A conferência de imprensa de José Couceiro antes do segundo encontro na Luz em oito dias (na semana passada, perdera por 2-0 para a Taça de Portugal) prendeu atenções pela forma como o técnico resumiu a crua realidade dos sadinos durante a semana: segunda-feira, o clube festejou o aniversário; terça-feira, Fernando Oliveira demitiu-se da presidência por causa das forças de bloqueio que foi sentindo desde a reeleição; quinta-feira, quando a equipa tinha treino marcado no Jamor, ficou várias horas presa devido a um controlo anti-doping surpresa apenas com fruta e umas barras energéticas. Lesões à parte, houve esse pormenor de andar com a casa às costas…

Tudo isso pode ter influenciado o resultado desta noite, mas foi aquilo que o treinador sadino disse após o encontro da Taça que se tornou decisivo: por um lado, admitiu que um dos calcanhares de Aquiles da equipa era as bolas paradas defensivas; por outro, criticou a facilidade com que se dava cartões amarelos às equipas que jogavam contra os grandes. Ao intervalo, o Benfica ganhava por 2-0 com golos na sequência de um livre lateral e de um canto e o V. Setúbal estava reduzido a dez unidades por expulsão de Nuno Pinto, que ficara condicionado com um amarelo num lance onde não faz falta antes de ter uma entrada imprudente (no mínimo) sobre Luisão.

Mas mesmo que nada do que foi supracitado se tivesse passado, era provável, muito provável, que o Benfica viesse a ganhar. E porquê? Porque, parado (ou de bola parada), o campeão voltou a andar. E quando percebeu que podia voltar a andar, correu a sério e acelerou para um resultado largo, daqueles que aumentam a confiança na ressaca de mais uma desilusão europeia e em vésperas de jogo grande no Dragão. O adversário esteve numa noite típica de lei de Murphy, onde tudo o que podia correr mal correu pior, mas a exibição do Benfica foi arrasadora. E o 6-0 até acabou por ser um resultado curto para tudo o que se passou sobretudo na segunda parte.

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Ficha de jogo

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Benfica-V. Setúbal, 6-0

12.ª jornada da Primeira Liga

Estádio da Luz, em Lisboa

Árbitro: Luís Godinho (AF Évora)

Benfica: Bruno Varela; André Almeida, Luisão, Jardel, Grimaldo (Zivkovic, 60′); Fejsa (Samaris, 64′), Pizzi, Krovinovic; Salvio (Seferovic, 71′), Cervi e Jonas

Suplentes não utilizados: Svilar, Eliseu, Keaton Parks e Raúl Jiménez

Treinador: Rui Vitória

V. Setúbal: Cristiano; Arnold, Vasco Fernandes, Semedo, Nuno Pinto; Tomás Podstawski, André Sousa, Nenê Bonilha; João Amaral (Vasco Costa, 45′ e Pedro Pinto, 52′), Costinha e Gonçalo Paciência (Edinho, 68′)

Suplentes não utilizados: Trigueira, Pedrosa, Willyan e Alef

Treinador: José Couceiro

Golos: Luisão (7′), Jonas (39′ e 66′), Salvio (47′), André Almeida (68′) e Zivkovic (87′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Nuno Pinto (33′ e 45′), Grimaldo (45+1′) e André Almeida (90+2′); cartão vermelho por acumulação a Nuno Pinto (45′)

Rui Vitória apresentou uma surpresa em relação ao esperado e outra em relação ao que era apontado. Expliquemos: na baliza, o regresso à convocatória de Svilar não tirou Bruno Varela da titularidade, com o belga a ficar no banco de suplentes; na frente, e quando a imprensa especializada apontava toda para a dupla Jonas-Raúl Jiménez (com algumas hipóteses ainda para Seferovic, no lugar do mexicano), manteve-se o 4x3x3 com Jonas sozinho na frente e Krovinovic na dupla missão de ajudar Pizzi e Fejsa no meio-campo e apoiar o brasileiro na frente.

Mais do que nomes, o que contou mesmo foi a atitude. E num jogo com uma casa abaixo do esperado tratando-se de um compromisso a contar para a Primeira Liga (ser domingo à noite teve assim tanta influência ou o problema foi a derrota em Moscovo?), a entrada do Benfica conseguiu puxar pelos adeptos, que aplaudiam as zonas de pressão sobre o portador da bola e a intensidade na recuperação da bola. Aplaudiam, não ficavam radiantes. Mas também não demoraram até esse primeiro momento de êxtase que chegou com o golo de Luisão aos 7′.

