As portas do Salão Automóvel de Frankfurt, o maior a nível europeu, abrem-se já amanhã para a comunicação social. Mas as marcas Alfa Romeo, DS, Fiat, Infiniti, Jeep, Peugeot, Mitsubishi, Nissan e Volvo não vão marcar presença neste que é um dos maiores certames mundiais na área automóvel.

No conjunto, os construtores em falta representam 20% das vendas europeias. Então, porque optam por não ir a um evento que, de acordo com a própria organização, tem uma cobertura mediática como nenhuma outra feira do género? Em Frankfurt são aguardados mais de 10 mil jornalistas, de mais de uma centena de países, para reportar as mais de 300 estreias previstas, entre veículos e soluções tecnológicas.

À presença nos meios de comunicação social há que somar ainda a possibilidade de as marcas comunicarem directamente com o cliente, já que entre os dias 14 e 24 de Setembro as portas se abrem para o público em geral. Ora, em 2015, passaram por essas portas 931.700 pessoas, mais 50 mil do que em 2013. Um número expressivo de visitantes com os quais é possível contactar no certame. Voltamos à questão: então porque é que nove construtores – e estamos a falar de marcas com dimensão e novos produtos, como a Peugeot, Nissan ou a Volvo – não põem os pés na feira germânica?

A Nissan tem no novo Leaf um dos seus mais importantes produtos, ou não fosse este o eléctrico mais vendido no mundo. E, no entanto, não vai viajar até á Alemanha

Não há uma explicação, mas sim duas. A primeira residirá no forte investimento que é necessário efectuar para garantir espaço expositivo. Ao que o Observador apurou, em média, uma marca generalista tem de desembolsar entre 3 a 4 milhões de euros para garantir um stand. O valor varia consoante a área, o formato e a tecnologia contratados.

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Para se ter uma ideia, mesmo falando em construtores generalistas, o investimento num salão pode orçar entre 8 e 10 milhões de euros. Será potencialmente o caso de uma Volkswagen, por exemplo, que reserva habitualmente – e este ano não é excepção – uma das áreas mais generosas do Salão de Frankfurt, para todas as marcas do grupo. Aliás, em termos de espaço e de localização privilegiada, a Volkswagen só será batida por outra marca germânica – a Mercedes.

O espaço reservado às marcas da Daimler, com ênfase na Mercedes, em 2015

É a própria Daimler que, em comunicado, faz saber que a Mercedes-Benz terá uma das maiores áreas de exposição em Frankfurt, na qual cerca de 400 funcionários têm vindo a trabalhar nos últimos dois meses, e que abarca mais de 11 mil metros quadrados. De um total de cerca de 200 mil metros quadrados, segundo a organização. Ou seja, 5,5% da área disponível, com a restante a ser dividida por … um milhar de expositores e mais de 50 construtores automóveis. Face a estes números, a pergunta não poderia deixar de ser esta: quanto gastará a Mercedes numa operação destas? A marca não divulga valores de investimento, preferindo concentrar-se em curiosidades como o facto de o seu stand ter exigido mais de 970 toneladas de aço, cerca de 250 quilómetros de cabos e cerca de 6.000 luzes… Contudo, não será difícil extrapolar para um número superior a uma dezena de milhões.

Voltemos aos números “base”, bitola pela qual alinharão a maior parte das marcas automóveis. Excluindo a cobertura mediática, que é valorizada de acordo com o órgão que divulga a informação e, como tal, impossível de calcular por nós, resta “recuperar” o investimento no contacto com o público. Ora, mesmo que os 900 mil visitantes passassem todos (o que obviamente não acontece) pelo stand de uma marca que investe 4 milhões, o custo por contacto seria de cerca de 4 euros.

Quantos visitantes acabarão por comprar um determinado carro só porque o viram em Frankfurt?

As marcas, naturalmente, fazem as suas próprias contas. E nove delas não entram nas contas da 67ª edição do Salão de Frankfurt. O que nos leva à segunda explicação: acentua-se a crescente tendência para escapar a investimentos em certames especializados, recorrendo às novas tecnologias. Ao contrário do que antes acontecia, agora os meios de comunicação digital têm um papel instantâneo na divulgação da informação, assumindo-se como plataformas privilegiadas para as marcas poderem comunicar, a custos muito (mas mesmo muito) inferiores e com um enorme potencial de alcance. Basta ao fabricante criar um mini evento e fazer um live streaming, que este é imediatamente difundido pelos órgãos de comunicação digitais, alargando como nunca antes o leque de potenciais contactos. Mais: colocando o leitor desses órgãos em igualdade de circunstâncias com (a maior parte de) os jornalistas – ambos tomam conhecimento das novidades exactamente ao mesmo tempo, sem direito a perguntas e respostas.

Para baralhar ainda mais as contas, outra questão. Quantos visitantes, mesmo, é que acabam por adquirir um veículo só porque o viram em Frankfurt? Um analista da IHS Markit, Ian Fletcher, coloca a seguinte dúvida:

Pergunto-me qual é a relação entre os visitantes do Salão de Frankfurt e o número de vendas que se formalizam nesses dias. Aposto que muitos clientes preferem fazer online a procura do carro que desejam.”

Os tradicionais certames de automóvel vão acabar por desaparecer? Talvez não. Mas lá que deverão reconfigurar-se nos próximos anos, de forma a tornarem-se mais rentáveis para as marcas e mais envolventes para o público, parece inevitável. Tão inevitável como os automóveis autónomos e conectados – não será de ânimo leve que este salão tem como tema o “Futuro agora” (Futur Now), tendo o Facebook como parceiro mundial da Nova Mobilidade. A que se juntam ainda tecnológicas como o Google, SAP, o gigante de chips Qualcomm, e também a BlaBlaCar, Harman, IBM, Kaspersky, Merck, NXP, Siemens, Sony, TomTom, Telekom… E a lista continua.