A primeira pergunta que se coloca é: porque é que uma marca portuguesa com um foco tão grande na tradição chama uma perfumista inglesa para criar cinco águas de colónia com o cheiro de Portugal? Até parece um contra-senso. Os tradicionalistas chamar-lhe-iam um atentado à pátria. Mas há uma lógica bem menos trágica por trás: nós não reconhecemos os nossos cheiros porque estamos demasiado habituados a eles.

Assim, dificilmente iríamos notar a que cheira o ar quando o céu no Alentejo fica nublado ou o perfume dos pinheiros da Comporta. Porque são aromas que já estão dentro de nós. É como a nossa casa. Para nós, não cheira a nada. Mas os outros conseguem identificar rapidamente esse cheio tão característico. Está nas nossas coisas, nos nossos casacos, nas nossas malas. É o nosso cheiro, por assim dizer.

Para explorar os 130 anos da casa Claus Porto, a marca convidou a perfumista Lyn Harris a descobrir aromas que conseguissem transmitir a beleza de Portugal. Uma viagem pelas paisagens aromáticas do nosso país perfumadas por florestas de pinheiros e pela brisa do mar, por cidades de granito, jardins tropicais no meio da cidade e campos de ervas queimadas pelo sol. É também uma viagem no tempo e nas memórias que os cheiros nos invocam. E uma viagem na história da Claus Porto enquanto marca criadora de aromas únicos que têm sobrevivido à passagem do tempo.

Mas, afinal, a que cheira o nosso Portugal?

Fotografias da viagem de Lyn Harris por Portugal. Foto: Claus Porto

Para celebrar os 130 anos, em 2017, a Claus Porto criou o Le Parfum – um perfume numerado de edição limitada que literalmente cheirava a Portugal. Mas o bichinho ficou lá. O bichinho de que se podia fazer algo mais. “A verdade é que ficou imensa coisa de fora. Imensas paisagens, lugares, momentos e aromas. Uma das questões que mais nos colocam é o porquê de uma marca tão orgulhosamente portuguesa ter uma perfumista estrangeira. Mas foi quando a Lyn voltou da sua viagem que percebemos que só poderia ser mesmo assim: veio fascinada com aromas que nós nem sequer damos por eles – os pinheiros, os eucaliptos, as laranjas e os limões amadurecidos pelo sol e até da própria maresia. Foram esses aromas que lhe ficaram na memória e que deram origem à coleção Águas de Colónia”, diz Anne-Margreet Honing, diretora criativa da Claus Porto, ao Observador.

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Esta coleção tem cinco águas de colónia que correspondem a cinco zonas do nosso país e às sensações e emoções que despertam. Para Lyn Harris “traduzem diferentes facetas do país que, de alguma forma, parecem representar a beleza de Portugal e, ao mesmo tempo, cumprem a linguagem olfativa da Claus Porto”, explica a perfumista. Durante a sua viagem, Lyn foi inspirada pela beleza única, pela natureza, as pessoas, a comida e a arquitetura de Portugal. E refere várias coisas que lhe ficaram na memória: o cheiro do verão cítrico, as videiras, a terra misturada com ervas secas, as figueiras verdes cintilantes carregadas de frutos maduros, os variados cipestres, cedros e pinheiros a delinear a paisagem e até a água e a humidade que estavam constantemente no ar.

“Eu sou como uma esponja e absorvo tudo desde os objetos vivos a edifícios, azulejos, a paisagem em constante mudança… Tudo isto capturou profundamente os meus sentidos. Quando estive na Comporta, adormeci a cheirar os pinheiros e esta foi uma experiência verdadeiramente memorável que partilhei de muitas maneiras diferentes nestas águas de colónia”, conclui Lyn.

A água de colónia Vetiver e o Alentejo

No verão, o nosso Alentejo coze sob um sol implacável. Mas o que mais chamou a atenção de Lyn foi o raro momento em que as nuvens se misturam com a brisa do mar distante e criam uma súbita mudança no ar: um dia nublado sobre as planícies do Alentejo. “Tínhamos guiado uma série de horas, o ar estava a mudar e estava um clima diferente. Havia humidade mas estava tudo tão seco ao mesmo tempo. Tudo isto contribuiu para o espírito desta fragrância e para aquilo que o vetiver pode ser”, explica Lyn.

Porquê vetiver? “Porque é um ingrediente que tem muita força e carácter e senti que havia uma afinidade entre esta matéria-prima e a força que o povo português tem em tantos aspetos na sua cultura. E o vetiver pode ser tantas coisas, pode ser seco, pode ser húmido. Exatamente como a memória que tenho do Alentejo.”

Assim, a Água de Colónia #1 tem bergamota, lavanda e gálbano combinados com vetiver e agulha de pinheiro com um toque de eucalipto e musgo marinho. “Sinto que em Portugal o mar nunca está longe, mesmo quando está. Mas é possível senti-lo através do vento, pelo que pensei que esse musgo marinho traria uma nota muito interessante para o vetiver. E nunca usei essa nota com vetiver antes”, acrescenta Lyn.

A água de colónia #1 Vetiver. Foto: Claus Porto

A água de colónia Geranium e o coração de Lisboa

Na capital, Lyn ficou encantada com o Jardim Botânico, uma ilha de flora tropical rodeada pela cidade. “Existem jardins botânicos em todas as cidades com coisas provenientes de todo o mundo… acho isto sempre fascinante, mas aqui podemos ver Lisboa inteira a partir deste lugar maravilhoso”, explica a perfumista.

E no nosso Jardim Botânico, Lyn teve uma forte ligação com as várias espécies de gerânio. Sentiu que era uma espécie de lado inglês de Portugal e quis capturar isso. E sendo a tradição tão importante para nós e o gerânio um ingrediente bastante tradicional, a perfumista sentiu que essa união representa de uma forma moderna Lisboa.

