Marcel Keizer é sobrinho de um dos pais do “Futebol Total” holandês e treinou o Ajax, arquétipo maior da organização tática e da metodologia ofensiva que o agora técnico do Sporting tem vindo a implementar na equipa de Alvalade. Ora, na conferência de imprensa de antevisão do jogo com o Nacional, Keizer garantiu que estava à espera de enfrentar uma equipa “como outras que tem visto em Portugal”. O que é que o holandês queria dizer com isto? “Bem organizada. Os treinadores portugueses organizam bem as suas equipas. Esperamos uma equipa forte taticamente amanhã”, explicou.
A esta afirmação, juntava-se o aviso de José Mota, treinador do Desp. Aves, na jornada anterior. No fim de semana passado, os avenses perderam em Alvalade por 4-1 depois de até terem começado o jogo a vencer. No final da partida, o treinador português alertou Keizer para o facto de os técnicos nacionais serem “muito bons” e para a permeabilidade e fragilidade defensiva da forma como o Sporting vem a jogar desde que o holandês aterrou no Aeroporto Humberto Delgado. De escassez de aviso e falta de conhecimento, Keizer não se podia queixar.
Na ressaca positiva da vitória frente ao Vorskla, no último jogo da fase de grupos da Liga Europa, o adversário era o Nacional de Costinha. Marcel Keizer não tinha Montero, que se lesionou contra os ucranianos, não tinha Wendel, que se lesionou contra o Desp. Aves, e não tinha Acuña, que foi expulso no jogo com os avenses e estava castigado. Entravam para o onze Bruno César, no lugar do virtuoso médio brasileiro, e Jefferson, para render o argentino. De resto, o habitual: Bruno Gaspar na lateral direita, Coates e Mathieu no eixo da defesa, Gudelj como médio de cariz mais defensivo e Bruno Fernandes em terrenos mais interiores do corredor direito. Lá à frente, Nani de um lado, Diaby do outro e o inevitável Bas Dost. Costinha, por sua vez, não podia contar com Marakis, também castigado, nem com os lesionados Arabidze e Tissone.
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Ficha de jogo
Sporting-Nacional, 5-2
13.ª jornada da Primeira Liga
Estádio de Alvalade, em Lisboa
Árbitro: Fábio Veríssimo (AF Leiria)
Sporting: Renan, Bruno Gaspar, Coates, Mathieu, Jefferson, Bruno Fernandes, Gudelj, Bruno César (Miguel Luís, 45′), Diaby, Bas Dost, Nani (Jovane, 68′)
Suplentes não utilizados: Salin, André Pinto, Ristovski, Carlos Mané, Petrovic
Treinador: Marcel Keizer
Nacional: Daniel, Kalindi, Felipe, Júlio César, Nuno Campos, Vítor Gonçalves, Palocevic (Hamzaoui, 80′), Jota, Camacho (Riascos, 77′), Bryan Rochez, Witi (Gorré, 89′)
Suplentes não utilizados: Ohoulo, Diogo Coleho, Cerqueira, Diego Barcelos
Treinador: Costinha
Golos: João Camacho (6′), Palocevic (25′), Bas Dost (p, 35′ e 87′), Bruno Fernandes (69′ e 90+1′), Mathieu (75′)
Ação disciplinar: cartão amarelo a Mathieu (25′), Coates (32′), Bruno Fernandes (57′), Filipe Lopes (73′), Kalindi (85′), Hamzaoui (86′)
Logo nos primeiros segundos de jogo, o Nacional deu o mote para aquilo que seria a primeira parte dos madeirenses: jogada pelo corredor direito, o de Jefferson, e João Camacho a surgir isolado na cara de Renan. O guarda-redes brasileiro segurou e manteve o nulo no marcador quando ainda não estava cumprido um minuto de jogo. Não deu golo, mas deu novo aviso para Marcel Keizer. O Nacional, bem preparado e com a lição estudada, sabia que a fragilidade do Sporting no jogo deste domingo estava na lateral direita. Jefferson, mais débil do que Acuña no setor defensivo e sem a força e a garra do argentino para compensar a falta de capacidade com entrega, era o alvo a abater por parte do ataque insular. O Sporting entrou algo passivo — como aliás tem feito nos últimos jogos — e permitiu aos madeirenses o controlo do meio-campo, que foi a alavanca necessária para lançar transições rápidas e contra-ataque a dois ou três passes. Os leões, ainda que inteligentes na troca de bola e na gestão da posse, estavam pouco proativos e resistiam demasiado ao último passe na profundidade, tantas vezes solicitado por Bruno Gaspar e Diaby.
Logo aos seis minutos, aproveitando as falhas posicionais do meio-campo leonino, o Nacional lançou-se rapidamente para o contra-ataque e descobriu Witi na ala esquerda. O cabo-verdiano conseguiu intrometer-se em terrenos mais interiores e deixou para João Camacho, que na meia-lua e à meia volta atirou de pé direito e sem hipótese para Renan. O médio formado na Choupana, que já tinha avisado logo nos primeiros segundos, não falhou a segunda oportunidade que teve e pôs o Nacional a ganhar em Alvalade.
