O compositor Cândido Lima regressa, esta sexta-feira, ao Rivoli, no Porto, para uma nova interpretação de ‘Oceanos’, “uma das suas composições mais celebradas”, segundo o teatro, originalmente concebida para orquestra, vozes, percussão e eletrónica, estreada naquela sala, em 1979.

Pioneiro em Portugal da música eletroacústica, Cândido Lima compôs ‘Oceanos’ por encomenda da Fundação Calouste Gulbenkian, e estreou a obra no Teatro Rivoli, com a Orquestra Sinfónica do Porto e o maestro Gunther Arglebe.

Dedicada ao compositor Iannis Xenakis, com quem trabalhou, ‘Oceanos’ é a primeira obra de música portuguesa a usar meios informáticos e electroacústicos, e o compositor esperava que a interpretação tivesse o efeito de “uma hecatombe”.

“Uma das coisas que me marcou e entusiasmou sempre, em Xenakis, era a sensação de que algumas obras nasciam desordenadas”, mas “iam encontrando a sua ordem”, e talvez tenha sido esse fator “que marcou as minhas obras, sobretudo as dos anos de 70”, disse o compositor numa entrevista, publicada pelo Centro de Investigação da Música Portuguesa, no seu site na Internet.

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Nessa entrevista ao compositor e investigador Miguel Azguime, Cândido Lima diz que se vê como um “elemento do público”, que gosta de ser surpreendido. Por isso, “a ideia do início dos ‘Oceanos’ era essa: como se uma hecatombe caísse numa sala”.

“Tudo isto tem de facto a ver com um gosto pela teatralidade”, “mesmo que seja uma teatralidade íntima ou intimista”, prosseguia o compositor. “Um dia, apresentei ao ar livre os ‘Oceanos’, (…) e havia de facto um teatro naquela música, (…) as personagens eram o público”, “eram as imagens que criávamos com projetores sobre as árvores”.

Cândido Lima nasceu em 1939, em Viana do Castelo, diplomou-se em Piano e Composição, nos Conservatórios de Lisboa e do Porto, que conjugou com a formação em Filosofia e Humanidades. Foi bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris.

Estudou composição com Iannis Xenakis, direcção de orquestra com Gilbert Amy e Michel Tabachnik, Electroacústica e Informática Musical nas Universidades de Vincennes e Panthéon-Sorbonne.

Trabalhou nos chamados “templos” de investigação, nesta área – o Instituto de Pesquisa e Coordenação de Acústica e Música (IRCAM), de Pierre Boulez, e no Centre d’Etudes de Mathématique et Automatique Musicales (CEMAMu), de Iannis Xenakis, em Paris.

No regresso a Portugal, dedicou-se ao ensino de composição, na Escola Superior de Música do Porto, criou programas de divulgação, na rádio e na televisão, como Sons e Mitos, Fronteiras da Música e Evocações, escreveu sobre aqueles com quem trabalhou, como Ligeti e Boulez, e fundou o Grupo Música Nova, dedicado ao repertório contemporâneo.

O compositor francês Pascal Dusapin, que lhe dedicou a obra ‘Canto’, convidou-o para o júri da Académie Européènne de Composition, a par de Wolfgang Rhim, Magnus Lindberg, George Benjamin e James Dillon.

Cândido Lima é autor de obras de investigação como ‘Empirisme et Rationalisme dans la Musique Contemporaine’, ‘Varèse, Xenakis – Timbre, Énergie, Densité’, ‘Origens e Segredos da Música Portuguesa Contemporânea’.

Tem disponíveis, em disco, peças como ‘ETRAS’, pelo Sond’Ar-te Electric Ensemble, ‘Quatro peças dodecafónicas’, pela pianista Nancy Lee Harper, ‘Canto das fragas’, pelo Performer Ensemble, ‘Ncàãncôa’, pelo clarinetista Nuno Pinto, ‘Vozes à Luz’, pelo Quarteto Suggia.

O duplo álbum ‘Para além das árvores’, do Grupo Música Nova, é dedicado à sua música.

‘Oceanos’ regressa esta sexta-feira ao Teatro Rivoli, a partir das 23h30, no âmbito do programa ‘Understage’.

No ano da estreia, em 1979, a obra também foi interpretada pela Orquestra Gulbenkian, em Lisboa, sob a direção de Michel Tabachnik, um dos mestres de Cândido Lima, em Paris.