“Rio Vermelho”
Howard Hawks, 1948
É o mais antigo dos filmes de John Wayne que um canal de televisão nos mostrou recentemente, numa maratona de filmes do género, incluindo vários spaghetti westerns, de Sergio Leone a muito pior. É também um dos mais ilustres. Numa das suas melhores interpretações, John Wayne personifica um dos seus heróis mais amargos – e com mais anos, no ecrã, do que muitos outros personagens que interpretou quando era mais velho. A seu lado, brilha Montgomery Clift, que iniciava a sua carreira e seria, com Brando e James Dean, um dos expoentes da escola de representação designada abreviadamente por “Método” e uma das suas mais trágicas figuras, na cena e na vida real. Foi a sua única aparição em filmes do faroeste (se não contarmos com “Os Inadaptados”, “The Misfits”, western moderno, por assim dizer, em que contracenou com Clark Gable, no seu último filme, e Marilyn Monroe, num argumento de Arthur Miller realizado por John Huston).
https://www.youtube.com/watch?v=UA4O7EgCUlU
O argumento tem a assinatura de Borden Chase, que está associado como argumentista a uma plêiade de grandes westerns (seria imperdoável não mencionar aqui “Winchester 73”, um dos grandes westerns de Anthony Mann, inesquecível e também a preto e branco, como “Os Inadaptados”). Nesse mesmo ano saiu “Forte Apache”, de John Ford (mais um a preto e branco, como, já agora, “Liberty Valance” ou o Billy the Kid de Arthur Penn) – em que os papéis se invertiam: Henry Fonda (contra o costume) era o “mau”, um oficial obstinado e obnubilado, John Wayne era o bom rapaz, embora nos filmes do realizador John Ford, isto sejam sempre coisas relativas e nada, a não ser, às vezes, a fotografia, seja a preto e branco.
“El Dorado”
Howard Hawks, 1967
É o segundo destes cinco filmes, por ordem cronológica, e não fica muito atrás do anterior, embora num registo mais ligeiro. Wayne contracena com um inesperado Robert Mitchum. Foi também realizado por Howard Hawks e é uma espécie de sequela do grande “Rio Bravo”, dirigido pelo mesmo realizador meia-dúzia de anos antes. Hawks foi o realizador de quem um crítico francês disse, com aquele jeito dos franceses para as frases de efeito, que situava sempre a sua câmara “à altura do homem”. Num notável ensaio do polifacetado ensaísta, historiador e crítico cultural Garry Wills, John Wayne’s body (“American Chronicles”, The New Yorker, 1996), Wills recorda que Howard Hawks via o filme como uma espécie de anti-“High Noon” (“O comboio apitou três vezes”, mais um clássico do western a preto e branco, cá está).
Em vez de mendigar o socorro de uns conterrâneos cobardolas, como o Gary Cooper do argumento “progressista” de Carl Foreman, o xerife de “Rio Bravo” recusa as ofertas de ajuda dos seus intrépidos concidadãos: enfrentar os fora-da-lei é o trabalho dele e não aceita, nem, muito menos, pede, o auxílio dos que lhe pagam para o desempenhar. Mais tarde, Hawks ainda realizou, sempre com John Wayne no protagonista, um terceiro ‘episódio’, em tom menor, Rio Lobo. Wills caracteriza magistralmente a ‘persona’ de John Wayne (na vida real Marion R. Morrison), incluindo o seu característico gingar (João César Monteiro prestou-lhe homenagem enviesadamente no seu ‘A bacia de John Wayne’ de 1997).
“A Velha Raposa”
Henry Hathaway, 1969
Com este filme de Henry Hathaway, veterano para toda a obra, muita vezes meritória, John Wayne ganhou o seu primeiro e único Óscar de interpretação. Ao que parece, ele achava que o tinha merecido por “Sands of Iwo Jima” (“O inferno de Iwo Jima”, 1949, de outra glória do cinema americano cujo nome é pouco conhecido do grande público, Allan Dwan). Merecia-o certamente por um dos seus papéis favoritos, o de “The Searchers” (“A desaparecida”, 1956), um dos grandes filmes do Oeste, de John Ford e do cinema em geral. John Wayne não fez só filmes de cowboys – nem foi sempre, nem de longe, dirigido por John Ford, embora estejam associados em vários títulos memoráveis do género (além dos citados, “The Man Who Shot Liberty Valance”, por exemplo (“O Homem Que Matou Liberty Valance”, 1962) ou o ciclo de filmes de cavalaria, e não só (veja-se “The Quiet Man”, “O Homem Tranquilo”, 1952).
