Ponto prévio: as bolas paradas são cada vez mais preponderantes no desfecho de um jogo de futebol. Pontapés de livre estudados ao pormenor ou cantos desenhados com régua e esquadro são praticados vezes sem conta nas sessões de treino de qualquer clube profissional. Até as grandes penalidades, erradamente definidas como lotaria ou fruto da sorte ou do azar, são treinadas e aperfeiçoadas até ao limite da exaustão. Mas, em toda esta panóplia de lances estratégicos, existe uma lacuna por preencher. Ou existia, até agora: os lançamentos de linha lateral.

Quantas equipas conhece que têm reposições de bola com a mão preparadas para apanhar o adversário em contrapé? E quantas costumam marcar golos originados por lançamentos laterais? Se pensou em nenhuma, não está longe da verdade. Mas da Premier League sopram ventos de mudança e o Liverpool, comandado pelo carismático Jurgen Klopp, parece estar na primeira linha da inovação — os reds contrataram Thomas Gronnemark, detentor do recorde de lançamento mais longo (51.33 metros), para treinador de lançamentos laterais do plantel principal e da formação.

[O lançamento com que Thomas Gronnemark bateu o recorde do mundo]

O dinamarquês de 42 anos, para além de recordista do Guiness, é também um confesso entusiasta da arte de repor a bola em jogo com as mãos, viajando pela Europa a espalhar a sua filosofia pelas organizações desportivas. Schalke 04 e Hertha de Berlim foram alguns dos clubes que aceitaram contar com a ajuda deste especialista, que viu o seu trabalho merecer destaque ao serviço dos dinamarqueses do FC Midtjylland, com dez golos apontados na temporada passada na sequência de lançamentos laterais. No mesmo período de tempo, todas as equipas da Premier League conseguiram… um golo.

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“Penso em lançamentos todo o dia. Faço isto nos últimos 15 anos porque sou apaixonado por reposições de bola”, confessou o dinamarquês ao The Wall Street Journal, continuando: “Demasiadas pessoas aceitam que, se um lançamento não dá em nada, é porque não foi feito para tal”.

Jurgen Klopp é uma das figuras mais carismáticas do futebol internacional e confesso adepto de métodos de treino pouco convencionais (Créditos: Getty Images)

E Thomas Gronnemark não podia estar mais em desacordo. Para este pioneiro, os lançamentos são toda uma ciência: se os jogadores se posicionarem de acordo com as suas indicações, podem dar origem a contra-ataques mortíferos, alívios de pressão ou até mesmo cruzamentos diretos para golo.

E, pensando especificamente no estilo de jogo do Liverpool de Klopp, Thomas já garantiu que, para além de ensinar os atletas a lançar a bola a uma distância superior, consegue ainda levá-los a realizar lançamentos “rápidos e inteligentes” que privilegiem a posse de bola orientada para uma situação de ataque organizado.

Rory Delap foi a principal arma do Stoke City durante cinco épocas, com os seus lançamentos laterais a valerem cinco golos aos Potters (Créditos: Getty Images)

O uso dos lançamentos laterais como arma de ataque à baliza adversária não é comum, mas também não é inédito. Respondendo às questões colocadas no início do texto, o Stoke City surge como a principal equipa a usufruir destes lances estratégicos para real benefício próprio.

Entre 2009 e 2014, os Potters contaram com Rory Delap no seu plantel e uma nova realidade ganhou forma na estratégia da equipa: o médio conseguia lançar a bola a uma distância verdadeiramente longa e, com isso, criar autênticos passes para golo com a mão. Dos seus lançamentos surgiram 15 golos marcados pelo Stoke City e uma fama que nunca mais o largou.

[Uma compilação dos longos lançamentos laterais de Rory Delap ao serviço do Stoke City]

Quatro anos mais tarde, o Liverpool de Klopp parece decidido a apostar na mesma arma e conta com a experiência de Thomas Gronnemark para aperfeiçoar a arte dos lançamentos laterais. Por cerca de cem euros, o dinamarquês partilha com qualquer pessoa o seu segredo através de vídeos publicados no seu website; por um valor ligeiramente superior, desloca-se a um clube para, pessoalmente, ensinar as suas técnicas.

Não se sabe ao certo quanto o dinamarquês estará a ganhar no Liverpool (a sua função é desempenhada em part-time), mas o apreço de Klopp, esse, o recordista do Guinesse já o conquistou. “Quando ouvi falar do Thomas, tive a certeza de que o queria conhecer. Quando o conheci, fiquei 100% certo de que o queria contratar”, atira o técnico alemão.