O som das ondas antecede o desfile e invade o que parece ser um antigo armazém localizado no centro de Paris. O espaço amplo que compõe a Garage Lübeck, habitualmente requisitado durante a Semana de Moda Prêt-à-Porter, tem paredes descascadas, de um tom branco já gasto pelo tempo, e um teto suportado por uma estrutura de metal. Faz frio lá fora mas também cá dentro — coincidência ou não, a temperatura e a melodia de um mar agitado criam o ambiente certo para que Luís Buchinho apresente a sua coleção para o próximo outono/inverno, cujo nome é, muito a propósito, “This is The Sea”.
Há mar e mar, há ir e voltar. E esta é a 44º vez que Luís Buchinho regressa à cidade-Luz para participar na Semana da Moda de Paris a convite do Portugal Fashion. Para a coleção mais recente, apresentada esta quarta-feira pelas 16h50, o designer foi buscar inspiração ao litoral português e, dos mais de 900 quilómetros de costa (sem contar com as ilhas), dedicou especial atenção às falésias da costa vicentina. “Houve uma simplificação muito grande, mas a base [para os grafismos em peças de jaquard e seda] foram as imagens do litoral alentejano”, conta ao Observador momentos antes do desfile.
A paisagem do mar, ora revolto ora calmo, e a sua envolvência — pescadores, varinas, areia e rochas — estão na base da coleção que pretende transformar este universo rude, e por vezes frio, em peças de roupa mais sofisticadas e que fundem ambos os sexos (exemplo disso são as silhuetas longas, que tanto sugerem saias como calças). Há padrões retirados a letreiros de traineiras — daí que seja possível ler “Estrela da Galé” num dos pares de leggings –, estampados de seda com motivos de pedra e argila, e ainda rendas e redes revestidas com foil (uma espécie de tecido metalizado). A isso juntam-se as gabardines de algodão que, garante o criador, tiveram um tratamento encerado que lhes conferiu um ar molhado e gasto, quase como se tivessem saído de uma tempestade.
Em vez do mais óbvio azul, o espírito náutico ganha expressão numa palete de cores que não foge muito dos tons sóbrios e neutros: o preto e o branco, em diferentes texturas, são os grandes protagonistas desta história, sem descurar os apontamentos “pintados” a azul-marinho, a vermelho vivo, argila e antracite. Os tons ajudam, sem dúvida, à personificação do ambiente marítimo do designer, que pretendeu desde o início criar silhuetas com uma certa dureza de carácter, capazes de resistir a quaisquer intempéries.
Com atelier estabelecido no Porto, Luís Buchinho é natural de Setúbal e teve pescadores na família, o que o faz possuir ligações fortes ao mar. Talvez por isso se tenha deixado levar, desta vez, pela onda da maré.
O Observador viajou para Paris a convite do Portugal Fashion.