A jornalista viajou para Londres a convite da EDP

A EDP anunciou um plano de venda de ativos na Península Ibérica que irá incluir centrais térmicas e outras unidades a operar em regime de mercado. De acordo com a revisão da estratégia para 2019/2022, a empresa espera obter mais de dois mil milhões de euros com a alienação destes ativos no próximo ano e meio. O plano não indica para já que unidades serão para vender, mas é provável que as vendas venham a incluir barragens em Portugal, para além de centrais térmicas, uma vez que algumas destas centrais já estão a operar em regime de mercado, na sequência do fim do contrato CMEC (custos de manutenção do equilíbrio contratual).

A estratégia que está a ser apresentada em Londres prevê uma geração de recursos financeiros de 12 mil milhões de euros nos próximos quatro anos — 2.,9 mil milhões de euros por ano –, dos quais sete mil milhões de euros serão canalizados para novos investimentos líquidos. A EDP promete ainda distribuir três mil milhões de euros em dividendos e usar dois mil milhões de euros para baixar a dívida até 2022.

Pelo menos no caso de Portugal será a primeira vez que a EDP vende a terceiros centrais elétricas nas quais tem um posição de controlo. Em resposta às perguntas dos analistas,  António Mexia admitiu que o desinvestimento pode incluir geração hídrica (barragens) para reduzir a exposição ao risco de mercado. Entre os ativos a vender na Península Ibérica, “vamos ter térmica, mas também ativos não térmicos”. A empresa já está a trabalhar no tema, mas  vai depender do interesse dos investidores, valores e o impacto no portefóleo de produção.

“Nuvens regulatórias” em Portugal já passaram

O desinvestimento em Portugal e Espanha é anunciado um dia depois de serem conhecidos os resultados anuais marcados por uma queda de 53% e por prejuízos históricos na operação portuguesa, muito por culpa dos custos de decisões políticas que retiraram receitas obtidas ao abrigo dos contratos CMEC (custos de manutenção do equilíbrio contratual). A estratégia revista estabelece como objetivo a venda de uma “significativa quantidade de ativos” na Península Ibérica definidos como não estratégicos para o negócio (non-core).  Para além da venda destes ativos, a empresa quer rodar ativos no setor das renováveis (vender um projeto depois de o lançar) no montante de quatro mil milhões de euros.

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No entanto, e na resposta aos analistas, António Mexia considerou que as “nuvens”  já desapareceram e não devem voltar, explicando que se referia às nuvens regulatórias em Portugal. E porquê? Porque a dívida tarifária está a baixar de forma consistente e isso vai dispensar “mais inovações” para conseguir baixar os preços da eletricidade e porque o sistema “é totalmente sustentável”. O gestor realçou contudo que a empresa vai contestar o corte de 285 milhões de euros de receitas já recebidas porque não correspondem a qualquer inovação da legislação, lembrando que até então, todos pagamentos feitos ao abrigo dos CMEC tinham sido validados pelo Governo e pelo regulador. Afastou ainda a possibilidade de alterar a política de dividendos por causa de medidas políticas ou regulatórias em Portugal.

Por outro lado, explica que dos 285 milhões de euros que a empresa provisionou já nas contas de 2018, apenas um terço foi usado para baixar as tarifas elétricas em 2019, ou seja, ainda há margem financeira para reduzir preços nos anos seguintes, o que retira pressão regulatória e política da EDP. “O céu está a ficar mais azul”, assinalou.

Elétrica espera continuar a pagar contribuição pelo menos até 2022, mas mais baixa

A EDP diz que os custos políticos e regulatórios custaram no ano passado mais de 600 milhões de euros, sobretudo em Portugal e Espanha. O corte nas receitas dos CMEC, a CESE. a contribuição extraordinária sobre o setor energético (65 milhões de euros), a tarifa social em Portugal (mais de 80 milhões de euros) e as taxas sobre a produção em Espanha e o fim do regime de compensação em Portugal, conhecido como o clawback, foram aspetos referidos. O presidente da EDP referiu também que a expetativa é que a CESE se reduza gradualmente à medida que a dívida tarifária baixe, mas em 2022, a elétrica ainda espera estar a pagar 40% da contribuição que agora serve para baixar a dívida tarifária.

Recordando que o desinvestimento em ativos em Portugal e Espanha é um processo que já vem de trás,  António Mexia assumiu que o objetivo da empresa é reduzir a exposição à Península Ibérica. “Começámos por ser uma empresa portuguesa e agora estamos em 16 países.”.  Já Estados Unidos e Brasil são geografias onde a aposta será reforçada.

Parece para já afastado o cenário de venda da EDP Brasil que foi colocado em cima da mesa pelo fundo americano Elliott, acionista da EDP numa carta aos investidores. Quando questionado sobre esta possibilidade, o presidente executivo praticamente a afastou com vários argumentos. “O Brasil desempenha um papel relevante no negócio“, tem gerado grande valor para a EDP e está a crescer.

Nunca fomos loucos lá. Quando a Europa estava mal, alguns disseram-nos para vender Europa e investir tudo no Brasil e agora dizem o contrário. Temos visto de tudo nestes roadshows.”

António Mexia até admitiu equacionar oportunidades de crescimento, mas afastou a compra de participações minoritárias.

EDP quer ser “verde” até 2030 e admite que não pode ser boa em tudo, é preciso foco

“Não é uma transformação total face ao estamos a já fazer, mas é uma nova fase para a empresa e também uma transformação da companhia. Estamos numa posição privilegiada para capitalizar a transição energética,” afirmou António Mexia, destacando a história e os resultados obtidos no passado.

“A história de uma companhia tem de ser atrativa e credível”, sublinhou o gestor, lembrando que a história da EDP tem sido boa porque a elétrica tem entregado. “Fomos surpreendidos por coisas que não esperávamos? Sim, mas estamos a responder”. Vamos afastar a nuvem e ver o que temos feito, temos apresentado um “track record”. O gestor exemplifica com a rotação de ativos e o desinvestimento de 3,1 mil milhões de euros realizado desde 2012. As metas tem sido exigentes, claras e temos cumprido.”

O plano revisto até 2022 prevê uma aceleração do investimento, com um valor anual de 2.9 mil milhões de euros até 2022 que vai ter como principal alvo o desenvolvimento de energias renováveis. Esta área vai absorver cerca de 75% do investimento anunciado para os próximos quatro anos, divididos sobretudo entre Estados Unidos, Brasil e Europa.

O objetivo é triplicar o crescimento na área das energias renováveis e fazer da EDP uma empresa de energia verde, sublinhou António Mexia. Até 2030, a EDP quer que 90% da sua produção venha de fontes renováveis — no ano passado foram 66% — mantendo contudo alguma potência em gás natural. O gestor diz também que a elétrica vai liderar o fim das centrais a carvão até 2030.

O presidente executivo da EDP também destacou aquilo que, do seu ponto de vista, distingue a empresas das suas concorrentes, e reconheceu que foi necessário reajustar o foco.

“São todos verdes, mas nós somos mais verdes. E temos tido crescimento orgânico. Não compramos crescimento, crescemos. Mas é claro que as companhias da nossa dimensão precisam de mais foco. Já não se esperam que sejamos bons em tudo e em todo o lado. Este plano é uma transformação no sentido em que explica o que a empresa consegue fazer melhor do que as outras e ser assim uma melhor opção para investir na transição energética”.