Afinal, não há provas científicas de que tomar mais vitamina C durante o inverno ajuda mesmo a prevenir constipações. Quando muito, pode diminuir a duração da constipação. Essa é a conclusão de um estudo da Universidade de Harvard publicado no ano passado e noticiado esta sexta-feira pelo El Confidencial: segundo o relatório, “os dados mostram que a vitamina C é apenas marginalmente benéfica no que toca à constipação”, afirmou Bruce Bristian, líder do departamento de clínica nutricional num centro médico ligado à universidade. O que significa que essa relação entre uma coisa e a outra pode não passar de um mito criado pelo Nobel da Química e da Paz Linus Pauling, nos anos 70.

Linus Pauling era um químico quântico e bioquímico norte-americano. Foi a única pessoa da História a ganhar dois prémios Nobel sozinha: um em 1954 pelo trabalho que desenvolveu no estudo das ligações químicas; e outro em 1962 graças às campanhas contra os testes nucleares que protagonizou. Apesar de ser considerado um dos maiores génios da química e da biologia do século XX, há uma particularidade controversa na carreira científica: foi ele quem disse que tomar mais vitamina C pode ajudar a prevenir constipações. O problema? Não há um único estudo científico sério que o comprove isso.

Esse mito vem de um livro publicado por Linus Pauling nos anos 70 chamado “Vitamin C and the Common Cold”, especifica a Universidade de Harvard. Nesse livro, o químico admite que “o mecanismo da eficácia da vitamina C contra infeções virais, como constipações, ainda não é conhecido” e que a hipótese de essa vitamina evitar constipações “ainda não foi testada em experiências”. “No entanto, formulei a hipótese de que a eficácia do ácido ascórbico [nome científico da vitamina C] em dar proteção contra doenças virais resulta da sua função na síntese e atividade do interferão [uma proteína] na prevenção da entrada de partículas de vírus dentro das células”.

Foi com base nessa hipótese que Linus Pauling recomendou “a ingestão regular de uma quantidade adequada de ácido ascórbico”: “Estimo que, para muita gente, um a dois gramas por dia é aproximadamente a taxa ótima de ingestão. Há provas de que muita gente permanece com muito boa saúde, inclusivamente livres de constipações, ano após ano, pela ingestão de apenas 250 miligramas de ácido ascórbico por dia”, escreveu o bioquímico no livro.

Agora, o estudo da Universidade de Harvard diz que as evidências de que a ingestão de vitamina C diminui a probabilidade de apanhar uma constipação são tão fracas “que até se tornam ridículas”, adjetiva o jornal. Numa página dedicada ao assunto, a universidade sublinha que, de facto, os humanos precisam de vitamina C para o sistema imunitário, estrutura dos ossos, saúde da pele e para ajudar na absorção do ferro. No entanto, para a população em geral, tomá-la diariamente “não reduz o risco de apanhar uma constipação”.

Essa foi a conclusão tirada numa série de 29 experiências feitas entre 2013 e 2016 e em que participaram 11 mil pessoas. Tanto quanto parece, é quem faz muito exercício físico que mais ganha com o consumo de vitamina C: “Tomar pelo menos 200 miligramas de vitamina C todos os dias parece diminuir para metade o risco de apanhar uma constipação”.  No entanto, mesmo quem é menos ativo pode ter vantagens em tomar vitamina C: nenhum estudo diz que consumi-la evita constipações, mas a Universidade de Harvard descobriu que pode diminuir a duração da doença em um dia. E mesmo assim, duzentos miligramas de ácido ascórbico diariamente diminuiu a duração dos sintomas de constipação em apenas 8% nos adultos e em 14% nas crianças.

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