O convite foi no mínimo estranho, pois perante um veículo de que todos falam e que a maioria quer conhecer, até aos mais ínfimos detalhes, ter a possibilidade de conduzir o novo Model 3 apenas durante um par de horas sabia (no mínimo) a pouco. Contudo, a nossa imensa curiosidade, bem como a promessa de que depois teríamos a possibilidade de o ensaiar em condições, convenceram-nos a alinhar neste breve contacto com o mais acessível dos Tesla, que se apresentou logo na versão mais cara e potente, a Performance, com 462 cv.
As primeiras unidades do Model 3 deverão chegar ao nosso país na segunda metade de Fevereiro, vindas da Bélgica, mas já estão disponíveis duas unidades para demonstrações a clientes, os que já o encomendaram e os que ainda estão na dúvida. Sem tempo a perder, porque neste caso esse era um bem escasso, iniciámos a nossa experiência nos arredores de Belas, onde o normal são estradas estreitas, com trânsito e um piso num estado de conservação menos bom, ideal para pôr à prova a mais recente criação de Elon Musk e ver até que ponto merece a reputação que lhe atribuem no que respeita à potência, rapidez, consumo e uma autonomia fora de série.
Diferente e maior do que parece
À primeira vista, o Model 3 parece mais pequeno do que na realidade é, o que é habitual em modelos com as extremidades mais arredondadas. Já tínhamos tido a oportunidade de o ver, primeiro no Salão de Paris e posteriormente em Lisboa, na área de exposição no El Corte Inglés, mas ao vê-lo na via pública, junto a outros veículos, é difícil acreditar que os seus 4,69 metros de comprimento e 1,85 m de largura o colocam ao nível de um BMW Série 3. Até a largura de vias é equiparável, ligeiramente mais larga à frente e menos atrás em relação ao Série 3, para o Tesla se impor na distância entre eixos, onde os seus 2,875 m batem o BMW por mais de 6 cm.
É claro que as formas do Model 3 não são clean apenas por uma questão de estilo, com o Tesla eléctrico a aproveitar o facto de não necessitar de tantas entradas de ar para exibir um Cx de apenas 0,23 (o BMW Série 3, com este nível de potência anuncia 0,34), o que lhe vai conferir vantagem, não em velocidade, pois está autolimitado a 250 m/h, mas definitivamente em consumo, ao reduzir a resistência ao avanço.
Interior surpreende, mas depois agrada
O interior do mais pequeno dos Tesla pode chocar os mais tradicionalistas, ao apresentar-se limpo, arrumado e desprovido dos tradicionais painéis de instrumentos e botões para controlar ventilação, modos de condução, rádio e sistemas de ajuda ao condutor. À frente do condutor apenas um tablier amplo e quase plano, com uma grelha de ventilação, fina e a toda a largura, por onde sai o fluxo de ar. De resto, todos os comandos estão concentrados no grande ecrã central táctil, a partir do qual se pode controlar rigorosamente tudo. Tudo menos o Autopilot, sistema que já está há muito homologado na Europa para os modelos S e X, mas que apenas no final da semana passou a ser possível de activar no Model 3, ou seja, a seguir ao nosso breve contacto.
Os materiais são bons, especialmente nesta versão Performance, que inclui de série o pack Premium, que lhe assegura bancos em pele, madeira no tablier e mais equipamento, além de jantes de 20 polegadas e pneus de baixo perfil, uns Michelin Pilot Sport 4S. O espaço à frente é bom, similar ao que oferecem os Série 3, Classe C e A4, para atrás ser substancialmente mais generoso no capítulo do volume reservado às pernas, fruto da maior distância entre eixos. A qualidade de construção não está ao nível dos fabricantes alemães do segmento premium, mas não está assim tão longe, especialmente agora que muitos dos problemas iniciais começam a ser resolvidos.
O banco traseiro, optimizado para dois adultos, mas onde cabem três, está mais baixo do que o habitual, o que obriga a um ângulo diferente nas articulações da anca, o que não deverá ser um problema devido à maior distância que os ocupantes estão das costas do banco da frente e à ausência do túnel central, que nos carros com motor a combustão serve para alojar o escape e o veio de transmissão, o que aqui não é necessário.
Se o habitáculo é vasto, para o segmento, a mala não lhe fica atrás. O Model 3 oferece uma bagageira na traseira, a principal, com 340 litros, existindo sob o fundo um alçapão onde se pode arrumar uma série de objectos que não queremos que andem aos tombos, de um lado para o outro, além dos cabos para o ligar à corrente. Este espaço, que não é muito avantajado, é reforçado pela segunda bagageira à frente, a denominada “Frunk”, que disponibiliza mais 85 litros.
