Ainda hoje há quem vista roupa da marca Mike Davis e não saiba que ela é 100% portuguesa. Que nasceu no clube de Ténis da Foz, no Porto, numa tarde de 1976, quando três amigos amantes do Ténis, do Windsurf e da Vela decidiram aproveitar a onda revolucionária que o país vivia para lançarem uma marca de roupa desportiva que fosse tão moderna e apelativa como aquelas que ainda só se viam nas revistas internacionais. Essa aura de cosmopolitismo ligada a desportos de elite fez com que a Mike Davis estivesse 40 a competir com as marcas internacionais mais cobiçadas.

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Em 1977 Henrique Schreck, Paulo Schreck e Raul Leitão saem as primeiras peças: vestuário técnico para Ténis e Windsurf, mas naqueles anos de efervescência isso não bastava. Era preciso aliciar novos praticantes, promover as atividades nas escolas, realizar torneios, patrocinar e estimular os que já praticavam. Talvez porque tiveram essa visão global e não apenas comercial do desporto, os fundadores conseguiram que a marca se tornasse um hit entre desportistas e não desportistas. Só a partir dos anos 90, com a entrada de muitas marcas internacionais é que o reinado da Mike Davis começou a ser ameaçado.

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José Manuel Cordeiro , em 1979, foi um dos primeiros atletas a ligar-se à Mike Davies usando as roupas tecnicas da marca

Mike Davis era o nome de um emblemático tenista galês que os criadores decidiram homenagear atribuindo o seu nome à marca. Mas a partir daí quase tudo é português: desde os designers, aos materiais, ao fabrico das peças tudo é feito dentro das fronteiras nacionais. Nos anos 70 criaram os polos cuja malha é de criação e fabrico nacional e que têm demonstrado ter uma durabilidade excecional. Isto quando ainda poucas marcas davam importância à conceção técnica do vestuário. Foram ainda a primeira marca portuguesa a usar o neopreno para fabricar peças destinadas aos desportos náuticos.

Entretanto chegam os anos 80, com eles os desportos praticados dentro de água entram na moda e a marca portuguesa acompanha essa movida: a vela e o surf entram na constelação Mike Davis que se lança também no fabrico de pranchas, velas, raquetes e calçado especial. A par da proximidade ao desporto de competição, a marca ganha um hype também junto aos atletas de outras modalidades e depois junto do grande público, especialmente dos mais jovens. Os polos, os famosos “sapatos vela” e as parkas passaram a ser usados pela classe média-alta como sinónimo de status quo, tal era a reputação da marca.

Se Leonard Coen criou o Blue Rain Coat, a Mike Davis criou a parca amarela nos anos 80 e agora pegou do modelo e apresenta-o revisto e atualizado

Mas a ligação ao ténis foi, e continua a ser, o núcleo fundamental da Mike Davis. Desde os anos 70 até hoje que todos os portugueses que se destacaram esta modalidade estiveram ligados à marca. De João Guedes a Pedro Cordeiro, de João Cunha e Bernardo Mota até João Sousa (hoje o 33º no ranking internacional da modalidade). No final dos anos 90 a empresa associa-se também aos desportos motorizados e apoia o Rally de Portugal. Em 2006 liga-se também ao horseball e patrocinou a equipa portuguesa que, nesse mesmo ano, se sagrou campeã mundial da modalidade. Este ano a marca será a responsável por todo o fardamento do staff do torneio de ténis Estoril Open.

Depois de ter atravessado uma fase descendente, a Mike Davis renasce em 2013 com a entrada de Luís Aranha como CEO e de Ana Isabel Ramos como Diretora Artística, ambos com muita experiência na área dos têxteis e que deram à marca um impulso para novas direções. Abandonado, para já, o vestuário técnico, o enfoque da marca é agora o casual wear.

De Portugal para os portugueses

Entrevistada pelo Observador, Ana Isabel Ramos explicou as linhas orientadoras da Mike Davis que projeta para o futuro: “Queremos recuperar as tradições da marca, aproveitar toda a patine e experiência acumulada ao longo de quatro décadas para nos aproximarmos de novos públicos, acompanharmos as tendências da moda, da cultura e da sociedade.”

Campanha primavera/verão 2017 da Mike Davis sempre inspirada nas modalidades desportivas que fizeram a história da marca

Apesar da aposta no casual wear, a Mike Davis não pretende transformar-se numa marca de fast fashion, muito pelo contrário, garante Ana Isabel Ramos: “A nossa roupa é irrepreensível. As T-shirts não ficam tortas, os polos mantém aquele picotado original, temos um gabinete só para o estudo de cores, pois a tinturaria é fundamental para o fabrico de roupas de qualidade.”

95% da coleção é feita com matérias-primas portuguesas, “só mesmo os materiais complexos que ainda não são fabricados cá é que compramos no exterior. Porque queremos precisamente celebrar e aprofundar essa ligação a Portugal”, diz ainda a designer criativa da empresa.

Ao recuperar as peças icónicas da marca, quer numa versão vintage, quer na versão recriada, a Mike Davis assume os seus 40 anos, a desaceleração do tempo, as busca de uma outra forma de viver “mais lenta, onde o intemporal se sobreponha ao efémero, onde cada peça de roupa seja sentida como um investimento e não com um gasto”, diz ainda Isabel Ramos.

A Mike Davis tem, atualmente, 29 lojas próprias, a maioria na zona norte do país, mas também está à venda em lojas multimarca e tem algumas em regime de franchising.