Na sequência de um livre lateral apontado por Grimaldo no lado esquerdo do ataque, Jardel saltou mais alto ao segundo poste e assistiu para o lado contrário Luisão, que só teve de encostar na pequena área para o primeiro golo. Não é caso para fazer capas por ter sido um lance estudado que resultou (como já aconteceu recentemente), mas a verdade é que os encarnados tiveram o mérito de explorar a principal debilidade dos sadinos, tal como já tinha acontecido na Taça de Portugal. Com isso, Luisão estreou-se a marcar esta época (e já vão 15 sempre a marcar pelo menos um golo na Luz), quebrando um jejum de mais de dois anos na Primeira Liga.

O golo foi um calmante para o Benfica, daqueles que acalmam os nervos mas não tiram forças para continuar a cumprir a missão. E a missão, esta noite, era clara: dar uma prova inequívoca de que a equipa tem capacidade para muito mais do que tem feito até agora na presente época. Ainda assim, apesar desse controlo total do encontro, o lance de maior perigo após o golo de Luisão foi mesmo do V. Setúbal, com Costinha a rematar tão fraco que fez uma assistência para Gonçalo Paciência e que só não deu empate pela rápida intervenção de André Almeida (22′).

Foi uma questão de tempo até o Benfica ter mais um canto. No lado esquerdo, Grimaldo cruzou bem, Jardel cabeceou melhor mas a mão de Cristiano esteve acima de tudo, evitando com uma palmada para canto o golo (28′). E foi uma questão de tempo até o Benfica ter mais um canto. No lado direito, Pizzi cruzou bem, Jonas cabeceou melhor e a mão de Cristiano nada conseguiu fazer, com o brasileiro a apontar o centésimo golo de águia ao peito (39′). Só mudou o lado e os intérpretes, mas foi de bola parada que os encarnados voltaram a andar.

Ainda antes do intervalo, mais um problema para o V. Setúbal. E daqueles que não têm mesmo solução: tapado com um cartão amarelo que tinha motivado muitos protestos por parte dos sadinos (ficou a ideia que o lance com Salvio foi legal, a não ser que a admoestação tenha sido por protestos), Nuno Pinto teve uma entrada, no mínimo, imprudente sobre Luisão (que fez uma grande exibição, dando o exemplo aos companheiros até nas saídas com bola para o ataque) e acabou por ser expulso por acumulação.

Foi parado que o campeão voltou a andar. Depois, lembrou-se de como corria, naquele rolo compressor que lhe valeu um inédito tetracampeonato. É certo que o V. Setúbal, se dúvidas ainda existissem, teve tudo a correr ao contrário do que pensava, mas o Benfica, mesmo com mais um, nunca deixou o jogo entrar naquele ritmo que não aquece nem arrefece e chegou com naturalidade a uma goleada que ainda poderia ter chegado a outros números.

Logo nos primeiros sete minutos do segundo tempo, duas incidências. Ou as duas incidências que marcariam os restantes 40 minutos, contando com descontos: logo aos 47′, numa jogada de envolvimento que fez recordar a importância que Pizzi tem na equipa quando está inspirado, Salvio recebeu a assistência do internacional português e aumentou para 3-0; pouco depois, aos 52′, Vasco Costa, que tinha entrado ao intervalo para equilibrar os sadinos, teve de sair lesionado (e pelas queixas, pode ser um problema com alguma gravidade), dando lugar a Pedro Pinto.

A partir daí, deu para tudo. Ou porque os sadinos continuavam a perder bolas em zonas proibidas pela pressão do Benfica, ou porque os encarnados aceleravam e conseguiam com grande facilidade criar situações de golo. Bruno Varela foi um mero espetador a assistir em posição privilegiada ao avolumar da goleada. Houve o bis de Jonas aos 66′ (e que grande golo, aproveitando de primeira uma bola que andava a saltitar pela área), o segundo golo da temporada de André Almeida aos 68′ (em mais um lance azarado da defesa visitante, com o corte a ir parar aos pés do lateral que se limitou a encostar para a baliza) e um frango de Cristiano após remate de Zivkovic aos 87′ (deixou passar para as redes uma bola que ia fácil para segurar). Mas houve muitas mais oportunidades.

Com a maior goleada da temporada, o Benfica aproximou-se do FC Porto, ficando apenas a três pontos do líder da Primeira Liga em vésperas de clássico no Dragão (sexta-feira, dia 1 de dezembro, às 20h30). E a verdade é esta: apesar do início de temporada titubeante em termos internos e desastroso no plano europeu, o campeão depende de si para, no final da 13.ª jornada, liderar o Campeonato ou estar a um ponto do primeiro lugar (caso ganhe ao FC Porto e o Sporting também vença ao Belenenses). Não há nada decidido. Pelo contrário. Porque aquilo que os comandados de Rui Vitória mostraram esta noite é que os momentos decisivos ainda estão agora a começar.