor público e aos regimes jurídicos do setor empresarial do Estado e do setor empresarial local”, eliminando a exclusão dos administradores da CGD do Estatuto de Gestor Público e repondo os limites salariais que vigoravam no regime antigo (criado pelo Governo anterior). Mas com uma diferença em relação ao regime antigo: é criada uma nova obrigação de fundamentação. A ideia é haver uma regra — a de limitar os salários dos gestores públicos ao vencimento mensal do primeiro-ministro –, mas também haver uma exceção: o ministro das Finanças, ouvindo o ministro que tutela a empresa em questão, deve decidir, com base na “razoabilidade”, se o salário de determinado gestor pode ultrapassar o do primeiro-ministro. Mas tem de o justificar.

Lê-se assim: “Relativamente ao limite remuneratório excecional aplicável às empresas mercantis que operam em mercado concorrencial, clarifica-se e reforça-se a responsabilidade do ministro das Finanças na autorização de salários acima do primeiro-ministro. Fica claro que se trata de uma faculdade e não uma obrigação do ministro das Finanças, que tem de exercer com razoabilidade”. “Cabe-lhe [ao ministro das Finanças] decidir e fixar em cada caso a remuneração entre um dos dois limites taxativos que a lei prevê: o nível do primeiro-ministro ou um valor que fundamente como adequado, respeitando sempre o limite máximo da média dos últimos três anos”.

O outro diploma, que corresponde à parte que foi autonomizada na versão inicial, e que visa impor “deveres de transparência aos administradores da CGD”, prevê três alterações: o “dever dos gestores públicos declararem interesses potencialmente conflituantes, incluindo referência expressa à lei n.º 4/83 que confirma a necessidade de reporte também ao Tribunal Constitucional”; “regras mais clara nos impedimentos”, e a obrigação de publicar no site da empresa pública os registos de interesses dos administradores, as orientações transmitidas pelo Governo e a fiscalização do cumprimento dos objetivos fixados.