Venham de lá as curvas
Os primeiros quilómetros serviram para ver como se comportava o Model 3 Performance. As suspensões mais duras e mais baixas desta versão desportiva, aliadas aos pneus de baixo perfil, limitam um pouco o conforto, mas transformam o carro num kart, obedecendo cegamente à direcção, de que gostámos mais na opção mais “pesada”. No modo de condução Chill, o menos potente, o 3 Performance é um veículo familiar potente, rápido, mas sem exageros e não assusta. As baterias colocadas entre os eixos, bem junto ao asfalto, fazem maravilhas ao centro de gravidade, o que em conjunto com as eficazes suspensões colam o carro à estrada, sendo evidente o menor peso do Model 3 face ao conhecido Model S – apesar do primeiro recorrer a um chassi em alumínio e aço, ao contrário deste último exclusivamente em alumínio –, devido às maiores dimensões e capacidade da bateria, do topo de gama da Tesla.
É claro que o silêncio é total, como é habitual nos eléctricos, tendo nós optado pelo modo de regeneração Low, uma vez que o Standard, com maior capacidade de produzir energia sempre que se desacelera, exige maior habituação.
Consumos espectaculares
Mais uma vez, o reduzido período em que nos sentámos ao volante do Model 3 não nos permitiu apurar com exactidão o consumo de energia em todas as situações possíveis, a começar em cidade, onde os eléctricos conseguem tradicionalmente melhores valores. Em auto-estrada, religiosamente a 120 km/h, o 3 Performance, apesar das suas mais de quatro centenas de cavalos, atingiu um consumo de 12,6 kWh aos 100 km, o que eleva a autonomia para uns bem simpáticos 595 km, superior pois aos 530 km anunciados e determinados segundo o método WLTP, o que atira a média para 14,1 kWh.
Como seria de esperar, a situação mudou de figura quando em zonas sinuosas decidimos explorar o potencial dos dois motores eléctricos. Facilmente a média subia para os 20 kWh – e ainda mais se andássemos a fundo –, mas a verdade é que, à semelhança do que acontece nos motores de combustão, ou se privilegia a velocidade ou os consumos, pois não se pode ter tudo.
“Ena, que isto anda que se farta”
O Model 3 vai estar disponível com três níveis de capacidade de bateria (Long Range, Mid Range e Standard), bem como com versões de só um motor e tracção traseira, ou com dois e sistema 4×4, além de diversos níveis de potência. Este 3 Performance é o mais desportivo, o que significa que monta o pack de bateria com 75 kWh de capacidade, para depois à frente estar uma unidade com 200 cv, para na traseira a Tesla ter montado outra de 287 cv. Ambos, uma vez modulados pelo sistema de gestão interno, fornecem um acumulado de 340 kW, ou seja, uma potência de 462 cv.
Para termos um brinquedo com estas dimensões e potência, a gasolina, é necessário apontar para uma “bomba” tipo BMW M3, com 431 cv, extraídos do seis cilindros em linha sobrealimentado com três litros de capacidade. Ambos estão limitados a 250 km/h, mas se o M3 ultrapassa a barreira dos 100 km/h em 4,1 segundos, já na versão com caixa de dupla embraiagem e sete velocidades, para ser mais rápido, o Model 3 baixa esta fasquia para 3,5 segundos, Isto embora o 3 Performance pese mais 287 kg do que o BMW.
Quando trocámos o modo de condução Chill pelo Sport, passámos a usufruir da totalidade da potência e a resposta ao acelerador passou a ser outra, do tipo que cola a cabeça ao encosto sempre que se esmaga o pedal da direita. Mas sempre com o sistema a distribuir a potência pelas quatro rodas, com a vantagem que é mais fácil fazê-lo com motores eléctricos do que com motores a gasolina. Os travões revelaram-se potentes e fáceis de dosear, sendo apenas pena que não estivesse disponível o Track Mode, que faz parte do equipamento de série e permite ao 3 Performance exibir um comportamento mais exuberante e até fazer uns drifts.
O brinquedo mais rápido do mercado por 71.300€
O Performance é o topo de gama do Model 3, já estando disponível entre nós por 71.300€. É muito? Nem por isso, especialmente se o compararmos com o BMW M3 ou Mercedes Classe C 63 AMG, ambos na casa dos 100.000€, com o Mercedes a ultrapassar mesmo esta fasquia.
Se o que procura não é um Model 3 capaz de se bater com as melhores berlinas desportivas com 4,7 metros de comprimento, então o mais sensato será optar pelo 3 Long Range, comercializado por 60.200€, com o mesmo pack de 75 kWh, o que lhe garante uma autonomia de 560 km. A tracção é 4×4, devido ao Dual Motor, com o modelo a contar com uma potência de 351 cv, 233 km/h de velocidade máxima e 0-100 km/h em 4,5 segundos.
Mais tarde, ainda em 2019, surgirá o Model 3 Mid Range, já à venda nos EUA, com 62 kWh de bateria, prevendo-se uma autonomia de 465 km e um preço de 53.000€, para o Model 3 Standard surgir na Europa em 2020, com 50 kWh de capacidade de acumulador e cerca de 10.000€ a menos do que o Mid Range.