Em fevereiro o GAIP usava como exemplo num post do Facebook um estudo sueco que concluía que as crianças que vivem em regime de guarda compartilhada tinham mais estabilidade e menos queixas psicológicas do que as que vivem em regime de monoparentalidade. Cinco meses depois, a mesma associação assina a carta aberta que defende que a residência alternada “contribui para o aumento da conflitualidade e para a instabilidade psicológica das crianças”.

Na terça-feira, deu entrada na Assembleia a petição que pretende que a guarda partilhada seja o regime preferencial em caso de divórcio ou separação. Até há data existem 23 associações, que assinam uma carta aberta, que se opõem à premissa da petição. O GAIP – Associação de Apoio e Intervenção em Psicologia foi das últimas a assinar o documento. O problema é que uma das justificações na carta aberta, e que envolve também um estudo sueco, é contraditória com o que o GAIP disse publicamente há cinco meses.

Residência alternada. Petição a ser entregue na Assembleia enfrenta oposição de 23 associações

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Entre os motivos apresentados na carta aberta, lê-se que, à exceção de nove parâmetros previamente descritos, como a ausência geográfica e a estabilidade financeira de ambos os pais, “a residência alternada é desaconselhada, por perniciosa, contribuindo para o aumento da conflitualidade e para a instabilidade psicológica das crianças” e que a “investigação demonstra que a guarda conjunta física e a residência alternada têm efeitos prejudiciais para as crianças nas famílias com elevada conflitualidade e não promovem a cooperação dos pais e mães”. Essas e outras justificações podem ser lidas na íntegra aqui.

A 20 de fevereiro, a GAIP publicou uma opinião aparentemente contrária à que está subscrita na carta aberta, que se opõe à presunção jurídica da residência alternada. Num post publicado na respetiva página de Facebook, a associação faz campanha pela guarda partilhada: “De forma a garantir o bem-estar e pleno desenvolvimento do/a seu/sua filho/a, é possível, necessário e imprescindível superar os desafios da coparentalidade e da guarda compartilhada através de uma relação e interação cordial, consistente e respeitosa entre progenitores/as”.

© Facebook GAIP

No respetivo post, lê-se que “cada família é única, possui a sua própria história e dinâmica” e que há formas, estratégias e recursos “promotores e facilitadores do entendimento entre as partes, da proteção dos direitos e do bem-estar das crianças”. A associação continua o argumento citando um estudo sueco, noticiado no jornal Expresso: “Da Suécia chegam-nos ecos que confirmam os benefícios da ‘residência partilhada’ para os filhos de pais separados. Mais de 40 estudos compararam crianças a viver neste regime com crianças a viver primordialmente com um dos pais”. 

A carta aberta também se refere a um estudo sueco citado na petição inicial: “A associação promotora da petição em causa utiliza como argumento um estudo sueco, mas não refere que a Suécia não criou nenhuma presunção jurídica semelhante, como também a maioria dos países europeus não o fez. Nem explica que a nossa realidade é diferente da sueca, onde apenas existem 2% de divórcios litigiosos, sendo os restantes 98% acordos parentais assinados fora dos tribunais”.

No post, o GAIP continua a fazer referência ao mesmo estudo, citando o jornal Expresso, enfatizando as conclusões da investigação sueca:

Uma investigação em particular analisou o bem-estar psicológico de 4684 crianças, liderada pela equipa de Emma Fransson na Universidade de Estocolmo e no Instituto Karolinska, concluiu que as crianças que viviam neste regime apresentavam o mesmo nível de queixas psicológicas do que as que viviam em famílias nucleares. Pelo contrário, os filhos que viviam com apenas um dos pais mostravam níveis mais elevados de queixas psicológicas. A conclusão foi bastante clara: as crianças beneficiam de ter dois pais interessados e preocupados com eles, e a residência alternada propicia isso.

Não se percebe se em causa está uma mudança de posição ou se existem outros motivos que levaram o GAIP a assinar a carta aberta. Ao Observador, a associação apenas afirmou que as posição tomadas face à carta aberta e nas redes sociais “são públicas”. Até ao momento, o GAIP não quis prestar mais declarações.