À medida que a segunda volta das eleições se aproxima e as sondagens tornam o favoritismo de Jair Bolsonaro cada vez mais sólido, a esquerda brasileira demonstra sinais de rutura entre as suas diferentes correntes. Foi isso que ficou demonstrado esta segunda-feira à noite, quando Cid Gomes, militante do PDT e irmão de Ciro Gomes, candidato por aquele partido que ficou em terceiro com 12,5% na primeira volta, entrou numa acesa troca de palavras com algumas das pessoas que foram ouvi-lo a um comício pró-Haddad.

Cid Gomes, que além de ter sido governador do Ceará exerceu também as funções de ministro da Educação durante pouco mais de mês e meio no último mandato de Dilma Rousseff, foi um dos convidados de honra a discursar no comício a favor do candidato do PT no Marina Park Hotel, em Brasília. O evento até podia ser de união, já que o ex-candidato Ciro Gomes declarou o seu apoio, mesmo que de forma tímida, a Fernando Haddad na segunda volta. No entanto, a maior parte das pessoas que ali se deslocaram não gostaram da mensagem do militante do PDT, pelo menos quando este falou da necessidade de um mea culpa do PT.

“Têm que fazer um mea culpa, têm que pedir desculpas, têm que ter humildade! Têm que ter humildade em reconhecer que fizeram muita besteira”, disse. Neste altura, já algumas pessoas da plateia expressavam discórdia. Virado para uma delas, Cid Gomes disse: “É assim? É? Pois tu vai perder a eleição”. E depois continuou: “Não admitiram os erros que cometeram. Isso é para perder a eleição e é bem feito!”.

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Cid Gomes, cujo irmão foi ministro das Finanças de Itamar Franco (entre 1994 e 1995) e da Integração Nacional no primeiro Governo de Lula (entre 2003 e 2006), não hesitou em ser bastante crítico do PT, que tem colecionado casos de corrupção ao longo da sua História recente — o mais mediático deles todos sendo aquele que levou a uma condenação de 12 anos e 1 mês de prisão ao seu fundador, Lula.

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“O teu tipo, que acha que fez tudo certo, quem junto com ele acha que fez tudo certo, vão! Pois vão, vão, vão, vão… e vão perder feio! Vão perder feio! Porque fizeram muita besteira. Porque aparelharam as repartições públicas porque acharam que eram donos de um país e o Brasil não aceita ter dono. O Brasil é um país democrático”, disse.

Nesta altura, os apupos era tantos que só por ter um microfone Cid Gomes conseguiu fazer-se ouvir. E, por isso, ainda deu para ouvi-lo falar de Bolsonaro, acusando o PT de ser o seu criador. “Quem criou o Bolsonaro foram essas figuras. Quem criou o Bolsonaro foram essas figuras que acham que são donos da verdade, que acham que podem fazer tudo, que acham que os fins justificam os meios”, disse.

Nesta altura, a plateia começou a gritar “olé, olé, olé, olá… Lula! Lula!”, como é costume nos comícios do PT. Cid Gomes voltou insurgir-se contra a plateia: “Lula o quê? Lula está preso, babaca! O Lula está preso! O Lula está preso! E vai fazer o quê? Babaca! Babaca! Isso é o PT! E o PT desse jeito merecer perder”.

Recorde-se que, no verão, Ciro Gomes chegou a oferecer-se para candidatar-se a estas eleições como o candidato de uma espécie de frente de esquerda, na qual o PT abdicaria de apresentar o seu candidato. O PT não só não aceitou o convite — mantendo até ao limite a candidatura de Lula, legalmente impedido de concorrer a um cargo público por estar preso, e só em meados de setembro lançando Fernando Haddad para a primeira linha — como tratou de fechar os caminhos por onde o PDT podia crescer. Essencial para esse fim foi a garantia por parte do PSB, outro partido da esquerda brasileira, de apoiar o candidato do PT e não do PDT.

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Antes da primeira volta, a grande parte das sondagens demonstrava que Ciro Gomes estaria bem colocado para, caso passasse à segunda volta, vencer contra Jair Bolsonaro. No entanto, a passagem do candidato do PDT ao segundo patamar das eleições nunca foi uma opção realista — fazendo assim lembrar quando, em 2016, as sondagens nos EUA diziam que Bernie Sanders consegueria vencer Donald Trump com mais facilidades do que Hillary Clinton.

Para a segunda volta, as sondagens continuam a apontar para o favoritismo de Jair Bolsonaro. Esta segunda-feira, a mais recente sondagem do Ibope apontou para uma vitória do candidato da extrema-direita com 52% dos votos, com Haddad a ficar-se apenas pelos 37%. A estas percentagens juntam-se ainda outras: 9% que dizem que vão votar nulo ou em branco e outros 2% que não souberam responder.

Os números tornam-se ainda mais díspares quando são analisados apenas os votos válidos. Nesse caso, Bolsonaro segue na frente com 59% e Haddad não passa dos 41%.