Luís Marques Mendes acusa os partidos políticos de fazerem uma espécie de “pacto de silêncio” sobre os casos judiciais que envolvem ex-governantes, nomeadamente o ex-ministro socialista Manuel Pinho e o ex-primeiro-ministro José Sócrates. Uma semana depois de o caso de Manuel Pinho, que dá conta de que o ex-ministro deverá ter recebido cerca de dois milhões de euros do ‘saco azul’ do GES enquanto foi ministro do Governo de Sócrates, o comentador nota que só o PSD de Rui Rio se pronunciou sobre o caso — embora só o tenha feito este domingo, uma semana depois. “É muito grave este pacto de silêncio entre os partidos”, diz, acusando mesmo Rui Rio de ter estado “pessimamente mal” nestas matérias depois de ter sido eleito a prometer um “banho de ética” na política.
Segundo o ex-líder do PSD e agora comentador político, o silêncio é grave “porque estamos a falar de uma situação que nunca aconteceu em 44 anos de democracia”. E é “grave” da parte de todos: do BE e do PCP, porque “estão caladinhas, atados de pés e mãos, e se fosse com um ministro do Governo de Passos Coelho já tinha caído o carmo e a trindade”; do CDS, “porque deve ter dificuldades em falar sobre isto, não sei bem porquê”; do PS, que é “o caso mais grave”, porque nenhum dirigente se pronuncia sobre estes casos e apenas Arons de Carvalho, atual mandatário de António Costa na candidatura a mais dois anos à frente do PS, veio a público dizer que a justiça é que se deve pronunciar sobre o tema. Segundo Marques Mendes é também grave da parte do próprio Manuel Pinho, uma vez que “é inaceitável e inexplicável que ainda não tenha dito nada sobre o assunto”.
E é igualmente “grave” da parte do PSD, que “até hoje esteve pessimamente mal, mas que felizmente hoje quebrou o silêncio”. Para o comentador, Rui Rio tem aqui particular responsabilidade, na medida em que foi eleito a prometer “um banho de ética na política”. “Chegou à liderança prometendo um banho de ética e passou-lhe tudo ao lado. Fez tudo ao contrario do que prometeu: no caso de Feliciano Barreiras Duarte, em vez de o censurar, desculpou, antes houve Joana Marques Vidal, que em vez de apoiar, criticou. E sobre José Sócrates ainda não teve um minuto para isso, portanto dessa perspetiva o PSD funciona como muleta do PS”, diz.
Sobre o facto de Rui Rio ter falado este domingo sobre Manuel Pinho, anunciando que o PSD iria pedir para o ouvir no Parlamento, Marques Mendes compara Rio a um navio em alto mar a fazer uma manobra. “É como um navio em alto mar que leva uma eternidade a fazer uma manobra, ele leva um eternidade a ter uma reação”, ironizou.
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Ainda sobre estes casos judiciais, o comentador político afirma que é preciso separar a lei da ética, mas não desvalorizar uma nem outra. “Este silêncio é grave porque estamos a falar de política e ética. Em democracia a ética nao é a lei, a ética está para além da lei. Há comportamentos que podem ser legais mas são imorais, e um ministro ser avençado de um grupo económico é, independentemente da justiça funcionar ou não, é inaceitável. É tentar passar pelos pingos da chuva”, diz.
António Costa, o “agnóstico nos sentimentos e valores”
Sobre o Programa de Estabilidade, que foi discutido esta semana no Parlamento, Marques Mendes deixou também várias críticas às “cambalhotas políticas” de vários partidos. Primeiro, do Bloco de Esquerda, porque “quase fez um ultimato a Mário Centeno e andou três semanas quase a ameaçar que chumbava o Programa de Estabilidade, e depois acabou por voltar ao lado do PS contra aqueles que queriam o chumbo”. Depois, do CDS, que faz a “demagogia” e a “quadratura do círculo” ao dizer que quer reduzir o défice mas ao mesmo tempo quer baixar os impostos (que implica menos receita), e aumentar o investimento (que implica mais despesa): “é um milagre que só acontece quando se está na oposição”.
A terceira “cambalhota” foi do PSD, que disse que concordava com o objetivo do Governo de reduzir o défice mas discordava da forma de lá chegar. “Não disse que queria chumbar o PE mas depois foi votar a favor da proposta do CDS para o chumbar — mais uma cambalhota”, diz.
Já sobre a moção com que António Costa se vai apresentar ao congresso do PS dos próximos dias 26 e 27 de maio, Marques Mendes assinala três “omissões”: primeiro, Costa “não faz nenhuma referência aos aliados do Governo, quando na moção do Congresso anterior fazia mais de 20 referências ao BE e PCP”; depois, “não há nenhuma referência à Europa”; e, por fim, não fica definida na moção qual vai ser a estratégia eleitoral de António Costa. “Vai fazer tudo para ter uma maioria absoluta, mas se não tiver também não abre o jogo: não diz se faz um bloco central ou uma nova geringonça, e não o diz porque não quer perder um voto nem à esquerda, nem ao centro, nem à direita”, afirma.
“É António Costa a ser igual a si próprio: muito pragmático nas atitudes, mas agnóstico nos sentimentos e valores”, resume.