O Sporting procurou reagir mas Bruno César mostrava-se ineficaz na ligação do meio-campo com o ataque e Bruno Fernandes era chamado demasiadas vezes a tarefas defensivas, para render o brasileiro, para poder surgir no último terço do terreno. Lá à frente, Nani teve pouca bola e Diaby era o principal desequilibrador dos leões, ao empenhar-se em autênticas cavalgadas pelo corredor direito que tinham o objetivo único de colocar a bola certinha para Dost só precisar de encostar. Foi isso que fez aos 18 minutos, quando cruzou atrasado e o avançado holandês desenhou um movimento perfeito que o deixou sozinho no coração da grande área para bater Daniel Guimarães. O lance, ainda assim, foi anulado por Fábio Veríssimo por fora de jogo do avançado maliano.
O Sporting tinha mais bola e mais posse mas era o Nacional quem atacava mais, quem criava mais perigo, quem rematava mais e quem ficava mais perto do golo. Os madeirenses balançavam-se para a frente sempre pelo corredor direito, onde João Camacho e Vítor Gonçalves faziam o que queriam de Jefferson. E foi exatamente assim que surgiu o segundo da equipa de Costinha: reposição de bola na direita, cruzamento tenso e certeiro para a área de Renan e Palocevic a surgir completamente sozinho, entre os dois centrais, a cabecear sem hipótese para o guarda-redes verde e branco. Coates e Mathieu ficaram a olhar um para o outro, não comunicaram, nenhum se mexeu e Palocevic agradeceu. 25 minutos e o Nacional vencia por 0-2 em Alvalade.
Depois do segundo golo, o Sporting atravessou um período de pouca clarividência e discernimento e podia até te sofrido o terceiro golo, num livre à medida batido por Palocevic que só parou nas luvas de Renan. Keizer tirava apontamentos, Dost desesperava sempre que Bruno Fernandes decidia rematar à baliza em vez de passar a bola e Nani continuava demasiado discreto. Numa altura que em os leões nem sequer estavam a conseguir construir com qualidade, Diaby voltou a aparecer em velocidade na direita, voltou a cruzar para Dost mas desta vez o holandês foi carregado em falta por Vítor Gonçalves. Na conversão, Dost nao falhou. O Sporting ainda procurou o empate antes da ida para o intervalo para voltar para o segundo tempo com o jogo relançado mas não conseguiu chegar ao golo: na ida para o descanso, o Nacional estava a vencer por 1-2 em Alvalade, tinha menos faltas, mais ataques e mais remates enquadrados.
⏰ INTERVALO | Sporting 1 – 2 Nacional
Comandados de Costinha jogaram à “grande” na 1ª parte, surpreendendo Alvalade#LigaNOS #SCPCDN #DiaDeSporting pic.twitter.com/IuDWJskeYx
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No regresso para a segunda parte, Marcel Keizer detetou rapidamente qual estava a ser o problema e, na impossibilidade de retirar Jefferson por escassez de opções, trocou Bruno César pelo miúdo Miguel Luís, que realizou uma exibição de encher o olho contra o Vorskla. O Sporting voltou melhor e de cara lavada — tal como já tinha acontecido contra o Desp. Aves — e tentou chegar ao empate de forma quase imediata. O maior ímpeto de Diaby, contudo, ficou na primeira parte, e deu lugar à velocidade e qualidade individual de Nani, que se revelou uma das unidades em destaque no segundo tempo. Miguel Luís entrou com pouco impacto e Bruno Fernandes continuava sem conseguir penetrar de forma interior em zonas mais avançadas do terreno. Os leões tinham o controlo do jogo mas o último passe falhava constantemente e acabava por ser o Nacional a criar mais perigo. Keizer decidiu mexer e tirou Nani para lançar Jovane — naquele que foi o momento fulcral para a remontada que terminou em goleada.
Numa das primeiras ações que teve no jogo, o avançado isolou Bas Dost na cara de Daniel Guimarães: o holandês, num erro que raramente comete, adiantou demasiado a bola. Num lance que parecia já perdido, Dost conseguiu tocar para Bruno Fernandes, que rematou para a baliza deserta e empatou a partida. Aos 69 minutos, depois de ir buscar a bola ao fundo das redes para a colocar no centro do terreno o mais depressa possível, o semblante do médio português mostrava que o objetivo era vencer. Cerca de cinco minutos depois, Gudelj sofreu uma falta dura à entrada da grande área e o central Mathieu foi o chamado para converter o livre. Num gesto técnico que não é para todos — muito menos para todos os defesas — o francês rematou de pé esquerdo, bateu Daniel Guimarães e lançou o Sporting para a frente do resultado pela primeira vez no jogo. Até ao final, e até números que não espelham a qualidade do Nacional, Bas Dost ainda converteu outra grande penalidade e Bruno Fernandes também bisou, fixando o resultado em 5-2.
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Marcel Keizer soube interpretar o jogo ao intervalo, lançou Miguel Luís para soltar Bruno Fernandes e estimulou a presença de Coates e Mathieu no meio-campo, de forma a libertar Diaby e Nani e criar desequilíbrios númericos que apanharam a defesa madeirense desprevenida. O Nacional veio a Alvalade fazer uma grande primeira parte mas foi esmagado por um ainda maior segundo tempo dos leões. O treinador leonino estava avisado e preparou-se para isso: a segunda parte do Sporting, que tem já o melhor ataque do Campeonato, foi uma lição tática do professor Keizer que soube ser aluno e ouvir as recomendações.
???????? FINAL | Sporting ???? Nacional
???? oferecem reviravolta natalícia aos adeptos, num jogo em que chegaram a estar a perder por 2 golos ????
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