O Bloco de Esquerda voltou a questionar o Governo sobre o que vai fazer para corrigir os ganhos recebidos pelas EDP ao abrigo dos contratos CMEC — Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual. As mais recentes perguntas enviadas esta quinta-feira surgem na sequência de pareceres pedidos ao Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República (PGR) pelo Executivo, e que foram homologados pelo secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches, já este ano.

Um dos pareceres da PGR defende que foram introduzidos novos factores para o cálculo das compensações a pagar à EDP depois do quadro legal deste regime aprovado em 2004. E como estas compensações, pagas pelos clientes da eletricidade, representam um tributo ou a uma contribuição especial a favor dos produtores de energia, deveriam ter sido aprovadas por lei. O que não aconteceu. Quando o regime dos CMEC foi aplicado aos contratos da EDP, os instrumentos que permitiram determinar o valor desse tributo não foram aprovados por lei, mas sim por despacho e por alterações contratuais que são atos administrativos. Logo, os despachos do Governo que deram luz verde aos pagamentos anuais dessas compensações são nulos, considera um dos pareceres.

É com base nestes pareceres que o deputado do Bloco de Esquerda, Jorge Costa, defende que o Governo tem margem legal para exigir à EDP a recuperação do que foi pago a mais, na sequência da passagem do anterior regime, os CAE, para os CMEC através das alterações contratuais introduzidas em 2007. Segundo o regulador, o regime dos CMEC custou mais 510 milhões de euros aos consumidores até 2017, mas como ainda há valores a pagar à elétrica, o montante final a exigir à EDP seria inferior. Essa diferença seria usada em benefício dos consumidores e dos preços da eletricidade. 

Em declarações ao Observador, o deputado remete para as contas divulgadas pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) no ano passado, que indicam que a lei dos CMEC gerou um custo acrescido de 510 milhões de euros para os consumidores de eletricidade. Um custo que é um ganho para a EDP. Esta é a fatura estimada pelo regulador da aplicação do regime dos CMEC em substituição dos contratos de aquisição de energia (CAE) que estavam em vigor em 2004.

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Para Jorge Costa, esta fatura deve ser considerada no ajustamento final dos valores dos CMEC, o que neste caso, poderia levar à devolução de dinheiro por parte da elétrica. A ERSE também apresentou no ano passado a conta do quanto a EDP terá direito a receber até ao fim do regime dos CMEC. E esse valor é inferior — 150 milhões de euros — ao que a empresa teria encaixado a mais no passado. O número da ERSE é contestado pela EDP, que reinvidica cerca de 250 milhões de euros, e tem de ser ainda validado pelo Governo, mas já foi incorporado no cálculo dos preços da eletricidade de 2018.

EDP. Consumidores pagaram mais 510 milhões após lei que fixou rendas

Os CMEC são o regime que permitiu compensar as centrais da EDP dos riscos de passar a vender a sua energia ao preço de mercado. O quadro legal dos CMEC foi definido em 2004, mas as decisões que definiram as condições da sua aplicação, e permitiram fazer as contas à compensação (renda) a pagar às centrais da EDP, foram aprovadas em 2007, e sem recorrer a uma lei, mas sim através de despacho e alterações contratuais. Foi com base nessas regras, que foram anualmente calculadas as compensações a pagar à elétrica pelos clientes da eletricidade (um custo que foi parar aos preços da energia). Essas compensações foram homologadas pelos Governos pelo menos até 2015, ou seja, até à chegada do atual secretário de Estado da Energia.

Para o conselho consultivo da PGR, o “despacho homologatório do montante do ajustamento anual dos CMEC configura um ato administrativo”. E no caso de o “ato homologatório considerar aspetos abrangidos pela matéria de reserva de lei, e que tenham inovatoriamente sido regulados nos acordos de cessação dos CAE, terá de ser considerado nulo por estar viciado de usurpação de poder”. O parecer defende ainda que “enquanto não tiver lugar a aprovação e a sua publicação no Diário da República (no quadro de uma lei), os acordos de cessação dos CAE e as suas adendas são ineficazes, não produzindo, pois, quaisquer efeitos”.

É com base nestas conclusões que o Bloco de Esquerda insiste no tema dos CMEC depois ter recebido respostas “evasivas” por parte da secretaria de Estado da Energia a perguntas anteriores sobre esta matéria.

Eis as novas perguntas:

  • Na sequência da homologação dos Pareceres 23/2017 e 24/2017, que medidas tomou o Governo para identificar os acordos de cessação dos CAE que padeçam do vício de nulidade ou de ineficácia?
  • Caso já tenha o Governo procedido a essa identificação, quais os montantes suportados pelos consumidores no âmbito dos acordos de cessação dos CAE cujo acto administrativo de aprovação venha a ser considerado nulo?
  • Neste quadro, e atendendo ao processo em curso de revisão e ajustamento dos CMEC, que medidas pretende o Governo adoptar para repor a legalidade e garantir a recuperação de eventuais montantes indevidamente pagos aos operadores e o ressarcimento dos consumidores que os suportaram?