A Água de Colónia #2 tem, assim, bergamota, lavanda e raiz de angélica com um coração de folhas de gerânio, pétalas de rosa e cravinho, com um toque de vetiver, musgo e almíscar. Um aroma tropical que veste bem com as cidades.

A água de colónia #2 Geranium. Foto: Claus Porto

A água de colónia Fougère e a península de Troia

Houve três coisas que ficaram na memória de Lyn: o surf no Atlântico, as praias sem fim e as florestas de pinheiros. Coisas para nós se calhar tão banais. “Os pinhais à beira mar são uma memória inesquecível. Lembro-me de termos saído do barco e de termos pegado no carro logo a seguir. A estrada era paralela ao mar, ladeada por pinheiros, tão bonita e elegante. E depois havia a aridez da areia que a rodeava. Era tão contrastante, o aroma do mar e das ervas secas a alimentar a beleza dos pinhais”, partilha a perfumista.

E os pinhais tiveram um grande impacto em Lyn nesta viagem por Portugal – foi a primeira vez que a perfumista compreendeu o pinheiro na sua forma mais pura. Daí ser o ingrediente mais importante desta fragrância que, ainda assim, “pode ser muito antiquado” como explica. Lyn modernizou-o com notas verdes e pimenta, algumas notas apimentadas transparentes e cedro.

Assim, a Água de Colónia #3 tem agulha de pinheiro, gálbano e gerânio com um coração de jasmim transparente combinado com pimenta sendo, talvez, o aroma mais masculino de toda a linha.

A água de colónia #3 Fougère. Foto: Claus Porto

A água de colónia Clementina e o Rio Douro

O Douro é mais conhecido pelas vinhas que se erguem das suas margens mas não foi isso que arrebatou a perfumista na sua viagem no final do verão. Foram, sim, as árvores de citrinos que enfeitam os jardins das grandes propriedades. Lyn apaixonou-se pelos limoeiros tão grandes ao por do sol e quando voltou novamente em janeiro e comeu um saco de tangerinas percebeu que era isto que, para ela, evocava o Douro.

“Quis criar uma fragrância feliz, positiva e cítrica para a Claus Porto, que fosse moderna e ao mesmo tempo recriasse diferentes aspetos de Portugal, dos limoeiros ao por do sol e às laranjeiras”, explica, acrescentando que nunca teria associado Portugal a essas belas árvores cítricas que significam tanta riqueza num país tão bonito, como nosso.

A sua composição? É simples. A Água de Colónia #4 tem bergamota, limão, toranja e casca de tangerina combinada com lavanda, tão característica das paisagens portuguesas, com um toque de flor de laranjeira para lembrar o verão. E eis uma fragrância fresca e cítrica para usar todo o ano.

A água de colónia #4 Clementina. Foto: Claus Porto

A água de colónia Porto e, claro, a Invicta à beira mar

Nesta coleção não podia faltar a fragrância da cidade natal da Claus Porto e algumas características que apaixonaram Lyn: as pedras centenárias, a flora silvestre e o perfume sempre presente do mar. “O Porto tocou-me profundamente. Fiquei imensamente impressionada com a sua beleza, com as suas imperfeições que vieram comigo e me deram vontade de voltar. Foi a autenticidade da cidade. Era capaz de estar numa rua e de ir dar a um beco sem saída onde havia um prédio abandonado, mas a beleza desse prédio era imensa”, partilhou.

Mas além dos aspetos citadinos, houve pormenores que Lyn não esquece: “Encontrar limoeiros e árvores de citrinos selvagens e depois a humidade que lá estava foi tudo bastante intenso. Tem imenso carácter. É tão vibrante, a cidade. E deparei-me com imensos cedros maravilhosos. Isso foi extremamente importante no caso do zimbro. E depois há o musgo marinho, claro, porque sentir o mar tão perto da cidade foi absolutamente único para mim.”

A Água de Colónia #5 é inspirada na cidade do Porto e tem bergamota, limão e laranja combinados com gálbano, cipestre e zimbro, numa colónia com brisa marinha graças à base de musgo marinho.

A água de colónia #4 Porto. Foto: Claus Porto

Cinco perfumes que cheiram a “nós”. E agora?

Em 2017, a Claus Porto celebrou 130 anos de história e provou estar a envelhecer em beleza e a saber reinventar-se neste novo mundo moderno, como escrevemos neste artigo o ano passado. Esta celebração teve direito à abertura das primeiras lojas de marca própria em Lisboa e Porto, com o lançamento em Paris de um perfume de edição limitada criado por Lyn Harris  e com a publicação de um livro premiado que narra a história da marca.

Estas cinco Águas de Colónia representam a continuação da tradição de perfumaria de 130 anos da Claus Porto porque, como nos explica Anne-Margreet Honing, a marca é conhecida sobretudo pelos sabonetes mas a verdade é que a casa Claus Porto tem um extenso historial em termos de perfumaria, o qual a marca quer continuar a desenvolver com Portugal sempre como pano de fundo.

As cinco Águas de Colónia. Foto: Claus Porto

E agora? O que há mais para contar? “Queremos prosseguir com esta viagem, quem sabe não existem ainda capítulos por escrever, sítios por visitar, aromas por desvendar? Mas queremos estar cada vez mais presentes em vários aspetos da vida dos nossos consumidores como uma marca de lifestyle e reforçar a nossa presença internacional, de forma a levar aquilo que de melher se faz em Portugal ao mundo”, partilha a diretora com o Observador.

Nome: Águas de Colónia da Claus Porto
Data: 2018
Pontos de venda: loja online e lojas de Lisboa e Porto.
Preços: 85€

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