São já oito as mudanças de treinador em equipas portuguesas durante a presente temporada. Rui Vitória, José Peseiro, Jorge Simão, Lito Vidigal, Cláudio Braga, José Mota, Nuno Manta Santos e Daniel Ramos foram despedidos, respetivamente, de Benfica, Sporting, Boavista, V. Setúbal, Marítimo, Desp. Aves, Feirense e Desp. Chaves e substituídos por Bruno Lage, Marcel Keizer, Lito Vidigal, Sandro, Augusto Inácio, Filipe Martins e Tiago Fernandes. A normalmente chamada “chicotada psicológica” — a decisão de mudar de treinador no decorrer de uma temporada — é cada vez mais evitada por direções e presidentes de clubes que, mesmo contra a opinião de adeptos e apoiantes, acreditam que alterar o comando técnico da equipa durante a época é mais prejudicial do que benéfico para os objetivos a curto prazo.

Em Portugal, numa comparação rápida, não se despede nem mais nem menos do que nas restantes principais Ligas europeias. A verdade é que, exceção feita à Bundesliga, Portugal, Espanha, França, Inglaterra e Itália alinham em números bastante semelhantes de despedimentos de treinadores a meio da temporada: em 2018/19, face aos oito técnicos dispensados na Primeira Liga, outros oito foram despedidos na Serie A, sete na La Liga e na Ligue 1 e seis na Premier League. Na Alemanha, apenas quatro treinadores deixaram a equipa com que iniciaram a época. Mas quais são os efeitos práticos — já que os empíricos e psicológicos ficam fechados no balneários — destas mudanças?

Marcel Keizer substituiu José Peseiro no início de novembro e conquistou menos pontos por jogo do que o treinador português

O Observatório do Futebol da Universidade Europeia analisou todos os jogos dos clubes da Primeira Liga que mudaram de treinador a meio da temporada durante as épocas 2016/17, 2017/18 e 2018/19 (neste último caso, apenas até à 18.ª jornada) e concluiu que, embora favorável a curto prazo, a “chicotada psicológica” não provoca alterações de rendimento das equipas a médio-longo prazo na maioria dos casos. A análise a curto (três jogos) e longo prazo (nove jogos) dos pontos conquistados, golos marcados e sofridos, número de remates e posse de bola das partidas imediatamente antes do despedimento e imediatamente depois da substituição de treinador permite então perceber que o efeito positivo alcançado nos primeiros encontros acaba por esmorecer com a sucessão de jornadas.

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A verdade é que, nos primeiros três jogos logo após o despedimento, o novo treinador consegue, em média, conquistar quase o dobro dos pontos por jogo do que o seu antecessor tinha alcançado nos três jogos imediatamente antes de abandonar o comando técnico da equipa. A longo prazo, porém, as melhorias têm tendência a esbater-se e não existem diferenças significativas entre a média de pontos nos nove jogos antes do despedimento e nos nove jogos logo depois da alteração. No que diz respeito ao rendimento propriamente dito das equipas, o estudo da Universidade Europeia explica que a principal melhoria registada depois de uma mudança de treinador se prende com a diminuição do número médio de golos sofridos e com uma maior consistência e eficácia a nível defensivo. Já no que toca aos remates enquadrados ou à percentagem de posse de bola, as diferenças entre os jogos pré-despedimento e pós-despedimento não são significativas — nem a curto nem a longo prazo.

Rui Vitória em quatro atos. O raio-x época a época que mostra o que correu mal

Numa análise específica às oito equipas que já mudaram de treinador desde o início da presente temporada, os resultados são algo divididos. Se Sporting, V. Setúbal e Feirense pioraram em quase toda a linha e são a confirmação da regra, Benfica, Boavista, Desp. Chaves, Desp. Aves e Marítimo são as exceções que tornam as respetivas “chicotadas psicológicas” algo atípicas. No caso de Bruno Lage e Lito Vidigal, que substituíram Rui Vitória e Jorge Simão na Luz e no Bessa, a verdade é que as duas equipas não só conquistaram mais pontos por jogo após os despedimentos como também aumentaram para praticamente o dobro a média de golos marcados por partida. No Benfica, por exemplo, Lage ainda não conheceu outro resultado que não a vitória em nove jogos para o Campeonato; no Boavista, Vidigal venceu três dos cinco encontros em que esteve no comando técnico dos axadrezados e levou a média de pontos dos 0.89 por jogo para os 2.

Lito Vidigal foi despedido do V. Setúbal e substituiu quase de imediato Jorge Simão, também ele despedido do Boavista

No Benfica, desde que Bruno Lage ocupou o lugar de Rui Vitória, os encarnados só venceram para o Campeonato, marcam uma média de 4.13 golos por jogo (contra os anteriores 2.07) e não sofrem (0.63 golos sofridos por encontro contra 1 na era Vitória). Já do outro lado da Segunda Circular — e assim como no V. Setúbal e no Feirense –, o Sporting soma menos pontos por jogo com Marcel Keizer do que com José Peseiro e sofre mais golos, apesar de também marcar mais. Com Peseiro, os leões conquistavam uma média de 2 pontos por jogo, valor que caiu para 1.85 com o treinador holandês: com Keizer, os golos marcados subiram para cerca de 2 por jogos (para 1.75 com Peseiro) mas os sofridos também aumentaram para 1.15, quando com o técnico português essa média ficava em apenas um golo cedido por partida.

Bruno Lage e o clássico que não era “decisivo” mas que o “fez treinador”

Por fim, o Observatório do Futebol analisou ainda as condições que levam ao despedimento de um treinador. No que toca a pontos conquistados, ao 5.º jogo pré-rescisão verifica-se uma diminuição de 29% nos pontos alcançados por partida; ao 4.º jogo, existe um aumento de 21% no número de golos sofridos por encontro; no penúltimo jogo, existe uma quebra de cerca de 30% nos golos marcados. No número de remates, porém, não existe qualquer alteração durante o período que antecede a saída do treinador: o que indica que as equipas que acabam por sofrer a “chicotada psicológica” não tendem a rematar menos mas sim a ser menos eficazes. O mesmo se verifica com a percentagem de posse de bola, que não se altera de forma significativa nos últimos jogos de um treinador que acaba por ser despedido.