A ex-Presidente do Brasil, Dilma Rousseff, disse esta quarta-feira em Lisboa que existe “interesse” em impedir Lula da Silva de concorrer às presidenciais de 2018, numa referência ao líder da esquerda brasileira a quem sucedeu em 2011.
“Estamos num momento em que se aproxima a eleição [presidencial] de 2018. Mesmo com todas as críticas que a imprensa no Brasil lhe faz de forma sistemática, continua sendo o mais aprovado de todos os brasileiros, Luis Inácio Lula da Silva”, referiu, entre os aplausos da assistência que esgotava a sala.
“É a única que cresce do lado da esquerda, porque do lado da direita cresce uma candidatura de extrema-direita (…) que participou naquela extraordinária cerimónia de votação [durante a destituição pelo Senado] em que ele votou pela ditadura, pela tortura e pelo torturador que me aterrorizou”, disse Dilma Rousseff, numa referência ao senador Jair Bolsonaro.
Lula da Silva foi chefe de Estado entre janeiro de 2003 e dezembro de 2010, eleito pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e formações aliadas da esquerda brasileira. E foi Dilma Rousseff que lhe sucedeu, no Palácio do Planalto, coincidindo com as complexas investigações policiais e judiciais em torno da designada Operação Lava Jato.
Ainda numa referência às eleições gerais de 2018, onde para além do Presidente se elegem governadores, senadores e deputados, Dilma emitiu um alerta: “Se essas eleições forem conspurcadas, não haverá paz no Brasil. E nos precisamos de paz”, disse, após ter alertado para os perigos de se “continuar a dar golpe”, e ao “interesse em tirar Lula” dessa eleição.
A ex-líder brasileira assinalou também a necessidade de “chamar as coisas pelo seu nome”, num período crucial da história do seu país, e da América Latina. “O cravo na minha mão representa necessidade de democracia no Brasil”, começou por referir numa intervenção que se prologou por quase uma hora, e em que abordou de forma minuciosa as medidas que os governos da esquerda brasileira adotaram, e a atual contrarresposta neoliberal após o seu “impeachment”.
Numa referência explícita à sua destituição em agosto de 2016, menos de dois anos após ter sido reeleita Presidente do Brasil, Dilma denunciou um “golpe de Estado” que atingiu as 54,5 milhões de pessoas que a reelegeram, e alertou para a “corrosão” da democracia em tempos de neoliberalismo. A ex-Presidente foi afastada do cargo pelo Congresso, acusada de cometer crime de responsabilidade no exercício do cargo.
Dilma foi recebida em clima de emoção no teatro da Trindade de Lisboa, que agora celebra 150 anos. Na rua, junto à escadaria, concentravam-se dezenas de pessoas, em ambiente efusivo. “Dilma, guerreira, da pátria brasileira”, ecoava-se, junto a uma faixa do Coletivo Andorinha, brasileiros que vivem em Portugal. A mesma frase com que foi recebida quando surgiu no palco.
“Não temos tempo de Temer”, era o cartaz erguido por uma jovem, enquanto a sala do teatro se ia enchendo, muita gente com cravos vermelhos e brancos na mão. Uma referência ao atual chefe de Estado Michel Temer, após o seu polémico afastamento. No palco, uma grande foto de Dilma Rousseff jovem, dos tempos em que, guerrilheira, combatia a ditadura militar. E uma frase sua, de tempos mais recentes: “Apesar de receber o peso da injustiça nos meus ombros, continuo lutando pela democracia”.
Dilma Rousseff inaugurou esta quarta-feira o ciclo de conferências do Teatro da Trindade com a intervenção intitulada “Neoliberalismo, desigualdade, democracia sob ataque”. Dilma Rousseff deslocou-se a Lisboa a convite da Fundação Inatel, da Fundação José Saramago, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e da Casa do Brasil de Lisboa.