Os responsáveis pela investigação ao furto de armas de guerra nos paióis de Tancos, há cerca de uma semana, estão a analisar todas as missões que os militares com ligação àquelas estruturas realizaram nos últimos anos em países do Médio Oriente. Perícias feitas no local podem ser “essenciais” para chegar aos autores do crime, acreditam.

Há quase uma semana que os elementos da Polícia Judiciária Militar (PJM) e da Polícia Judiciária (PJ) estão no terreno a analisar todas as pistas que apontem para os autores do furto de centenas de armas de guerra do parque nacional de paiolins de Tancos (PNT). Logo nas primeiras horas, os comandantes das várias unidades responsáveis pela segurança àquelas estruturas guardadas pelo Exército – e que entretanto foram exonerados pelo Chefe do Estado-Maior do Exército – disponibilizaram aos investigadores “documentos essenciais” que foram analisados à lupa. Entre esses documentos existirá informação sobre as missões internacionais realizadas pelos militares com ligações à segurança daqueles paiolins.

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Essa análise não acontece por acaso. O terreno em que estão instaladas aquelas estruturas – e onde é guardado equipamento militar sensível, como era o caso das armas de guerra furtadas há uma semana – fica em frente ao regimento de Engenharia do Exército, uma das unidades, destaca fonte da investigação ao Observador, que conta mais “projeções” (missões) para cenários internacionais. Em várias ocasiões, os homens das “infraestruturas” foram enviados para países do Médio Oriente como, por exemplo, o Líbano. É aí, na análise do contexto em que essas missões ocorreram, que parte da investigação está focada, o que sugere que não está afastada a hipótese de o furto das armas de guerra pode estar mesmo relacionada com atos terroristas.

A tese não é, no entanto, consensual entre a equipa a que foi entregue o caso e que contará, diretamente, com mais de uma dezena e meia de elementos. A investigação, a cargo da PJM e da PJ, está dividida em dois âmbitos: por um lado, tenta-se apurar de quem partiu a informação privilegiada (provavelmente interna, como já foi admitido por militares) que permitiu aos assaltantes atuar com precisão e sem ser incomodados pelos sistemas de proteção da base (as chamadas rondas feitas por militares, que aconteceram com 20 horas de diferença, uma às 20h00, outra apenas às 16h00 do dia seguinte); por outro lado, a investigação tenta seguir o rasto ao armamento furtado.

Ladrões carregaram armas durante 500 metros

Ao mesmo tempo que se tenta estabelecer ligações entre o interior de Tancos e os autores do assalto, tenta-se reconstituir os passos dados na última quarta-feira, quando desapareceram granadas, explosivos e outro material de guerra de dois dos paiolins daquelas instalações. Tendo em conta o volume de material furtado, os autores do furto terão chegado perto do perímetro dos paióis numa carrinha de transporte de mercadorias.

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Depois de cortarem a rede que separa a estrada do interior daquele espaço militar, dirigiram-se ao primeiro dos paióis. Arrombaram as portas – seria esse, aliás, o sinal que chamaria a atenção da patrulha de dois militares que passou pelo local várias horas depois – sem grandes dificuldades e entraram no primeiro paiolim. Sem especificar, por “razões de segurança”, que tipo de fechadura existia na entrada para aqueles edifícios, o Exército garante que havia “mais de um nível” de proteção em cada um.

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Lá dentro, os assaltantes escolheram o que quiseram, e tudo indica que tinham na mão uma lista precisa daquilo que deveriam levar consigo. Elementos ligados à investigação acreditam que o grupo percorreu por diversas vezes o mesmo trajeto a pé: carregavam em braços os “cunhetes” (as caixas) onde estavam guardadas as granadas, em conjuntos de 30 cada, agarravam as LAW (cada uma a pesar entre três e quatro quilos) e o restante armamento militar, percorreram os cerca de 500 metros até à carrinha usada para o o transporte e voltavam ao paiol para repetir o processo.

Quando o levantamento no primeiro paiolim ficou concluído, passaram ao segundo. No local ficaram ainda várias caixas com mais armamento semelhante ao material furtado. Para a investigação, é certo que um assalto desta dimensão nunca teria sido possível sem a colaboração interna: alguém com conhecimento do material guardado naqueles paiolins, mas também com informação em tempo real sobre os timings de cada uma das rondas, os trajetos percorridos pelas equipas (de dois homens) que estavam responsáveis pela segurança do espaço. A investigação considera, aliás, que “esta é a maior falha de segurança de sempre em continente europeu”.

Patrulhas feitas com carregadores selados

“Ainda bem que nenhuma patrulha os encontrou, porque ia morrer ali alguém”. A ideia foi partilhada ao Observador por um militar com conhecimento sobre as regras das patrulhas que fazem a ronda aos paióis de Tancos. A explicação é simples: as armas não estão prontas a disparar em qualquer momento, mesmo tratando-se de militares responsáveis pela segurança de instalações com elevado grau de sensibilidade.

Na sequência de alguns acidentes na década de 1980, o Exército tomou uma decisão radical: as armas usadas pelos militares teriam de ter os respetivos carregadores selados. Com essa medida, foi possível evitar mais incidentes graves. Mas, num caso como o de Tancos, isso também impede uma resposta eficaz de quem zela pela segurança daqueles equipamentos.

Na prática, os militares transportam os carregadores das armas à cintura. Quando é preciso fazer uso das munições, há que retirar o carregador da bolsa, rasgar o selo, colocar o carregador na arma e só então disparar. Numa situação de confronto inesperado com um assaltante, esse processo representa um perigo acrescido para os militares, dado o elevado tempo de que o militar necessita para tornar possível uma resposta eficaz.

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