A presidente do Conselho de Finanças Públicas (CFP) considerou que cumprir a meta do défice deste ano é “quase uma questão de fé”, mas admitiu que as receitas adicionais do “perdão fiscal” podem ajudar a alcançar o objetivo.
A Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) estima que o défice até setembro tenha representado 2,8% do Produto Interno Bruto (PIB), um valor que fica acima do objetivo do Governo para 2016 e que aumenta os desafios sobre a meta, exigindo um défice de 1,5% no último trimestre do ano.
À margem de um debate organizado pelas confederações de comércio luso-britânica e francesa, em Lisboa, a presidente do CFP, Teodora Cardoso, foi questionada sobre se ainda é possível alcançar a meta orçamental para este ano, de 2,5% do PIB, exigida por Bruxelas e respondeu: “É quase uma questão de fé”.
Mas eu diria que o Governo tem instrumentos que permitem fazer isso ou, pelo menos, acredita que tem. Esses instrumentos são basicamente dois: a própria gestão do fim de ano que permite muitas coisas e, por outro lado, tem a ver com a possibilidade de o PERES [Programa Especial de Redução do Endividamento ao Estado] trazer receitas adicionais. Eu penso que deverá ser isso que levará a conseguir chegar aos 2,5% ou 2,4% [meta prevista no Orçamento do Estado para 2017). E há uma coisa de que tenho a certeza: o Governo fará tudo apara chegar lá”, afirmou Teodora Cardoso.
Durante a intervenção no debate, a presidente do CFP foi crítica da atual política económica e orçamental, defendendo que as medidas tomadas durante o período da ‘troika’ não deveriam ter sido revertidas.
Os cortes de despesa que se fizeram nunca foram complementados como deviam ter sido, muito mais cedo e por medidas mais estruturantes. Porque medidas que simplesmente se traduzem num corte horizontal de salários e pensões têm um grande problema de que, assim como se fazem num dia, desfazem-se no dia seguinte. E nós estamos a assistir a isso. Esses cortes estão a ser revertidos sem que nada se tivesse passado entretanto. Ou pouco se passou. (…) Foi tudo muito insuficiente para compensar esse efeito [da reversão] e sobretudo para transformar a administração pública”, afirmou Teodora Cardoso.
No final do debate, e perante questões colocadas por empresários, a economista disse que seria difícil a Portugal pedir um novo resgate.
Eu não tenho a certeza se nós agora conseguiríamos um segundo resgate. Não é opinião é falar com base no que me dizem pessoas que são efetivamente responsáveis por negociar esse resgate. E que me dizem que é muito discutível se conseguiríamos. Convém começarmos a pensar que isto não é só continuar a gastar e à espera que no fim alguém apareça para resolver”, afirmou.
Portugal vai precisar de uma reestruturação da dívida “pela positiva”
A presidente do Conselho de Finanças Públicas (CFP), Teodora Cardoso, admitiu esta terça-feira que Portugal “vai precisar de uma reestruturação da dívida”, mas “pela positiva”, recusando um “haircut” (perdão), como aconteceu na Grécia.
A reestruturação da divida é algo de que Portugal vai precisar. Isto porque as taxas de juro nos mercados internacionais até estão em níveis negativos, mas vão subir e já estão a subir”, afirmou Teodora Cardoso, numa intervenção num debate promovido pelas câmaras de comércio francesa e luso-britânica, que decorreu esta terça-feira, em Lisboa.
Nesse sentido, a economista defendeu que “há uma reestruturação que é necessária, mas é a reestruturação que acontece pela positiva”, que deve resultar de “políticas económicas que levem a maior crescimento” e que coloquem Portugal perante os credores “como um país que consegue efetivamente servir a dívida no futuro”.
Segundo a presidente do CFP, isso faria com que o prémio de risco da dívida portuguesa baixasse. “Nessa situação poderemos ter a tal reestruturação, que advém de taxas de juro mais baixas e prazos mais longos. Mas isto num contexto de mercado e da avaliação dos credores da nossa capacidade de servir a dívida”, defendeu.
Isto porque, “a outra reestruturação, como a que sucedeu já na Grécia, com “haircuts” na dívida, traria dois tipos de problemas”: o impacto nos bancos, que têm “muita dívida pública portuguesa e os que já não estão bem e ficariam muito pior” e um “aumento do prémio de risco”.
Um país que deixa de ser capaz de pagar, evidentemente que vai ver-se com um prémio de risco maior, portanto o que deixa de perder de um lado passa a perder por outro”, afirma.
Na segunda-feira, os ministros das Finanças da zona euro acordaram, em Bruxelas, algumas medidas para aliviar a dívida grega no curto prazo, designadamente a nível dos prazos de pagamentos dos empréstimos dos parceiros europeus e taxas de juro aplicadas.
Os responsáveis europeus têm rejeitado liminarmente a adoção de medidas idênticas de alívio da dívida para outros países que estiveram também sob programa, como Portugal, defendendo que o caso da Grécia é único.
Na anterior reunião do Eurogrupo, celebrada em novembro, o líder do Eurogrupo garantiu não foi, nem será discutida uma eventual renegociação dos juros da dívida portuguesa, argumentando que há uma “grande diferença” relativamente à Grécia.
Não discutimos e não vamos discutir, porque Portugal é capaz de gerir a sua própria dívida. E não estamos certos de que assim seja no caso da Grécia, é essa a grande diferença. Não vamos confundir” as situações, declarou o presidente do Eurogrupo.