O antigo diretor do museu de Serralves já reagiu à conferência de imprensa do conselho de administração, que decorreu esta manhã. Através de um comunicado intitulado “Verdade e Liberdade”, enviado para a comunicação social e que pode ler na íntegra no final deste artigo, João Ribas nega as alegações desta manhã da presidente da fundação de Serralves, Ana Pinho, que disse que a decisão de não incluir 20 obras na exposição dedicada ao fotógrafo norte-americano Robert Mapplethorpe foi iniciativa do antigo diretor.
A exposição deveria conter 179 obras, como estava previsto. No entanto, as referidas interferências e restrições levaram a uma redução para 161. No dia da inauguração, a curadoria foi mais uma vez intimada a retirar duas obras que já se encontravam expostas”, revela João Ribas.
Além de afirmar que “não é admissível que a liberdade e a autonomia do diretor sejam desrespeitadas”, o antigo diretor do Museu de Serralves reitera que lhe foram impostas “restrições e intervenções que criaram um ponto de rotura em termos de autonomia artística e de uma atividade de programação livre de intromissões ou repreensões”. Estas intromissões, que imputa ao conselho de administração da fundação, “interferiram de modo grave com a conceptualização expositiva, nomeadamente na semana de montagem” da exposição dedicada a Mapplethrorpe.
Para João Ribas, as interferências que sentiu “na exibição de determinadas obras e na localização de outras que ocorreram durante a semana de montagem” contribuíram “para uma descontextualização profunda, obrigando-me, enquanto curador, a alterar a seleção dos trabalhos para que a exposição fosse um todo coerente e para que, assim, se promovesse de modo adequado o conhecimento e o diálogo social protagonizados por Robert Mapplethorpe”.
Até ao limite, procurei manter a dignidade da exposição e fidelidade ao espírito da obra de Mapplethorpe, cumprindo todas as minhas funções”, aponta, acrescentando: “A exposição nunca foi concebida numa lógica proibicionista, o que não se traduz numa insensibilidade para com a comunidade: houve a preocupação de criar mecanismos que permitissem aos visitantes fazer escolhas.”
Face ao que diz ter sido uma “violação continuada da minha autonomia técnica e artística e do livre exercício das minhas funções”, o antigo diretor de Serralves sentiu que só lhe restava a demissão, porque “nenhuma exposição deve ser alvo de condicionamentos e imposições proibicionistas [e] nenhuma direção artística deve ser alvo de sistemáticas ingerências. Tomei uma decisão em defesa dos bons princípios de funcionamento institucional e em defesa da liberdade artística.”
Ana Pinho: “Em Serralves não há nem nunca houve censura. Não haverá complacência à falta de verdade”
Leia o comunicado na íntegra:
VERDADE E LIBERDADE
O cargo de Diretor do Museu de Serralves é incompatível com ingerências, pressões ou imposições que limitem a sua autonomia técnica e artística e se traduzam em comportamentos de inadmissível repreensão da livre expressão das obras de arte ou das mensagens, harmonia ou lógicas próprias com as quais o curador entenda dotar uma qualquer exposição, como a das obras de Robert Mapplethorpe. Não é admissível que a liberdade e a autonomia do Diretor sejam desrespeitadas.
Em 01 de Fevereiro deste ano, na sequência de concurso internacional, assumi a função de Diretor do Museu de Serralves, após vários anos como diretor-adjunto da mesma instituição.
Por ser uma função de elevada responsabilidade, partilho com a comunidade as razões fundamentais para este pedido de demissão:
1. Foram-me impostas, enquanto Diretor do Museu e no contexto da exposição “Robert Mapplethorpe: Pictures”, restrições e intervenções que criaram um ponto de rotura em termos de autonomia artística e de uma atividade de programação livre de intromissões ou repreensões. Tais restrições interferiram de modo grave com a conceptualização expositiva, nomeadamente na semana de montagem, que me obrigaram a sucessivas reorganizações da mesma. As interferências na exibição de determinadas obras e na localização de outras que ocorreram durante a semana de montagem, contribuíram para uma descontextualização profunda, obrigando-me, enquanto curador, a alterar a seleção dos trabalhos para que a exposição fosse um todo coerente e para que, assim, se promovesse de modo adequado o conhecimento e o diálogo social protagonizados por Robert Mapplethorpe.
A exposição deveria conter 179 obras, como estava previsto. No entanto, as referidas interferências e restrições levaram a uma redução para 161. No dia da inauguração, a curadoria foi mais uma vez intimada a retirar duas obras que já se encontravam expostas. Até ao limite, procurei manter a dignidade da exposição e fidelidade ao espírito da obra de Mapplethorpe, cumprindo todas as minhas funções.
2. A exposição nunca foi concebida numa lógica proibicionista, o que não se traduz numa insensibilidade para com a comunidade: houve a preocupação de criar mecanismos que permitissem aos visitantes fazer escolhas.
3. Face à violação continuada da minha autonomia técnica e artística e do livre exercício das minhas funções e, por respeito ao Museu de Serralves enquanto instituição de referência nacional e internacional, não me restou alternativa melhor e mais consentânea com a ética profissional que perfilho, senão a demissão de funções. Nenhuma exposição deve ser alvo de condicionamentos e imposições proibicionistas, nenhuma direção artística deve ser alvo de sistemáticas ingerências. Tomei uma decisão em defesa dos bons princípios de funcionamento institucional e em defesa da liberdade artística.
A minha demissão pretendeu ser uma mensagem dirigida à salvaguarda e reposição desses valores e princípios e à dignificação da Fundação e Museu de Serralves. Tal como o silêncio a que me remeti por estes dias.
Porém, têm sido divulgadas algumas falsidades e feitas imputações indevidas aos meus comportamentos profissionais, que sinto como calúnias e ofensas ao meu bom nome.
Não perdi nem se encontram diminuídas as qualidades que justificaram a minha colocação no cargo de Diretor.
Manifesto o meu reconhecimento, apreço e gratidão por todas as manifestações de solidariedade.
João Ribas