O Bloco de Esquerda ficou “desconfortável” com o nível de cativações orçamentais que o Governo de António Costa aplicou em 2016. Na opinião de Pedro Filipe Soares, líder do grupo parlamentar dos bloquistas, foi uma execução “draconiana” no que a este tipo de cortes diz respeito — e tudo se deveu, diz, à “paranóia do défice”, que levou a que o Governo tenha decidido tomar medidas com as quais o BE diz não concordar, como o “perdão fiscal” às grandes empresas. Sobre os fogos, Pedro Filipe Soares diz que há um “problema comunicacional” no Governo.
Em entrevista ao Público e Rádio Renascença, Pedro Filipe Soares explica “as cativações são um meio de controlar a execução orçamental. Sempre existiram, o que este Governo fez foi uma dupla cativação: as que estavam previstas no OE e, para juntar a estas, as que vieram do decreto de lei de execução orçamental. O OE sai da Assembleia e depois, por sua iniciativa, o Governo fez um decreto ainda mais draconiano no que toca a cativações”.
O que dissemos ao Governo é que ficámos desconfortáveis com o Governo ter feito uma execução orçamental para a qual não tinha mandato político. Não tinha mandato para fazer cativações deste nível”.
O líder parlamentar do BE continua: “Uma segunda questão é se consideramos que as cativações devem acabar. Elas devem existir. Mas devem ser limitadas, claramente. Agora, o problema político fundamental é que as cativações, fruto da paranoia do défice que há neste país, funcionam como resposta ao medo. Quando o que sempre dissemos era que devia haver confiança neste caminho. 2016 provou isso. Se tivéssemos tido confiança, não precisávamos de cativações como as que foram feitas, não precisávamos sequer de ter feito o perdão fiscal. Tudo isso existiu, porque se estava a instalar o pânico de não ser alcançada a meta de défice. Se este ano não aprendemos nada com o ano passado, então vamos fazer os mesmos erros”.
Já dissemos ao Governo com toda a transparência que esta forma de fazer cativações… ter um défice para Bruxelas ver, para depois termos problemas no país, não é aquilo que aceitamos. E se Centeno quer ser o Ronaldo do Ecofin à custa das cativações dos serviços… Não é o modelo que consideramos aceitável”
“Não há aqui cheques em branco para ninguém”, diz Pedro Filipe Soares, lamentando que a negociação para o próximo Orçamento do Estado esteja mais atrasada do que no ano passado. O Bloco de Esquerda não está satisfeito com o decurso dos trabalhos: “O que esperamos é que haja da parte do Governo mais informação do que aquela que temos tido. Quer informação para estudarmos, quer opinião — porque muitas vezes o que nos tem sido apresentado são ideias genéricas que já ouvimos publicamente, mas sem o concreto de um projeto legislativo”.
Mas isso significa que o apoio parlamentar pode estar em risco? “Estamos disponíveis para dialogar, mas essa disponibilidade para dialogar é com base nas premissas já estabelecidas. Se elas forem sendo cumpridas, se existir esse diálogo, não há motivos para que não chegue ao final da legislatura”, diz Pedro Filipe Soares.
Nos fogos, “há um problema comunicacional no Governo”
No problema dos fogos, o Bloco de Esquerda concorda que “há responsabilidades de governos, há, de muitos governos”. Quanto ao partido liderado por Catarina Martins, “infelizmente tínhamos alertado para a necessidade de preparar o país para as alterações climáticas, quer no que toca ao ordenamento quer à limitação de espécies, e de ter uma forma de pensar a Proteção Civil garantindo que isso representasse um aumento da capacidade no terreno”.
O Bloco de Esquerda critica a atuação do PSD — “o PSD não era um partido que cometesse, noutros tempos, um erro destes” — mas reconhece que “há aqui, em primeiro lugar, um problema comunicacional do Governo”. Um “problema comunicacional” que “tem sido aproveitado pelo PSD e pelo CDS, não para ajudar a qualquer discussão, mas para criar ainda mais confusão”.
Avaliaremos o processo ao longo dos acontecimentos, na expectativa de que eles não sejam graves. E depois faremos uma análise política.”
Quanto às falhas do SIRESP, Pedro Filipe Soares diz que o Bloco de Esquerda “exigiu que o Estado assumisse o sistema. O Governo não quis, acompanhado pela direita. Sempre dissemos que este é um governo do PS, as nossas escolhas seriam diferentes. Mas nestas matérias esperávamos ter uma abertura e um diálogo diferente, isso era desejável para o país”.