Os partidos mais à esquerda pediram uma nova votação das propostas de alteração ao Orçamento do Estado de 2019 a garantir a contagem integral do tempo de serviço dos professores, magistrados e forças de segurança para efeito de progressão na carreira, colocando pressão no PSD para mudar a sua votação e aprovar a proposta que o PS recusa. Mas a votação não foi diferente e a única garantia que o Orçamento vai ter é mesmo que o Governo é obrigado a voltar à mesa das negociações.
As propostas já tinham sido votadas durante a tarde de segunda-feira na comissão de Orçamento e Finanças, mas os partidos podiam pedir uma nova votação, desta vez em plenário, com todos os deputados e grupos parlamentares. Esta nova votação permitiu nova discussão do tema, ainda que mais curta, que Bloco de Esquerda, PCP e Os Verdes usaram para colocar pressão sobre o PSD, a única bancada com votos suficientes para aprovar as propostas da esquerda.
Ana Mesquita, do PCP, defendeu que os trabalhadores estariam mais bem servidos se a proposta dos comunistas tivesse sido aprovada na totalidade — a proposta garantia a recuperação do tempo de serviço por inteiro, no prazo máximo de sete anos. Mas rapidamente se virou para o PSD, dizendo que fica “clarinho como a água que o PSD e o CDS têm uma posição com os trabalhadores e uma diferente no Parlamento”. “O PCP não desiste da luta, seja no orçamento, em apreciação parlamentar, seja na rua ao lado dos trabalhadores, pela contagem integral do tempo de serviço”, garantiu a comunista.
Joana Mortágua, do Bloco de Esquerda, disse que o PSD se apresentou no Parlamento como o grande defensor destes trabalhadores e até como se os defendesse “melhor que os sindicatos”, mas que as suas promessas caíram em saco roto. “A montanha pariu um rato. O que nós queremos aqui apelar ao PSD é que reconheça que ontem cometeu um erro e que vote esta proposta do Bloco de Esquerda”, disse. A líder d’Os Verdes, Heloísa Apolónia, foi mais longe e disse que o “PSD foi completamente desmascarado em relação ao sentido de voto das propostas” e garantiu que ia continuar o trabalho, mas “com coerência e com lealdade”, numa alusão à posição do PSD.
À direita, o PSD defendeu a sua proposta dizendo que o Governo fez uma “grave violação” dos compromissos que assumiu com os professores e do que estava no orçamento deste ano, e que desrespeitou a letra e a norma que foi apresentada pelo próprio PS há cerca de um ano. Já o CDS criticou a forma como o Governo geriu o processo, disse que a norma aprovada é a melhor para dar ao Governo uma nova oportunidade para voltar a fazer esta negociação de forma justa, deixando no entanto críticas à falta de transparência nas contas relativas ao impacto da contagem integral do tempo de serviço dos professores e das restantes carreiras especiais da administração pública, contas que o partido diz que pedem há mais de um ano. “Queremos uma negociação justa, exequível, que não seja só uma promessa, e que seja sustentável a mais que um ano”, disse a deputada Ana Rita Bessa.
A defesa da posição do Governo e do PS foi feita pelo deputado socialista Porfírio Silva, que abriu a discussão. O socialista acusou os sindicatos de não se moverem “um milímetro” e de entrarem nas negociações à espera que o resultado final fosse que todas as suas exigências fossem satisfeitas. Para as propostas da esquerda, o deputado disse que “não faz sentido exigir negociação e ao mesmo tempo querer fixar desde já no Orçamento do Estado o resultado final”.
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O resultado final foi o mesmo. O PSD só aprovou a sua própria proposta, que é igual a uma proposta do CDS, e a uma parte de uma proposta do PCP no mesmo sentido. Ou seja, no próximo orçamento haverá uma norma igual à que existia no orçamento deste ano, que não garante nada além de que haverá uma negociação. Os professores têm assim uma nova oportunidade de voltar a negociar com o Governo, que já tinha aprovado um decreto-lei que contabiliza apenas dois anos e noves meses de tempo de serviço dos mais de 9 anos que os sindicatos exigem, mas que ainda não foi promulgado.
As negociações não obrigam o Governo a ceder mais perante os professores. Se as negociações recomeçarem, a única garantia que os professores têm é que esta progressão chegará mais tarde.
ISP e IVA dos espetáculos: “Pornografia fiscal”
No debate da manhã também se falou no adicional do ISP, que o PSD e CDS querem eliminar, contra a vontade do Governo. Pedro Mota Soares lembrou ao Governo que prometeu que o imposto seria neutral. “Hoje está a arrecadar 73 cêntimos de imposto por cada litro de gasóleo. Há margem para baixar imposto sem perder receita fiscal”, defendeu o deputado do CDS acusando o Governo: “Os senhores mentiram aos portugueses”.
Na passada sexta-feira foi publicada a portaria que baixa em três cêntimos por litro de gasolina a taxa do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e energéticos (ISP). Quanto ao gasóleo, portaria deixa apenas o compromisso de “prosseguir o caminho de correspondência com os valores de 2016 no que respeita ao gasóleo”. A publicação da portaria já era do conhecimento dos comunistas, que o tinham dito na conferência de imprensa em que apresentaram as propostas de alteração ao OE — para justificar porque não pediam a eliminação do adicional, como sempre defenderam.
Ainda assim, o CDS deixou o desafio à esquerda para aprovar as propostas da direita. No PSD, Duarte Pacheco fez o mesmo, dirigindo-se às bancadas da esquerda: “Outros partidos falam, falam, falam, dizem que estão contra mas no moemnto da verdade calam-se e votam ao lado do Governo pela manutenção deste imposto. Isso é fraude”, rematou.
Na resposta, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça, remeteu a questão do adicional do ISP para a portaria que foi publicada sexta-feira.
Em matéria fiscal, no PS falou o deputado Fernando Rocha Andrade (ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais) que marcou a manhã quando se referiu às propostas do CDS quanto ao IVA nos espetáculos, dizendo que antes de o partido ter substituído a proposta propunha a redução do IVA também para espetáculos de pornografia. Aproveitou a deixa para atirar que, na área fiscal, as propostas do CDS “são obscenas”, “são a pornografia fiscal”, disse o deputado socialista.