“True Grit”, baseado num romance de Charles Portis que é uma extraordinária proeza literária, não é dos melhores filmes de John Wayne. Foi refeito recentemente pelos irmãos Coen, sem muito mais sucesso: “Indomável”, 2010). Tem a particularidade de que o seu personagem central – e narrador – é uma mulher (uma miúda, na verdade). O papel das mulheres no mundo do Oeste americano e no seu cinema não corresponde exatamente, aliás, ao estereótipo de um universo supostamente “machista”: veja-se, a propósito, Westerns, A Women’s History, de Victoria Lamont, e outros livros relacionados com o tema, recenseados num dos últimos números do Times Literary Supplement. O argumento do primeiro “True Grit” é de uma mulher, Marguerite Roberts.
“Nunca Foram Vencidos”
Andrew V. McLaglen, 1969
John Wayne entrou em mais de duzentos filmes, entre 1926 e 1979. Ganhou estatura de astro cinematográfico com o filme de John Ford “Cavalgada Heróica” (“Stage Coach”, 1939). O filme que consta no IMDB como sua primeira aparição cinematográfica é “Brown of Harvard” (“Amor e Sport”) filme mudo em que não é creditado, uma história de futebol americano, desporto em que se tinha distinguido, aliás, antes de enveredar pelo cinema (a maior parte das enciclopédias de cinema impressas não vão tão atrás). Quando fez “Cavalgada Heróica” já tinha dezenas de filmes no cadastro. Em várias décadas de carreira só ao chegar a 1975 passou um ano sem um filme seu; nesse ano de 1939 que o consagrou, em pleno reinado do studio system e, se não contei mal, estabeleceu, com seis filmes produzidos, o seu record de produtividade.
https://www.youtube.com/watch?v=oeIuodiPoU8
A época privilegiada nesta recente e brevíssima antologia televisiva de filmes de John Wayne privilegiou uma fase de declínio da sua carreira, fins dos anos 60 e anos 70, que em geral não foi das mais felizes, embora haja boas palavras sobre o seu último filme. O actor morreu em 1979 e o seu último western e sua despedida do cinema foi um modesto “O atirador” (“The Shootist”, 1976, de Don Siegel). Entretanto tornara-se uma das mais constantes e mais graduadas figuras do box-office e da popularidade do cinema americano, em vida e mesmo depois de morto. Este seu filme é um dos menores dos seus filmes menores. Foi realizado por Andrew V. McLaglen, no estilo pesadão deste realizador muito menor, filho de um companheiro de muitos filmes, membro da “companhia” de actores de John Ford, Victor McLaglen.
Julgava-te morto, Mr. Jake
George Sherman, 1971
Tal como “Nunca foram vencidos”, é um dos westerns da relativa decadência do actor. É, no entanto, entre eles, um dos que melhor resistem à passagem do tempo, ao lado de alguns outros dos seus filmes menores como, por exemplo, “The Comancheros” (1961), de Michael Curtiz, o talentoso emigrante húngaro que ficará para sempre associado ao eterno Casablanca (embora tenha realizado dezenas de filmes, muitos dos quais tão bons como o filme de Bogart e Ingrid Bergman nenhum teve a mesma ressonância através de várias gerações de espectadores; Curtiz, depois de trabalhar na Hungria natal, na Áustria e na Alemanha, mudou-se para os Estados Unidos em 1926, o ano do primeiro filme de John Wayne; o actor inglês David Niven, em Bring Back the Dead Horses – um dos três livros autobiográficos que publicou – traça um afectuoso e hilariante retrato do realizador que nunca conseguiu falar bem inglês).
https://www.youtube.com/watch?v=akLxuzCpY28
“Big Jake” foi dirigido por George Sherman, um realizador sem grande história, mas também com dezenas de filmes no activo. John Wayne foi co-realizador – como também o fora em “The Undefeated” e em “Os Comancheros”. Como realizador devidamente acreditado, Wayne assinou e foi principal intérprete de “The Alamo” (“Álamo”) e “The Green Berets” (“Os Boinas Verdes”, 1968 – 1968!), dois filmes de exaltação patriótica, na linha da posição conservadora e fragorosamente anti-comunista que foi sempre a de John Wayne. A Medalha de Ouro do Congresso que lhe foi outorgada em 1979 tem uma inscrição sucinta: John Wayne, American.