O Partido dos Trabalhadores (PT) brasileiro anunciou na noite de domingo o nome de Fernando Haddad para candidato à vice-presidência de Luiz Inácio Lula da Silva e provável substituto para Lula caso este seja proibido de se candidatar, por estar atualmente preso. O Partido anunciou ainda um acordo pré-eleitoral com o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) que deixa a líder Manuela d’Ávila como candidata efetiva à vice-presidência.

A estratégia delineada pelo PT para estas eleições é complexa, devido ao facto de Lula poder ser impedido de concorrer. Assim, Haddad será para já protagonista da campanha até haver uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre o caso do antigo Presidente do Brasil. Se Lula for autorizado a concorrer, Haddad afasta-se e Manuela assume o lugar de candidata a vice-presidente; se Lula for impedido — o que parece ser o cenário mais provável — Haddad seguirá como candidato a Presidente, secundado pela líder do PCdoB, Manuela D’Ávila.

“Decidimos em conjunto, PT e PCdoB, colocar neste momento, como candidato a vice-Presidente da República, para fazer a representação do presidente Lula durante esse processo tão longo [até que] se estabilize a situação dele”, anunciou a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, sobre a escolha de Haddad. Para além disso, explicou Hoffman, o próprio Lula “pediu para fazer um pedido formal a Manuela [d’Ávila] para ser candidata a vice“.

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A estratégia está inteiramente condicionada pela possível proibição de Lula ser candidato, caso o  TSE entenda que a Lei da Ficha Limpa impede um político condenado em segunda instância de concorrer a eleições.

“Definimos que até à regularização da situação judicial do Presidente, a vocalização da sua campanha seria feita por um companheiro do PT, pela proximidade desse companheiro com o presidente, mas também pela identificação do partido com Lula”, explicou a presidente do PT, citada pela Globo.

A decisão de nomear desde já Haddad e também D’Ávila deixa antever que o PT se está a preparar para substituir Lula se for obrigado a fazê-lo e a não contestar a decisão judicial. Isso mesmo explica a edição brasileira do El País, que garante que o PT provavelmente não irá “flirtar demasiado com o abismo legal”: a prova, escreve o jornal, é o facto de o partido ter seguido a recomendação do TSE de apresentar os seus candidatos até esta segunda-feira e não ter esperado até 15 de agosto, data que o PT considerava o limite legal.

O PT opta assim por ir buscar um fiel do partido, mais moderado, para substituir Lula, em vez de dar o lugar a um nome mais à esquerda como a própria Manuela D’Ávila. Haddad foi ministro do próprio Lula e também do Governo de Dilma Rousseff, tendo tido a pasta da Educação de 2005 a 2012. No cargo, Haddad aumentou o investimento público na educação e alargou o acesso ao ensino superior. Depois do Governo, o licenciado em Economia concorreu à prefeitura de São Paulo, tendo sido presidente da câmara da cidade até 2016 — altura em que perdeu a reeleição para João Doria, do PSDB.

E depois de Lula? À procura de uma resposta, a esquerda brasileira entra em guerra

A seu favor tem o facto de não estar associado a nenhum dos escândalos de corrupção que abalam o PT, mas Haddad não parece ser um nome que mobilize as massas — segundo a BBC Brasil, reúne apenas 1% das intenções de voto. Resta saber se, com Lula fora da corrida, os votos para o ex-Presidente seriam transferidos em bloco para o antigo prefeito de São Paulo. “Esse potencial de transferência é uma incógnita. A tarefa fica mais difícil com Lula preso”, explicou à BBC Geraldo Tadeu Monteiro, coordenador do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas sobre a Democracia, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

A dificultar a tarefa a Haddad está o facto de a esquerda não estar toda unida em torno de uma candidatura do PT, nem sequer com Lula na lista. A dividir o eleitorado está a candidatura de Ciro Gomes, ex-ministro de Lula, candidato do Partido Democrático Trabalhista (PDT). O PT, contudo, conseguiu fragilizar a candidatura de Ciro ao fazer acordos regionais com o Partido Socialista Brasileiro (PSB), em troca de este se manter neutral na corrida presidencial e não apoiar Ciro.

Do lado oposto, o centro está unido em torno de Geraldo Alckmin, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSD). Mas a grande força à direita é Jair Bolsonaro, do Partido Social Liberal (PSL), candidato radical com ideias próximas da extrema-direita que aparece em segundo lugar nas sondagens, apenas atrás de Lula da Silva. A dificultar-lhe a vida tem o facto de não ter conseguido qualquer aliança com um grande partido, o que lhe reduzirá em muito o tempo de antena na televisão, por exemplo. Resta saber se, com Haddad à frente da candidatura do PT, Bolsonaro mantém liderança ou fica para trás.